Três meses depois, esta sexta-feira vários especialistas reuniram-se no auditório da sede do Infarmed para fazer um ponto de situação sobre a Covid-19 em Portugal, numa altura em que o número de casos diários está a aumentar, bem como o número de vítimas mortais.
O encontro foi convocado pelo primeiro-ministro, António Costa, que já avançou não antever a necessidade de adotar medidas de controlo da pandemia que impliquem um novo estado de emergência.
A reunião conta também, pela parte política, com a participação do chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa, do presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, e de membros de partidos com representação parlamentar.
Da parte dos especialistas, foi apresentada a situação epidemiológica no país e na Europa, e também dados sobre a evolução da pandemia, vacinação e sua efetividade contra a Covid-19, e ainda intervenções da 'task force' das ciências comportamentais e propostas para prevenir e controlar a pandemia em Portugal.
"Portugal na quinta fase pandémica"
Pedro Pinto
Leite
, da Direção-Geral da Saúde, assume claramente que "Portugal encontra-se
de momento na quinta fase pandémica", com uma incidêndia média a 14 dias de 203 casos por 100 mil habitantes.
No entanto, ressalvou, o impacto na mortalidade e internamentos é menor do que em fases anteriores.
Os grupos etários com maior incidência é dos 0-9 anos, segue-se dos 20-29 anos e dos 30 – 39 anos. Todos os grupos etários tem tendência crescente, exceto os maiores dos 80 anos, o que pode já refletir a administração das doses de reforço, admitiu o especialista.
O Algarve é a região do país onde se nota maior diferença nos contornos da pandemia. Nesta região, a faixa etária entre os 30 e os 39 anos lidera na incidência, seguida de faixas etárias mais velhas. Os surtos na região são sobretudo em escolas e universidades, como acontece no resto do país, mas também surgem em contexto familiar e em festas.
"Vacinas evitaram 200 mil infeções e 2.300 mortes"
Já Henrique Barros, epidemiologista do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto considera que há "uma evidente diferença entre o primeiro e o segundo ano" de pandemia. Barros diz que é possível verificar o quadro sazonal da doença e que já "se adivinha muito bem a transformação endémica".
O especialista não tem dúvidas que as diferenças devem-se ao processo de vacinação e fez as contas ao que as vacinas já evitaram: 200 mil infeções, mais 55 mil dias de internamento em cuidados intensivos e pouparam 2.300 vidas .
Henrique Barros disse ainda que, para evitar duplicação de casos, devem evitar-se reuniões "com mais de 50 pessoas". Já na reta final da intervenção, o especialista defendeu que, assim que estiver disponível, a vacinação de crianças "deve ser uma prioridade", assim como deve ser uma prioridade o reforço da vacinação, à medida que o tempo for passando. Barros aconselhou ainda a manutenção "de medidas não farmacológicas individuais".
O especialista disse ainda que a "Covid não vai ter uma presença tão relevante" e que "vamos viver como sempre vivemos com uma maior prevalência de infeções respiratórias", nos meses mais frios do ano.
Evitar pressão no SNS? Vacinar antes do Natal
Baltazar
Nunes
, do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, disse que os maiores de 65 anos elegíveis para reforço da vacinação, devem levar a terceira dose antes do Natal. Seria, no entender do especialista, a forma de evitar as linhas vermelhas de pressão do Serviço Nacional de Saúde.
Segiu-se depois Ausenda
Machado
, também do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, que veio dar conta de alguns dados sobre a duração da efetividade das vacinas da Pfizer ou Moderna. A especialista refere que o ponto máximo de proteção ocorre entre 14 a 42 dias depois da inoculação. A especialista referiu que a "efetividade das
vacinas varia com a idade", sendo que "é mais elevada na população entre 30-49 anos".
É preciso um reforço no plano de vacinação
Sobre o ponto de situação da vacinação contra a Covid-19 falou o coronel Carlos Penha-Gonçalves. O responsável referiu que o dispositivo para administrar as vacinas quer da gripe, quer de reforço "tem vindo a evoluir" e "há agora 304 pontos de vacinação", o que permite fazer 460 mil inoculações por semana. O militar considerou, no entanto, que o dispositivo terá de ser reforçado para se conseguir atingir o objetivo de vacinar a esmagadora maioria dos maiores de 65 anos elegível para o reforço da vacinação Covid.
Nesta apresentação, Carlos Penha Gonçalves considerou que a adesão à vacinaçao "está a crescer", estando a chegar a "35 mil pessoas por dia". Se atingirmos e mantermos este ritmo de 35 mil pessoas vacinadas por dia, diz Carlos Penha-Gonçalves, será possível atingir o objetivo de administrar a dose de reforço da esmagadora maioria dos maiores de 65 anos.
Metade dos jovens com sofrimento psicológico
A penúltima oradora da reunião do Infarmed foi Margarida Gaspar de Matos, da "task-force" de Ciências Comportamentais aplicada ao contexto Covid-19. Esta especialista mostrou-se preocupada com os efeitos da pandemia, referindo que números muito recentes apontam para um em cada dois jovens apresenta "sinais de sofrimento psicológico". A especialista identificou ainda alguns erros de comunicação, nomeadamente a forma como se tem referido à terceira dose da vacina, considerando que a expressão reforço deve ser substituida por "atualização vacinal".
Esta especialista referiu ainda que, neste momento, a percepção de risco por parte dos jovens "é praticamente nula".
A terminar o leque de especialistas, a investigadora Raquel Duarte recomendou algumas medidas concretas para evitar a evolução crescente da pandemia. A especialista recomendou, por exemplo, a autotestagem durante os festejos do Natal, bem como o regresso aos horários desfasados e ao teletrabalho, sempre que possível.
Raquel Duarte considerou mesmo que é necessário "Aumentar a cultura do recurso ao autoteste" e defendeu testes gratuitos também para vacinados.