O que é um jubileu, e porque é que este é “extraordinário”?
A ideia de um ano jubilar vem da Bíblia, nomeadamente do Antigo Testamento. Em Israel, de 50 em 50 anos existia um ano especial em que se focava de forma especial a misericórdia de Deus. Nesse ano, as dívidas seriam perdoadas, os escravos libertados e os presos também. Era também um ano em que os campos não eram cultivados, para dar descanso à terra.
A tradição foi recuperada na Igreja Católica pelo Papa Bonifácio, para assinalar o ano 1300. A partir de então os jubileus realizaram-se a cada 25 anos ou a cada 50 anos. São anos em que a Igreja enfatiza a misericórdia de Deus, incentivando as peregrinações a lugares santos, incluindo Roma, e oferecendo indulgências aos fiéis que cumpram com os requisitos e cumpram essas peregrinações.
De vez em quando um Papa convoca um ano santo fora do período normal. Estes são os jubileus extraordinários. Os jubileus extraordinários têm normalmente um tema ou uma motivação especial. O Papa Urbano VIII convocou um em 1628 e 1629, por exemplo, para rezar pela paz, numa altura em que a Europa estava dilacerada por conflitos.
O que é uma Porta Santa e onde posso encontrar uma?
As portas santas servem como símbolo e destino físico das peregrinações dos anos jubilares. Estas portas foram estabelecidas para haver locais onde os fiéis, atravessando-as, “possam ser abraçados pela misericórdia de Deus e se comprometam a serem misericordiosos com os outros, como o Pai o é connosco”, como diz o Santo Padre na bula com que anunciou o jubileu.
A passagem pela porta santa assinala o final da peregrinação dos fiéis e concede-lhes, caso estejam em estado de graça, comunguem e rezem pelas intenções do Papa, uma indulgência plenária.
A tradição das portas santas remonta a tempos pré-cristãos. Existia, em Roma antiga, existia a Puerta Tarpea no local onde se encontra actualmente a Basílica de São João de Latrão. Quem passasse essa porta recebia imediatamente santuário, isto é, protecção de quem o perseguia. O hábito foi recuperado pelos Papas no Século IV, no tempo do imperador Constantino e a pedido do mesmo. Mas o privilégio foi de tal forma alvo de abuso que os Papas seguintes ordenaram que a porta fosse selada, sendo aberta apenas em ocasiões especiais.
Actualmente existem quatro portas santas em Roma, uma na Basílica de São Pedro, uma em São João de Latrão, outra em Santa Maria Maior e uma quarta em São Paulo Extramuros. Estas são portas pré-existentes que costumam estar seladas com betão mas que são abertas propositadamente durante jubileus. Para além destas, existem outras três portas em catedrais no mundo que são portas santas, uma em Santiago de Compostela, outra no Santuário do Santo Cura d’Ars e uma terceira em Quebeque, no Canadá.
Contudo, e para que os fiéis que vivem longe destes locais também possam beneficiar dos privilégios do jubileu, o Papa ordenou que cada diocese do mundo tivesse pelo menos uma porta santa. Nalgumas dioceses, como é o caso do Lisboa e Braga, para além das portas santas das catedrais, haverá Igrejas Jubilares, onde os fiéis podem ir para obter os mesmos privilégios do jubileu. Na sua maioria, as portas santas encontram-se nas sés de cada diocese. Fátima também terá uma porta santa e na diocese de Évora, em vez da catedral, a porta santa encontra-se no Santuário de Nossa Senhora de Vila Viçosa.
O que é uma indulgência?
As indulgências têm sido alvo de polémica e de incompreensão na Igreja há séculos, mas a sua prática nunca foi abandonada.
Segundo o ensinamento cristão, um pecado tem dois efeitos para quem o pratica. Por um lado a pessoa fica com culpa por aquilo que fez, por outro lado o acto cometido deixa uma marca, ou uma mancha, na alma do fiel.
Enquanto a confissão absolve o penitente da culpa dos seus pecados, essas marcas, ou manchas, permanecem. Por analogia, pode-se imaginar uma criança que por distracção suja uma camisa nova que os pais lhe deram. A criança pede desculpa por aquilo que fez e os pais perdoam-lhe essa culpa, mas a mancha na camisa não desaparece com esse perdão, permanecendo como marca física do acto cometido.
Quando uma pessoa morre, essas manchas na alma devem ser eliminadas, ou purificadas, antes de o fiel se poder apresentar diante de Deus. Na doutrina católica é para isso que serve o purgatório, um local que não é de castigo mas de purificação, deixando a alma em estado de graça para poder gozar da presença de Deus.
Numa carta, o autor C.S. Lewis (que era evangélico e não católico), escreveu o seguinte:
“As nossas almas exigem o purgatório, não? Não seria terrível se Deus nos dissesse: ‘É verdade, meu filho, que o teu hálito tresanda e as roupas pingam com lama e sujidade, mas aqui somos caridosos e por isso ninguém te vai chatear com isso. Entra na alegria’? Não deveríamos responder, ‘Com submissão, Senhor, e se não houver nada em contrário, preferia limpar-me primeiro.’ ‘Sabes que isso pode doer’, ‘Ainda assim, Senhor’”.
Ora, as indulgências permitem precisamente fazer esta “purificação” da alma ainda em vida, pelo que, em rigor, se alguém recebesse indulgências plenárias e morresse no instante a seguir iria directamente para o Céu, não precisando de se purificar no purgatório. As indulgências podem, ainda, ser recebidas em nome próprio ou para benefício de outro, incluindo alguém que já tenha morrido.
Para receber indulgências, uma pessoa deve estar confessada e precisa ainda de comungar e rezar em comunhão com o Papa, pelas suas intenções. Caso não se tenha confessado antes de completar a sua peregrinação, o fiel pode fazê-lo nos dias seguintes.
A grande polémica em torno das indulgências, que foi um dos muitos factores que contribuiu para o grande cisma do ocidente e a criação das igrejas protestantes, era a concessão de indulgências a troco de dinheiro. Essa prática constituía um abuso do conceito e o Concílio de Trento teve a preocupação de a combater, mantendo todavia inteira a teologia das indulgências.
Que mais é que o Papa anunciou para este jubileu?
Com o objectivo de tornar tornar mais manifesta a misericórdia de Deus para os fiéis, o Papa pode ainda decretar mais privilégios e graças durante o Jubileu da Misericórdia. Francisco já disse que pretende fazê-lo com uma iniciativa especial por mês.
Até ao momento já foram anunciadas duas decisões extraordinárias. Durante o ano jubilar Francisco concede a todos os padres a autoridade para poder absolver o pecado do aborto. Este pecado, e outros que, caso quem o pratica tenha verdadeira consciência da sua gravidade, incorre em excomunhão automática, pelo que a sua absolvição é geralmente reservada a um bispo, que tem a faculdade de poder levantar a excomunhão e absolver. Em muitos casos os bispos autorizam os seus padres, por razões práticas, a absolver os penitentes nestas situações, sendo que a excomunhão não abrange apenas as mulheres que abortam, mas também médicos que façam abortos ou pessoas que contribuam materialmente ou não, para que sejam praticados.
Outra iniciativa, vista como um gesto de boa vontade para com os mais tradicionalistas na Igreja, passa por permitir que os fiéis possam confessar-se a padres da Sociedade de São Pio X, fundada pelo já falecido arcebispo Marcel Lefebvre, que se encontra em situação de comunhão irregular com Roma.
Onde posso encontrar mais informação sobre o ano santo?
Embora o centro de um jubileu católico seja quase sempre Roma, actualmente as actividades estão bastante descentralizadas. Todas as dioceses terão actividades e iniciativas, que serão promovidas e divulgadas localmente. Contudo, existe um site oficial do jubileu, com informação em várias línguas.
O Papa encarregou o Pontifício Conselho para a Nova Evangelização de coordenar esta parte do Jubileu e este conselho produziu, entre outras coisas, uma colecção de oito pequenos volumes que servem como guia para aprofundar o Jubileu da Misericórdia. Cada volume do livro aborda um aspecto diferente do conceito de misericórdia, de uma forma simples e acessível. Em Portugal estes livros são editados pela Paulus.