O Banco Alimentar Contra a Fome (BA) convida os portugueses a “alimentar a esperança” na nova campanha. Sábado e domingo - 6 e 7 de maio - decorre a chamada “recolha saco”, nos super e hipermercados, mas até dia 14 será possível contribuir online ou através da chamada “ajuda vale”.
Em entrevista à Renascença, Isabel Jonet confirma que a situação se agravou desde a última campanha, de há seis meses. Lamentando a falta de medidas estruturais de combate à pobreza, duvida que a descida do IVA chegue para mudar a vida das famílias. Mas, acredita na contribuição generosa dos portugueses, que confiam no Banco Alimentar para ajudar quem mais precisa. Neste momento são mais de 400 mil pessoas que recebem apoio através de 2 mil instituições.
Vai decorrer mais uma campanha do Banco Alimentar contra a Fome. É um dos dois momentos mais importantes do ano em termos de recolha de alimentos. Qual é a sua expectativa para esta campanha?
São realmente dois momentos muito importantes para os bancos alimentares, porque são muito congregadores de toda a sociedade para esta certeza de que, infelizmente, em Portugal, à nossa beira, existem ainda famílias que precisam de ajuda para se alimentar. E também porque há uma participação de voluntariado incrível!
Os bancos alimentares são, talvez, o maior movimento de voluntariado que há em Portugal: reúnem pessoas de todas as idades, de todas as opiniões políticas e de todos os credos, que lá, ombro a ombro, ajudam a levar alimento à mesa quem mais precisa.
As nossas previsões para todas as campanhas são sempre que a campanha é o melhor que pode ser naquele momento, face à conjuntura.
E sabemos que há muitas, muitas famílias que têm necessidades hoje, que têm uma vida mais difícil, seja porque a prestação do crédito aumentou, seja porque aquilo que levam para casa não chega para pagar a conta do supermercado, que tem vindo crescer, apesar de alguns balões de oxigénio que têm recebido, e que continuam a precisar do apoio alimentar.
O Banco Alimentar está nesta altura a ajudar quantos portugueses, através de quantas instituições?
Há 21 bancos alimentares em todo o território nacional – continente e região autónomas da Madeira e Açores, em São Miguel e na Terceira -, que em conjunto e parceria com cerca de 2 mil instituições de solidariedade social e algumas juntas de freguesia apoiam mais de 400 mil pessoas.
E estas pessoas recebem comida todos os dias, porque são famílias que têm que de ter apoio, alimentar diário. São famílias que recebem ou sacos de alimentos, que são entregues pelas instituições, ou que estão em lares ou recebem alimentação em creches ou jardins de infância que têm acordo com o Banco Alimentar da respetiva região.
Essas necessidades têm aumentado? Há mais pessoas a beneficiar da vossa ajuda?
Verificámos que nos primeiros quatro meses do ano houve um aumento dos pedidos através da rede de emergência alimentar, que foi uma plataforma que construímos na altura da pandemia para dar uma melhor resposta às famílias que pediam ajuda, para haver um encaminhamento mais direto para a instituição da sua zona.
Verificámos que houve um acréscimo muito significativo [de pedidos] e também que a maior parte das pessoas que pedem apoio através da rede de emergência alimentar hoje em dia são pessoas que têm um trabalho ou que são estudantes e trabalham.
Como isto é tudo através de uma plataforma, permite-nos retirar dados e temos estas estatísticas e o que verificamos é que quem pede ajuda hoje são pessoas que anteriormente não pediam, e que têm trabalho, ou seja, são pessoas cujo orçamento familiar não está a chegar para todas as suas despesas.
E os bancos alimentares também têm tido dificuldades em manter as ajudas?
Este semestre foi muito desafiante porque tínhamos mais pedidos e menos doações, porque a inflação subiu muito.
Agora houve algum alívio, com a retirada do IVA dos produtos alimentares, mas isso não significa que haja mais doações aos bancos alimentares. Pelo contrário, as empresas tendem até a ser mais eficientes e têm menos doações…
Mas, como é que avalia esta questão do IVA ter descido em alguns alimentos, e que impacto é que isso pode ter na campanha?
Nós esperamos, do ponto de vista de donativos, que as pessoas - até porque os preços estão um bocadinho mais baratos - possam continuar a contribuir para o Banco Alimentar. Mas, sabe que a grande contribuição que se verifica para os bancos alimentares é quase um bocadinho independente dos rendimentos.
Há uma solidariedade, uma generosidade incrível na sociedade portuguesa e há muita confiança no Banco Alimentar. As pessoas sabem que não é preciso dar muito, é preciso serem muitos a dar, e tenho a certeza que a campanha vai, uma vez mais, suscitar a generosidade de muitos portugueses.
Penso que para as famílias que vão ao supermercado todos os fins de semana, o haver uma diminuição dos preços por via da isenção do IVA é positivo, mas não me parece que esta seja uma medida que se possa refletir numa alteração estrutural do combate à pobreza cá em Portugal. Portanto, acho que de um ponto de vista de doações, pode ser até positivo, mas aquilo que é mais positivo é a extraordinária e reiterada generosidade dos portugueses, que numa campanha deste tipo doam muitas, muitas, muitas toneladas de alimentos, porque conhecem pessoas que precisam. E isso é que é extraordinário!
Relativamente à medida em concreto, da descida do IVA, é mais um dos balões de oxigénio que referiu há pouco?
Sim. Baixar o IVA é uma boa medida, mas é mais uma medida política do que uma medida social. É uma medida que, por ser universal, vem beneficiar todas as pessoas, independentemente do seu rendimento, quando eu gostaria de ver mais medidas que combatessem estruturalmente a pobreza no nosso país.
As estatísticas mostram que quem hoje em dia pede ajuda são pessoas que são trabalhadoras, ou seja, pessoas que vivem do seu rendimento de trabalho, muitas vezes até têm dois trabalhos e que não têm a possibilidade de ter uma vida sem depender da ajuda alimentar de uma instituição.
Para mim isto é muito preocupante e gostaria de ver realmente medidas estruturantes no combate à pobreza, seja até por via de parcerias com as empresas, em que as empresas formam e qualificam estes trabalhadores para que possam ter melhores salários e sair desta situação de precariedade, do que sempre apoios sociais que vão aumentar a dependência e o assistencialismo.
A campanha do BA vai decorrer nos supermercados no fim de semana (6 e 7 de maio), mas ainda vai prolongar-se até quando?
A campanha não se esgota nestes dois dias, existe a possibilidade de quem não vai no fim de semana às compras poder colaborar até dia 14 de maio com um vale de alimentos, ou através da Internet, em www.alimentaestaideia.pt. Aí podem escolher o Banco Alimentar e o produto que querem doar, sabendo que estão a contribuir para uma família carenciada da sua região. E recebem um recibo de donativo.
O convite que deixo aos portugueses é aquela que é a expressão da imagem desta campanha de recolha: vamos ‘manter a esperança’ na sociedade portuguesa.
Quando se doa um alimento, uma lata de feijão, o que se está a dar não é apenas o feijão em si, é a esperança que este gesto da partilha significa e a certeza de que há alguém que se preocupa para que as famílias (que precisam) possam ter alimento à mesa. Por isso, quero deixar este convite aos portugueses: sejam solidários, para juntos podermos manter a esperança em Portugal.