O secretário-geral da UGT conhece bem o país que ardeu este Verão. É de Figueiró dos Vinhos, um dos concelhos atingidos pelos incêndios logo em Junho. Em entrevista, recomenda menos impostos para empresas e famílias que se instalem no interior, isenção de portagens e mais serviços públicos.
A concertação começou agora a discutir o tema da precariedade. Que medidas é que a UGT considera necessárias?
O sector público já começou a proceder à integração de trabalhadores. Para o sector privado temos que perceber que há uma enorme precariedade em determinados sectores de actividade.
Não concorda com um agravamento da Taxa Social Única para essas empresas?
Concordamos com o agravamento da TSU para empresas que recorrem em demasia à alta rotatividade de trabalhadores precários. Quem tem necessidade de trabalhadores tem que colocar trabalhadores com contratos sem termo. Quem recorre em demasia a contratos, em que saem uns e entram outros, aí acho que tem que haver um agravamento da TSU - mas desde que não ponha em causa a criação líquida de emprego. Eu não quero estar a atacar aqui as empresas que criam emprego, mesmo que seja em alta precarização. Temos sectores excepcionais que têm que ser excepcionados - e um deles é o sector do Turismo, hotelaria, restauração…
Têm muito emprego sazonal.
Têm. E então queremos que o Governo e empresários nos proponham as medidas que preconizam para se combater de alguma forma a excessiva privatização nestes sectores. Porque aqui também se trata de uma alta rotação de trabalhadores com consecutivos trabalhos a prazo. Então só têm contratos precários? Porquê? Há hotéis que laboram durante todo o ano, mesmo no Inverno. Então porque é que mesmo no Inverno têm que ficar com contratos precários? Naturalmente que as pessoas estão cansadas disto e nós temos que tentar colocar uma atenuante em relação a esta matéria. Relativamente ao código de trabalho, nós preferimos que mantenha alguma estabilidade. Estar sempre a mexer na legislação laboral não nos parece o mais correcto.
Confia que o Governo vai resistir à pressão?
Acho que sim, tenho que confiar. O ministro Vieira da Silva, aí, tem sido muito pragmático, dizendo que não temos condições para alterar a legislação laboral neste momento. Mesmo que algumas das medidas sejam dos tempos da troika. É que o país não tem só trabalhadores. E eu defendo-os, mas os que criam emprego são patrões. A ideia é criar um equilíbrio, isto não é uma utopia.
O que nos leva ao salário mínimo: a UGT quer 585 euros, o Governo 580. Haverá margem para acordo? E que contrapartidas podem ser dadas às empresas?
As contrapartidas vamos ver e negociar em sede de concertação social...
Mas o caminho ficou mais estreito no ano passado.
Sim, ficou mais estreito. Nós temos tido uma posição muito pragmática nos últimos anos. Se percebermos que os aumentos até agora não têm criado grandes constrangimentos, eu tenho que perguntar também às empresas. Enfim, há mensagens que nos tranquilizam. Com o crescimento económico, com o aumento das exportações, com o clima de confiança, que as empresas têm conseguido corresponder. Eu ouvi o António Saraiva afirmar "este ano não entramos na discussão do salário mínimo". Há quem diga, como o João Vieira Lopes, que preferia que o salário mínimo não fosse mexido. A verdade é que depois fazem-se estudos na Europa e nós estamos comparados aos países de Leste. E mesmo assim o salário mínimo tem-se aproximado do salário médio do país - porque a negociação colectiva está bloqueada. Para ser desbloqueada tem que haver uma grande boa-fé dos empresários. E ainda há aqui muitas resistências.
Perguntou-me sobre a concertação social: o salário mínimo está no acordo do PS com o Bloco e devia ter sido falado connosco lá dentro. Não foi. E portanto quando alguém fala da concertação social, é bom que a defenda como a UGT. Há quem não defenda a concertação social e esteja lá. Há quem queira levar as coisas para o Parlamento, mas esteja com um pé num lado e outro pé no outro.
Está a falar da CGTP?
Naturalmente. A CGTP desvaloriza a concertação porque acha que os empregadores fazem aquilo que querem. Agora, se não estiverem lá dentro parceiros - entre os quais o Governo - no sentido de pressionar os empresários a melhorar as condições de trabalho... fazer isso é bom para os trabalhadores e é bom para as empresas, porque define regras do jogo, evita dumpings salariais, evita concorrência desleal entre empresas - porque temos empresas amarradas a contratos colectivos de trabalho, dentro do mesmo sector há empresas que não estão. E é fartar vilanagem! Desculpem a terminologia, mas é o que temos.
A prioridade que este Governo tem dado à devolução de rendimentos tem prejudicado os serviços do Estado?
É uma boa pergunta para o Governo. Mas o país não tem dúvidas de que o excessivo economicismo que tem liderado as nossas vidas nos últimos anos, e a necessidade de respondermos a um programa de ajustamento económico e financeiro tremendo (porque o Estado chegou efectivamente perto da bancarrota), prejudicaram os serviços públicos. Porque o nosso país com muita facilidade entra numa determinada demagogia... quando se diz: "tem que se reduzir as despesas do Estado". E qual é logo o primeiro objectivo? São logo os trabalhadores que estão a mais, fechar escolas, centros de saúde, esvaziar o interior do país, que já está pobre, isolado e esquecido. Este ano o que se assistiu, para além da desorganização, foi a uma ausência de serviços públicos capazes e em número suficiente para fazerem face às necessidades. A pergunta que me faz é se o Governo tem estado a compensar de um lado e a descompassar do outro: acho que a descompensação vem de trás. Não conseguimos é fazer tudo ao mesmo tempo. O Governo tem o benefício da dúvida de começar a preencher as lacunas criadas com o esvaziamento de serviços públicos, mas isso custa dinheiro. Não se consegue fazer em dois anos, estou convencido que não se consegue fazer em quatro. O que tenho dito aos trabalhadores é que o país não tem capacidade para reaver em dois anos o que perdeu em quatro.
O que é que é preciso fazer para que a desertificação não se agrave e para combater o aumento do desemprego no interior?
Acho que era importante um pacto de regime, ao nível dos principais partidos e todos no Parlamento. É preciso uma reforma da floresta, é preciso ordenamento do território, é preciso dar incentivos às empresas para se fixarem. Eu ouvi o sr. Presidente da República fazer um apelo a que se façam eventos no interior, para que as empresas se possam fixar. As empresas instalam-se com um abaixamento da sua tributação. Se é para cativar a atenção das empresas temos que lhe dar alguns benefícios.
Baixar o IRC?
Baixa do IRC para as que se instalem no interior e que criem emprego, porque não? Porque não o não pagamento de portagens nas vias que percorrem de Norte a Sul, toda a zona de Portalegre até Bragança - ou mesmo até ao Algarve? Porque não haver benefícios especiais até para trabalhadores que queiram lá ficar a constituir família? Porque é que não fazemos uma projecção ao nível dos serviços públicos? As pessoas têm que percorrer dezenas ou centenas de quilómetros para ir a um hospital.