A continuidade do Presidente Recep Tayyip Erdogan, islamista conservador na liderança da Turquia há duas décadas, será decidida este domingo na segunda volta das eleições presidenciais, perante o rival Kemal Kiliçdaroglu (centro-esquerda e laico).
Erdogan – que desde 2017 assumiu, após um referendo constitucional, um estrito regime presidencialista com crescentes características autoritárias – consolidou-se como favorito na primeira volta ao obter 49,5% dos votos expressos (muito perto da fasquia dos 50% que evitaria uma segunda ronda), face aos 44,9% do líder opositor, que contestou os resultados oficiais.
Depois de a aliança em torno de Erdogan e liderada pelo seu Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP) ter assegurado uma nova maioria absoluta no Parlamento na primeira volta das eleições no passado dia 14 de maio com elevada mobilização, a estratégia dos dois rivais centrou-se na tentativa de assegurar os 5,2% de votos que na primeira volta contemplaram o ultra-direitista Sinan Ogan, terceiro candidato presidencial e com um acentuado discurso anti-imigração.
Kiliçdaroglu, líder do Partido Republicano do Povo (CHP, centro-esquerda e laico) desde 2010 e que se apresentou nas urnas como o candidato presidencial de uma coligação de seis partidos da oposição turca, protagonizou nas duas últimas semanas uma viragem à direita na tentativa de captar o voto ultranacionalista, para desagrado das forças mais à esquerda que o apoiam.
No início da semana, Ogan declarou publicamente o seu apoio a Erdogan, mas dois partidos nacionalistas que o apoiaram na campanha e integrados na Aliança Ancestral (ATA) optaram por apoiar Kiliçdaroglu e o seu discurso dirigido contra os 3,5 milhões de refugiados da guerra na Síria que começaram a ser acolhidos desde 2011 no território turco.
"Os sírios vão sair" ou "O terrorismo vai terminar" foram as frases que marcaram a campanha do opositor para a segunda volta, também numa tentativa de se demarcar das recorrentes acusações de "conluio com o terrorismo" emitidas por Erdogan pelo apoio que recebe do pró-curdo (e em risco de dissolução) Partido Democrático dos Povos (HDP), definido pelo regime de Ancara como braço político da guerrilha do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK).
Erdogan, que antes da sua primeira eleição presidencial ocupou entre 2003 e 2014 o cargo de primeiro-ministro, também se confronta com um problema político após o seu AKP ter admitido na coligação eleitoral que lidera (Aliança Popular) o pequeno partido fundamentalista curdo Huda-Par, herdeiro de um grupo armado ultra-islamista da década de 1990 e que elegeu quatro deputados para o novo Parlamento.
Um dos dirigentes deste partido já considerou não ser "adequado" que os seus eleitos prestem o obrigatório juramento ao texto constitucional, por refletir uma "ideologia" contestada por esta corrente islamista.
A cerimónia inaugural do novo Parlamento e o juramento da Constituição deveria ter ocorrido três dias após a divulgação dos resultados oficiais, anunciados na passada sexta-feira - após dirimidas impugnações e recontagens - mas o seu adiamento está a ser entendido como uma forma de Erdogan evitar dissensões no amplo campo nacionalista que também o apoia.
Apesar de não existirem projeções, sempre falíveis, é difícil a tarefa de Kiliçdaroglu de captar os 2,6 milhões de votos que lhe faltam para chegar à Presidência.
A retórica nacionalista e xenófoba que também privilegiou no seu discurso desiludiu e desmotivou muitos dos seus apoiantes, em particular nos centros cosmopolitas e entre os jovens. O que também favorece Erdogan, que apenas necessita de mais 400 mil votos face à primeira volta.
Para o escrutínio presidencial de hoje na Turquia, país membro da NATO com cerca de 85 milhões de habitantes, mais de 61 milhões eleitores inscritos poderão exercer o seu direito de voto.