Pedro Santana Lopes diz que vai escrever um livro para responder ao mais recente volume da biografia de Jorge Sampaio. Mas vai desde já respondendo ao antigo Presidente, que, diz o ex-primeiro-ministro, dissolveu o Parlamento em 2004 para abrir caminho à eleição presidencial de Cavaco Silva. “Estou convencido que essa foi a principal razão”, diz Santana Lopes em entrevista à Renascença, que será transmitida ao final da tarde desta quinta-feira, depois das 19h00.
O antigo primeiro-ministro diz que Sampaio “estava muito empenhado na eleição de Cavaco Silva” e diz mesmo que chegaram a falar disso. “O sistema queria Cavaco Silva”, acredita Santana, dizendo que para Cavaco ser eleito, nas presidenciais de 2006, era melhor que o Governo fosse do PS porque havia a convicção de que os portugueses não punham “os ovos todos no mesmo cesto”.
Santana diz ainda que “o sistema” o via como “muito distante de Cavaco Silva” e receava que com ele na liderança do PSD o partido não apoiasse Cavaco com convicção.
“O sistema dos poderosos era mais amigo de Jorge Sampaio do que meu amigo”, afirma o actual provedor da Misericórdia de Lisboa, que também atribui culpas da sua queda a “algum sector financeiro e alguns empresários”.
O segundo volume da biografia de Jorge Sampaio chegou às livrarias esta semana. Escrito pelo jornalista José Pedro Castanheira, tem cerca de mil páginas e conta os anos da vida pública de Jorge Sampaio desde a sua eleição para a Câmara de Lisboa até à passagem de testemunho para Cavaco Silva na Presidência da República. Inclui, portanto, os anos de Sampaio Presidente e as crises políticas de 2004-2005, com a ida de Durão Barroso para Bruxelas, a nomeação de Santana Lopes para primeiro-ministro, a posterior dissolução do Parlamento e a demissão do Governo.
O autor teve acesso ao arquivo particular de Sampaio, entrevistou-o durante dezenas de horas e, como se lê na contra-capa, entrevistou mais 198 pessoas que se cruzaram com o biografado: amigos, rivais, colaboradores, apoiantes e críticos. Mas entre essas pessoas não está Santana Lopes que não gostou de ler no livro que Sampaio estava “farto” dele.
“Fartei-me do Santana como primeiro-ministro, estava a deixar o país à deriva - mas não foi uma decisão ad hominem. (...) Hoje faria o mesmo. De vez em quando é preciso dar voz ao povo - e percebi qual era o sentimento do povo”, diz Sampaio, citado na sua própria biografia.
Nesta entrevista à Renascença, Santana diz que não foi o povo que o Presidente ouviu, mas empresários e banqueiros reunidos na Cotec (associação empresarial para a inovação com o alto patrocínio do Presidente da República).
O antigo primeiro-ministro diz que nunca teve dúvidas de que a sua queda foi “uma decisão política deliberada” e manifesta-se disponível para uma conversa pública com Jorge Sampaio para esclarecerem como “pessoas dignas e civilizadas” o que chama mesmo de “factos alternativos” contados no livro.