Contra o recorrente encerramento das urgências do Hospital de S. Paulo, em Serpa, e pela contratação de mais médicos e outros profissionais de saúde, a população do concelho alentejano volta, esta segunda-feira, à rua para uma concentração.
O estabelecimento hospitalar foi entregue, em 2015, à da Santa Casa da Misericórdia de Serpa, altura em que começaram a surgir os primeiros problemas e que alcançaram “níveis insustentáveis”, este ano.
“Desde 2015 que os problemas têm sido muitos, com uma degradação constante dos serviços prestados, degradação que atingiu o seu auge neste ano de 2022”, afirma, à Renascença, Luís Mestre.
Segundo este membro do Movimento de Defesa do Hospital de Serpa, “desde janeiro deste ano que o Serviço de Urgência não funciona no período noturno e, mais recentemente, é sistemático o fecho das urgências também no período diurno, isto, alegadamente, por falta de médicos”.
Serpa, recorde-se, é um dos maiores concelhos do país, em área, e o terceiro mais populoso do baixo Alentejo.
“Estamos a falar de um concelho, muito disperso, com cerca de 14 mil habitantes. A freguesia mais distante, fica a 30 quilómetros da sede de concelho e, portanto, com este hospital fechado, esta população tem de se deslocar para o hospital de Beja”, descreve Luis Mestre, lembrando que a unidade hospitalar bejense fica “a 60 quilómetros da nossa freguesia mais distante”.
Por outro lado, o Hospital de S. Paulo está também a dar resposta aos concelhos mais próximos de Mértola e Barrancos e, com “o encerramento e a degradação desta unidade, estas populações ficam sem resposta e vão sobrecarregar o Hospital José Joaquim Fernandes (Beja)”.
A luta não é nova e este movimento cívico tem a circular uma petição, para já com duas mil assinaturas, para entregar na Assembleia da República. O documento pretende denunciar o acordo que foi assinado em 2014, por dez anos, para a gestão tripartida do hospital, entre a Santa Casa da Misericórdia de Serpa, a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (ULSBA) e a Administração Regional de Saúde (ARS) do Alentejo.
Os signatários querem reverter a unidade hospitalar para a gestão pública, no quadro do Ministério da Saúde, e a sua integração plena no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
“Queremos chamar a atenção para o facto de a Santa Casa não ter mais condições para conseguir assegurar a prestação deste serviço, e que só a reintegração no SNS, pode garantir a prestação de cuidados de saúde, 24 horas por dia, a esta população”, afirma, o responsável.
Para conseguir chegar a este intento, a população regressa, esta segunda-feira, à rua, a partir das 18h00, para exigir cuidados de saúde de qualidade, uma vez que não obtém qualquer resposta, nem da ARS do Alentejo, nem da Unidade de Saúde Local do Baixo Alentejo. Quanto à Misericórdia, alega falta de médicos.
“A Misericórdia diz que não há médicos, no entanto, o que vem à praça pública é que os médicos se recusam a fazer o serviço, porque não recebem os vencimentos. O nosso movimento já tentou também reunir com a unidade local de saúde e com a ARS, mas, lamentavelmente, sem resposta por parte destas entidades”, menciona, Luis Mestre.
A concentração desta tarde começa junto ao Cine Teatro de Serpa, pelas 18h00 e segue, em desfile, para o Hospital de S. Paulo.
A importância do hospital para a autarquia e partidos
Em abril, a Câmara Municipal de Serpa veio a público “defender que o Hospital de São Paulo deve voltar a integrar o Serviço Nacional de Saúde”, ao mesmo tempo que afirmou “reconhecer e respeitar”, todo o “esforço que a Santa Casa da Misericórdia tem vindo a realizar para manter este equipamento em funcionamento”.
Num comunicado, que ainda permanece na sua página na Internet, o município lembra que “a saúde deve ser pública, universal, geral e gratuita e só assim poderá ser garantido o direito à saúde da nossa população”.
Trata-se de “um direito constitucionalmente consagrado”, que deverá ser “assegurado pela Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo e pelo Ministério da Saúde, entidades que acordaram a transferência da gestão deste hospital, através de um acordo de cooperação assinado em 2014, para a Santa Casa da Misericórdia”.
“Nessa altura”, prossegue a autarquia, “não foi acautelado o serviço público, as necessidades dos utentes e não ficaram garantidos os serviços de saúde básicos e necessários às populações”.
A propósito da desertificação de que tanto se fala, a câmara recorda que “a fixação de população também depende, entre outras, da existência de bons serviços de saúde, que deem resposta às necessidades das populações e da existência de uma urgência aberta, 24 horas por dia, com recursos humanos qualificados e com meios físicos”.
O Partido Comunista Português “defende a reversão do processo iniciado em 2014, retornando o hospital de São Paulo à gestão do Ministério da Saúde”.
Os comunistas consideram que “esta importante infraestrutura de saúde”, deve “ser aproveitada para aprofundar e melhorar as respostas e serviços de saúde”, permitindo “ampliar a capacidade de prestação de cuidados da ULSBA”.
Se assim for, constata o PCP, será também “um relevante estímulo de desenvolvimento económico e social da região e em concreto dos concelhos da margem esquerda do Guadiana”.
Opinião diferente tem o Partido Social-Democrata (PSD), que alega que a dita “reversão para o SNS” vai implicar o fecho do hospital de Serpa.
Em comunicado recente, a distrital de Beja do PSD lembra que a ARS do Alentejo “admitiu” que, caso exista essa reversão, o hospital “seria imediatamente encerrado”, uma vez que o edifício pertence à Santa Casa e “não se cumprem os rácios populacionais para manter o hospital em funcionamento”.
Assim sendo, os sociais-democratas afirmam que “a única opção é manter o hospital na esfera da gestão da misericórdia de Serpa, e “em complementaridade ao hospital de Beja e ao Serviço de Urgência Básica de Moura”, ambos integrados no SNS.