O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) confirmou a absolvição do ex-secretário-geral do PSD José Silvano e da deputada social-democrata Emília Cerqueira no processo das "presenças-fantasma" no parlamento, no qual tinham sido acusados de dois crimes de falsidade informática.
Segundo o acórdão a que a Lusa teve hoje acesso, assinado pelos juízes desembargadores António Carneiro da Silva e Simone Abrantes de Almeida Pereira, a Relação de Lisboa entendeu "julgar improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público (MP), confirmando a decisão recorrida", que tinha sido proferida em primeira instância no passado dia 7 de fevereiro.
O MP defendia que a sentença que absolveu os dois deputados devia "ser revogada e substituída por decisão que condene os arguidos". Nesse sentido, era invocada uma contradição insanável da fundamentação e uma errada apreciação da prova, concluindo existir um vício de nulidade na sentença da juíza Ana Sofia Claudino, do Juízo Local Criminal de Lisboa, e que os autos deveriam ser reenviados à primeira instância para um novo julgamento.
"Os arguidos Maria [Emília] Cerqueira e José Silvano tinham plena consciência e conhecimento que a primeira credenciação (introdução do username e da password) num terminal informático disponível na sala do plenário da Assembleia da República, (...) tinha por efeito imediato o registo de presença na sessão em curso, independentemente da duração dessa ligação", notou o MP, sem deixar de criticar a "parca credibilidade da versão dos factos trazida pelos arguidos".
Contudo, apesar de admitirem existir uma contradição entre os factos provados e os factos não provados em julgamento, os juízes desembargadores consideraram no acórdão proferido na quinta-feira que esta contradição não era insanável e que devia, somente, ser alvo de uma retificação.
"Independentemente do nível de conhecimento que oportunamente tenha sido transmitido à coarguida Maria Emília Cerqueira quanto ao funcionamento, uso e consequências da utilização dos terminais informáticos (...), bem como independentemente da experiência da mesma coarguida (...), apenas de tais factos não decorre necessariamente que (...) tenha tido presentes todos os registos e interações que por efeito automático decorrem do mero uso do equipamento", referiram.
Na fundamentação, o acórdão do TRL descartou ainda a tese do MP em relação a uma errada apreciação da prova e da alegada "parca credibilidade" à versão apresentada pelos dois arguidos, ao explicar que "resulta que os elementos objetivos seguros e disponíveis nos autos tudo menos impõem uma versão dos factos diversa da decidida pelo tribunal".
Em causa neste processo estavam presenças erróneas nos dias 18 e 24 de outubro de 2018, com o tribunal de primeira instância considerar em 7 de fevereiro de 2022 que não ficou provado que José Silvano tenha instruído a sua colega de bancada parlamentar a assinalar falsamente a sua presença nesses dias. Então, o tribunal afastou também qualquer intenção de Emília Cerqueira em marcar falsamente a presença de José Silvano no parlamento.
Decisão judicial "sabe a pouco"
José Silvano diz que “prevaleceu o Estado de direito” com a confirmação do Tribunal da Relação da sua absolvição no caso das faltas parlamentares, mas considera que “sabe a pouco”.
“No final deste processo, visto que já não há mais recursos, prevaleceu o funcionamento do Estado de direito com a minha absolvição definitiva”, afirmou José Silvano, em declarações à Agência Lusa.
Para o ex-secretário-geral do PSD, “ficou provado quer em primeira instância quer no recurso” que não mandou registar a sua presença no plenário da Assembleia da República quando faltou aos trabalhos, e que não recebeu “qualquer verba pela respetiva falta”.
“Mas esta decisão sabe a pouco porque depois de tanto mediatismo e tanto comentário negativo sobre este caso, principalmente em período de atos eleitorais, devia ser obrigatório dar o mesmo mediatismo a esta absolvição”, defendeu.
José Silvano considerou que, neste processo, o Ministério Público teve um comportamento “que permitiu ampliar todas as consequências negativas”.
“Demorou mais de três anos a fazer a acusação, mesmo depois da absolvição em primeira instância não ficou satisfeito e recorreu para o Tribunal da Relação, prolongando os efeitos mediáticos negativos deste caso”, salientou.
Por outro lado, José Silvano critica o Ministério Público por ter conduzido “todas as fases deste processo em alturas politicamente sensíveis, nomeadamente nas últimas eleições legislativas”.
“Apetece-me perguntar: quem repara estes danos? Alguém é responsável quando os processos chegam ao fim e têm uma decisão diferente da acusação ao longo dos anos?”, questionou.