O irmão e a amiga do Sr. Presidente...
08-01-2019 - 10:58

Marcelo Rebelo de Sousa (ou alguém na sua muito profissional equipa de apoio) devia já ter percebido que a presença constante nos média dilui as mensagens importantes num mar de espuma sem sentido.

Na sequência da tomada de posse de Jair Bolsonaro, no Brasil, Marcelo Rebelo de Sousa falou aos jornalistas nestes termos: “Como disse e como disse o Presidente Bolsonaro, era uma reunião entre irmãos, e entre irmãos o que se diz diz-se rápido, como em família, e há uma empatia natural entre povos que facilita fazer passar a mensagem.”

Ontem mesmo, na estreia de um programa televisivo da manhã num canal privado, Marcelo telefonou à apresentadora e disse: “"Está? Daqui é Marcelo Rebelo de Sousa. Interrompi aqui uma reunião que tinha e espreitei para ver o seu primeiro programa e, como ao longo da vida, estive várias vezes consigo quando arrancou com novas fases da sua vida, queria desejar-lhe muitas felicidades e enviar-lhe um beijinho".

Num e noutro episódios o Presidente da República Portuguesa pareceu comportar-se como um cidadão sem responsabilidades de representatividade. No primeiro, exibiu proximidade a mais num enquadramento em que a diplomacia (até pela excecionalidade da sua deslocação) aconselharia muito mais prudência e no segundo confundiu deliberadamente o universo de relações pessoais com o exercício da sua função.

Foi com alívio que a maioria dos portugueses percebeu no novo ocupante do mais alto cargo político uma postura completamente diferente da do seu antecessor. E foi com um olhar benevolente e carinhoso que, na generalidade, lhe foram aplaudindo gestos de genuíno afeto ou de intervenção veemente (como parece ser a sua vontade de contrariar a normalização do problema dos sem-abrigo).

Mas Marcelo Rebelo de Sousa (ou alguém na sua muito profissional equipa de apoio) devia já ter percebido que a presença constante nos média aumenta o risco de ocorrência de episódios como estes – dilui as mensagens importantes num mar de espuma sem sentido.
Embora se possa argumentar – com razão – que o estilo da atual presidência assenta, em larga medida, numa personalização do cargo e, por arrastamento, numa maior visibilidade das marcas dessa mesma personalidade talvez esteja na altura de se começarem a levantar sinais de aviso. Não queremos um presidente ‘mudo e quedo’ mas também não queremos um presidente que, num dia, se mostra muito preocupado com as pulsões populistas dos partidos políticos e que, noutro dia, está a ligar a um programa de TV para desejar ‘muitas felicidades’ a uma amiga.