A Igreja Católica apresentou esta quarta-feira a nova equipa responsável por recolher e investigar denúncias de abuso sexual de menores e adultos vulneráveis no seio da instituição. O Grupo VITA - Grupo de acompanhamento das situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal - ficará em funções durante pelo menos três anos e vai promover a criação de uma bolsa de profissionais para apoiar vítimas e suspeitos de abusos que queiram ser ajudados.
O chamado grupo VITA será liderado pela psicóloga Rute Agulhas, que até agora fazia parte da comissão diocesana de Lisboa. Está já prevista a elaboração de um manual de prevenção comum a toda a Igreja, incluindo instituições religiosas.
Na apresentação da equipa, no Hotel Mundial, em Lisboa, a especialista em psicologia clínica e da saúde, com especialidades avançadas em psicoterapia e psicologia da Justiça, disse que a Igreja está a ser "pioneira" e prometeu realizar um trabalho isento e independente.
Aos jornalistas, apresentou o que considera serem os "grandes objetivos" desta nova equipa, nomeadamente "proteger" as vítimas e "prevenir reincidências e situações abusivas".
A partir do próximo dia 22 de maio passa a estar disponível uma linha telefónica exclusiva para denúncias de abuso na Igreja, através do número 915 090 000 e também através do endereço eletrónico geral@grupovita.pt. A linha telefónica estará disponível de segunda a sexta, das 9h às 18h, adiantou Rute Agulhas.
O grupo compromete-se ainda a publicar relatórios semestrais com o ponto da situação, o primeiro dos quais será divulgado em dezembro próximo.
"O nosso compromisso de seis em seis meses é apresentar aquilo que fizermos e tivermos nesse tempo", explicou Rute Agulhas, dizendo que isso inclui "quantas pessoas vieram ter connosco, que tipo de encaminhamentos foram feitos".
A psicóloga destaca ainda que "este grupo não se assume como ad eternum", mas como um "grupo temporário que visa criar respostas e capacitar" os elementos da Igreja. "Queremos que deixem de ser necessários grupos independentes para que essa confiança exista."
Prevenir abusos e reincidências
Na prática, o grupo VITA será responsável por acompanhar elementos que estejam suspensos ou outros referenciados, acolher e acompanhar adultos que se envolveram em comportamentos abusivos, criar uma bolsa de profissionais especializados com agressores, sinalizar as entidades competentes e disponibilizar acompanhamento às vítimas.
A equipa pretende ainda implementar um programa de prevenção primária de abusos na Igreja.
Além de Rute Agulhas, o grupo VITA será constituído por Alexandra Anciães, psicóloga com experiência de avaliação e intervenção com vítimas adultas, a psicóloga Joana Alexandre, docente universitária e investigadora na área da prevenção primária dos abusos sexuais, Jorge Neo Costa, assistente social especializado na intervenção com crianças e jovens em perigo, a psiquiatra Márcia Mota, especialista em Sexologia Clínica e intervenção com vítimas e agressores sexuais, e o psicólogo Ricardo Barroso, docente universitário e especialista em intervenção com agressores sexuais.
O grupo VITA contará ainda com um segundo grupo consultivo, do qual fazem parte o padre João Vergamota (especialista em Direito Canónico) e Helena Carvalho (docente universitária especialista em análise estatística), para além de David Ramalho, um advogado/jurista especialista em crimes de natureza sexual.
Dar Voz ao Silêncio, parte II
Na abertura da sessão de apresentação, D. José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal, afirmou que o novo grupo liderado por Rute Agulhas se distingue da comissão independente por ter uma “vertente operativa”. “Precisa de ter uma face de acolhimento bem autónomo e definido perante as vítimas, perante a sociedade; mas ao mesmo tempo tem de articular-se para dentro da Igreja, de forma eficiente, para que se possa coordenar” com a estrutura, afirmou.
D. José Ornelas disse, ainda, que se trata de uma "nova fase". "Com a primeira fase da Comissão ficou clara a nossa determinação de não fechar os olhos perante esta realidade, de conhecê-la o melhor possível e de termos aquilo que o Papa chama de tolerância zero", disse. E acrescentou: "Temos já uma base sólida nas comissões diocesanas e penso que este grupo vai dotar-nos de uma competência e capacidade operacional que nos faz falta neste campo."
A criação deste organismo tinha sido anunciada na última assembleia plenária da Conferência Episcopal.
O grupo, tinha adiantado a conferência de bispos na passada quinta-feira, "será constituído por uma equipa de profissionais tecnicamente competentes e terá a missão de acolher, escutar, acompanhar e prevenir as situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja em Portugal, dando atenção às vítimas e aos agressores".
Esta equipa surge no seguimento do primeiro relatório nacional sobre abusos na Igreja portuguesa, que foi apresentado em fevereiro por Pedro Stretch e a sua equipa da comissão Dar Voz ao Silêncio, que ao longo de um ano validou 512 casos de abuso sexual de um total de 544 denúncias recolhidas.
[atualizado às 15h09]