A Ucrânia acusou esta sexta-feira a Rússia de "manipular" a visita dos inspetores da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) à central nuclear de Zaporijia, situada no sudeste do território ucraniano e atualmente sob controlo das tropas russas.
Para Kiev, os especialistas da AIEA, organismo que integra o sistema da ONU, vão ter muitas dificuldades na elaboração de um relatório imparcial sobre a situação na central que está "sob constantes" ataques.
"O Exército russo mente, manipula e altera a realidade na central nuclear ao difundir - apenas - informações à AIEA que lhe são benéficas”, denunciou a empresa estatal de energia nuclear da Ucrânia (Energoatom) através de uma mensagem divulgada na rede social Telegram.
De acordo com a Energoatom, a presença de veículos militares russos na sala das turbinas (onde se encontram os reatores) "foi explicada aos especialistas da AIEA como equipamento das 'forças de defesa química'"
"Os russos não permitiram à missão a entrada no centro crise da central, onde estão presentes militares russos e que a AIEA não devia ver (...) ocultando a presença de invasores russos armados", acrescentou o mesmo texto.
A entidade estatal ucraniana alegou que os russos que ocupam a central nuclear desde o dia 04 de março, poucos dias depois do início da ofensiva militar contra a Ucrânia (a 24 de fevereiro), "bloquearam as comunicações de telemóvel e de Internet" em Energodar, a localidade onde se situa a infraestrutura, para evitarem o envio de "fotografias e vídeos" das instalações e da "cidade dormitório".
A empresa ucraniana referiu ainda que os militares russos limitaram a presença de "pessoal operacional da central" durante a visita dos peritos da AIEA.
A entidade disse também que a "maior parte dos jornalistas" presentes na entrada da central nuclear eram "propagandistas russos" e que os militares impediram a entrada de repórteres ucranianos e estrangeiros que não foram autorizados a passar os postos de controlo.
A Energoatom considera que a missão acabou por ser um "espetáculo planeado" porque estavam presentes residentes de Energodar, povoação ocupada pela Rússia e que "se queixaram de bombardeamentos por parte das Forças Armadas da Ucrânia".
"Os ocupantes mentem, alteram os factos e as provas sobre o bombardeamento da central, assim como as consequências e danos na infraestrutura das instalações. Como era esperado, culpam as Forças Armadas da Ucrânia", acusou a Energoatom.
"Nestas condições, é evidente que vai ser difícil para a AIEA fazer uma avaliação imparcial da situação da central nuclear de Zaporijia", referiu.
O diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, disse na quinta-feira, após a visita ao local, que "é óbvio que a central e a integridade física das instalações foram violadas várias vezes, de forma casual ou deliberada".
"Não temos elementos para fazer esta avaliação mas é uma realidade que temos de reconhecer. É algo que não pode continuar a acontecer", pelo que a AIEA, afirmou o representante, está a "tratar de acionar certos mecanismos e estabelecer uma presença permanente" de alguns especialistas da agência das Nações Unidas na central.
O chefe da missão, que visitou "três ou quatro áreas chave que queria inspecionar pessoalmente" - como unidades de energia nuclear, geradores a diesel e salas de controlo - e que afirmou ter falado com trabalhadores e moradores de Energodar, reiterou que a "AIEA está na central e não sai do local".
Os especialistas da AIEA "vão permanecer (no local) até domingo ou segunda-feira" para aprofundarem a inspeção no sentido da elaboração de um relatório, segundo referiu Grossi, que posteriormente irá apresentar o documento à direção da agência da ONU com sede em Viena.
Sem ter especificado um número exato, o diretor-geral da AIEA indicou que um grupo de especialistas vai permanecer na central.
"Com a esperança de que possam facultar-me e a todos uma avaliação imparcial, neutral e tecnicamente sólida do que possa estar a acontecer", indicou.
Por sua vez, a Energoatom disse, na quinta-feira, que atualmente permanecem cinco técnicos da AIEA na central.
O chefe da administração provisória pró-russa de Energodar, Alexandr Volga, disse hoje à televisão estatal russa Rossia-24 que "neste momento na central ficaram oito pessoas da AIEA" mais "outras quatro que as acompanham".