O prefeito da Congregação para a Causa dos Santos, cardeal Angelo Becciu, apresentou esta quinta-feira a sua demissão ao Papa, abdicando ainda de todos os direitos que lhe advêm por ser membro do Colégio dos Cardeais.
O boletim da Sala de Imprensa do Vaticano não avança qualquer razão para a demissão, mas trata-se de um ato extremamente raro que, em tempos recentes, apenas aconteceu com os cardeais O’Brien, da Escócia, e McCarrick, dos Estados Unidos, em ambos os casos por motivos de envolvimento em abusos sexuais.
No caso de Becciu não são conhecidas as razões desta sua tomada de decisão, mas o cardeal italiano era um dos responsáveis da Secretaria de Estado do Vaticano numa altura em que esta se viu envolvida numa série de escândalos financeiros, incluindo a compra de uma propriedade de luxo em Londres. De acordo com a Catholic News Agency, a aquisição do imóvel foi feita com recurso a empréstimo de um banco suíço com um longo historial de violações de medidas contra o branqueamento fiscal.
Na altura Becciu defendeu o investimento em Londres como prática comum, mas o caso desencadeou uma série de rusgas a escritórios de colaboradores do cardeal e até à detenção de um dos homens de negócio envolvidos.
Há um ano, o jornal britânico "Financial Times" noticiou que o Vaticano tinha estado a investigar um investimento de 200 milhões de dólares (180 milhões de euros) considerado pouco transparente, que envolveu o empresário angolano António Mosquito.
A Secretaria de Estado do Vaticano recorreu a consultores externos, em 2012, para realizar um empréstimo de 200 milhões de dólares, com fundos que tinha em contas bancárias suíças, à Falcon Oil, uma empresa petrolífera angolana, controlada pelo conhecido empresário de Angola, que também tem negócios em Portugal.
Porém, depois de ter decidido não conceder o empréstimo à Falcon Oil, a Secretaria do Vaticano decidiu investir a verba, ao mesmo tempo que investigou o investimento em Londres.
O mesmo órgão informativo diz que Becciu foi instrumental em travar as reformas financeiras que foram iniciadas pelo cardeal George Pell no Vaticano.
Apesar de o Papa Francisco ter dado à Prefeitura para a Economia toda a autonomia para supervisionar as finanças do Vaticano, Becciu interveio em 2016 quando se anunciou uma auditoria externa a todos os departamentos do Vaticano. Becciu, sem autorização do Papa, cancelou a auditoria e anunciou aos departamentos que a mesma não se iria realizar.
Becciu foi ainda responsável por despedir o primeiro auditor-geral do Vaticano, o italiano Libero Milone, a quem acusou de espionagem.
Numa curta nota enviada à imprensa, a Santa Sé diz apenas que “hoje, quinta-feira, 24 de setembro, o Santo Padre aceitou a resignação do cargo de Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos e os diretos do cardinalato associados, apresentado por sua eminência o cardeal Giovanni Angelo Becciu”.
Não é certo o que significa, precisamente, o abdicar dos direitos do cardinalato. O ex-cardeal McCarrick, por exemplo, foi mesmo expulso do Colégio dos Cardeais, mas não é esse o caso com Becciu. A sua situação parece ser mais parecida com a do cardeal Keith O’Brien, que deixou de frequentar eventos eclesiásticos e não participou no conclave que elegeu o atual Papa. Tecnicamente, Becciu continua a ser cardeal.
[Notícia atualizada às 20h46]