O programa do novo governo dos Açores “passou” esta sexta-feira. PSD, CDS e PPM votaram favoravelmente, o que com a abstenção do Chega, do PAN e da IL permitiu ao programa do Executivo avançar. José Manuel Bolieiro vai, assim, governar com a coligação CDS e PPM e sem "necessidade de acordos", defendeu esta sexta-feira.
O chefe do executivo considerou que o Programa “formaliza uma visão de década para o presente e para o futuro dos Açores”, isto depois de o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda terem votaram contra, na sessão que decorreu esta manhã na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na ilha do Faial.
“Quem votou contra deseja a instabilidade, colocou-se do lado do problema e não do lado das soluções, onde nós estamos. Essa marca fica inscrita já nesta sessão do parlamento e com a votação de cada um”, afirmou Bolieiro, apontando à bancada do PS e destacando que o Programa de Governo reúne um conjunto de ações "provindas das propostas eleitorais de outros partidos”.
Caso os cinco deputados do Chega se tivessem juntado ao PS e BE no voto contra, haveria uma maioria absoluta para chumbar o documento, o que de acordo com o Estatuto Político-Administrativo dos Açores, implicaria a demissão do executivo.
O Chega queria fazer com que o seu sentido de voto dependesse da entrada — ou não— do partido no executivo, contudo, a exigência não foi atendida e o Chega acabou por deixar cair a reivindicação, admitindo um entendimento com o PSD.
Segundo José Pacheco, deputado do Chega, o entendimento em questão não se trata de um “acordo parlamentar” – como ocorreu em 2020 –, pois não obriga o partido a ter de “votar ou deixar de votar o que quer que seja no parlamento".
O deputado referiu ainda que o Chega deixou cair a reivindicação de integrar o executivo por não andar "atrás de lugares".
"Nós sempre dissemos isto: podíamos trabalhar de qualquer forma. Preferíamos, se calhar, estar dentro do governo, mas talvez seja melhor estarmos fora do governo e, com as nossas propostas, contribuir para que as propostas do governo sejam melhoradas", afirmou José Pacheco.
Antes da votação, Bolieiro tinha referido que ia negociar o orçamento e outras matérias de governação com quem permitisse aprovar o programa do Governo, o que o deixará, então, em negociações com IL, PAN e Chega.
Bolieiro governa com "humildade democrática” e sem “necessidade de acordos”
Depois de aprovado o programa, o chefe do executivo, José Manuel Bolieiro, afirmou que “acatou” a decisão do povo, que é “soberano”, e que, por isso, governará em coligação com o CDS e PPM, mas que terá abertura para o “diálogo e concertação decorrente da pluralidade representativa que o povo quis manter no Parlamento”.
Bolieiro assegurou ainda ter a “postura de humildade democrática” de aceitar e responder “às opções do povo”.
O chefe do executivo considerou ainda que o programa do executivo “formaliza uma visão de década para o presente e para o futuro dos Açores”, que é uma referência estratégica para o arquipélago e oferece um caminho de “continuidade às boas políticas que geram bons resultados”.
O Programa do Governo, defendeu, é a referência de “uma estratégia para o futuro e com futuro, de uma estratégia para proteger os mais frágeis e que precisam de ser valorizados, de uma estratégia que dá esperança aos jovens e a todos os açorianos, porque dá espaço ao seu espírito de iniciativa, porque promove a solidariedade entre iguais e desiguais, porque defende a sustentabilidade e o ambiente”.
Já questionado sobre a acusação do Bloco, de que Bolieiro deu uma “cambalhota” em relação às afirmações anteriores – de não contar com o Chega e de agora o seu programa ficar dependente da abstenção do partido para passar –, o chefe do executivo respondeu: “Cambalhota foi a do Bloco de Esquerda, que deixou de ser grupo parlamentar e passou a ser a representação parlamentar.”
Bolieiro defendeu que “os resultados eleitorais falam pelo (…) projeto que o Bloco de Esquerda tem”, considerando que este “é rejeitado pela generalidade dos países que procuram o seu desenvolvimento” e pela maioria dos açorianos e que “o BE não é uma referência nem doutrinária, nem ideológica nem de regime” para “o povo dos Açores” e que, por isso, não está preocupado.
Já sobre a existência de linhas vermelhas, Bolieiro refere que essas existem, “desde logo, a concretização do programa do Governo, que foi legitimado pelo povo e pelo Parlamento” e assegura que não cederá aos seus princípios e valores e ao cumprimento do programa, que descreve como “personalista, humanista, democrático e progressista, porque promove o desenvolvimento dos Açores”.
O presidente do Governo Regional dos Açores justificou ainda que não há “necessidade de acordos” e que não está em causa a assinatura de tal, mas sim “a negociação para estes instrumentos” e explica que o governo seguirá uma perspetiva plurianual — baseada em orientações como no PRR — com a possibilidade de entendimentos.
“O primeiro documento que tem essa perspetiva são as orientações a médio-prazo e, por isso, tem de haver um atendimento para os tais marcos e metas na linha inspirada do que acontece com o PRR para cumprirmos estas orientações”, explica.
O que disseram os partidos?
O PAN, que optou pela abstenção na votação do programa, defendeu que, apesar de este não ser o documento que o partido entregaria, há "espaço" para melhoramento e diálogo é a solução.
"Da análise do documento, vemos que há espaço para o seu melhoramento e o diálogo é a chave. Esta é a postura do PAN Açores — construir pontes para trilhar o caminho do sucesso. Por isso, abstemo-nos nesta expectativa de que seja um incentivo à abertura para a implementação de reformas, que devem ser honradas", justificou Pedro Neves, acrescentando que viu "com bons olhos" a inclusão de algumas medidas do partido apresentadas ou aprovadas durante a legislatura anterior, como o fim das quotas de avaliação dos trabalhadores da função pública, a valorização do trabalho suplementar dos médicos ou a criação de incentivos à atração e fixação de docentes, entre outras.
Contudo, salienta, "não é suficiente".
"As diferenças que afastam o PAN deste programa são significativas e até dramáticas para a ideologia PAN, da qual, obviamente, destaco a total ausência de uma estratégia política de combate ativo à emergência climática", explicou, acrescentando que a proteção e bem-estar animal também "está arredada" do documento.
"Então e os outros animais? Esses são objetificados e espremidos para produzir leite até à última gota, na senda da política regional da monocultura. Esta é a matriz da agricultura nos Açores, de tal ordem que a aposta na autossuficiência alimentar passa pela produção de sorgo e milho".
"No entanto, embora seja um documento parco em medidas inovadoras e responsivas a todos os setores da sociedade, descuidando a vivência harmónica entre Pessoas, Animais e Natureza, não é nosso desígnio acender o rastilho da instabilidade política - não é o que o povo quer", justificou.
Já o deputado da IL Açores considerou que, tal como em 2020, "continua a ser fundamental mudar de política" na região. "Hoje, como já era em 2020, continua a ser fundamental mudar de política, muito mais do que mudar de políticos", afirmou Nuno Barata.
"A proclamação da intenção de 'mudança de paradigma' sucumbiu à continuidade com políticas do passado que não garantem melhor futuro a esta região e aos açorianos", defende o deputado da IL, acrescentando que ainda falta fazer "uma verdadeira reforma do setor público empresarial regional, seja no setor da energia ou no setor dos transportes" e destacando que "continua sendo imperioso um Governo da região que inverta a trajetória de endividamento dos últimos 40 anos, porque um euro de dívida constituída hoje é um euro de impostos a cobrar amanhã".
Já o deputado único do BE no hemiciclo dos Açores, António Lima, considerou que este programa é "mais do mesmo" e o partido terá de ser "a oposição da esperança e de confiança".
"O Programa do Governo apresenta as mesmas soluções e o mesmo objetivo estratégico de desenvolvimento que foi rejeitado no último Orçamento pelos parceiros da coligação. Um modelo que coloca o mercado à frente das pessoas", disse.
António Lima criticou também a postura do Chega em relação à votação: "Bastou uma conversa e o Chega abraçou o sistema".
O BE defende uma alternativa "que responda a quem não tem como pagar a casa e que não encontra resposta neste Programa, que responda a quem o salário não chega ao fim do mês e não encontra resposta neste Programa e neste Governo [Regional]".
O deputado regional do PS João Castro termina considerou que o que separa PS e PSD são "aspetos fundamentais, que se constituem como opções estruturantes de governação".
"Bem sabemos que a coligação desejaria que o PS se submetesse aos seus ditames para não ferir uma alegada estabilidade, abstendo-se ou votando a favor do Orçamento", afirmou, acusando ainda a coligação de direita ter ferido a "estabilidade", porque "não conseguiu manter os acordos que a mantinham".
O executivo de Bolieiro tomou posse a 4 de março, na sequência da vitória nas eleições regionais antecipadas de 4 de fevereiro, sem maioria absoluta.