Negociações fracassaram e nacionalização da TAP avança na quinta-feira
01-07-2020 - 13:54
 • Susana Madureira Martins com Renascença

Não é necessária qualquer autorização da Comissão Europeia para esta operação que reverte a companhia aérea para o Estado português.

A negociações entre o Estado e David Neeleman, um dos donos da Atlantic Gateway, que detém 45% do capital da TAP, fracassaram, confirmou a Renascença junto de uma fonte do Governo. Assim, o processo de nacionalização da companhia aérea avança já na quinta-feira.

De acordo com a referida fonte, o norte-americano terá recusado, em definitivo, as condições do Estado para ajuda à TAP, pelo que o decreto de lei de nacionalização será aprovado esta semana em Conselho de Ministros.

A mesma fonte do governo adianta à Renascença que não é necessária qualquer autorização da Comissão Europeia para esta operação que reverte a companhia aérea para o Estado português.

A decisão do governo está tomada, é certo que o diploma é aprovado amanhã, mas há abertura para negociar uma nova solução, caso David Neeleman mude de ideias à última hora.

Para o governo o futuro do americano na TAP é muito simples: a porta de saída e é garantido à Renascença que Neelman sai da empresa "seja de que maneira for".

É ainda garantido à que o executivo liderado por António Costa não deu "tempo nenhum" para um eventual regresso às negociações, mas fica o aviso: "depois de aprovar [o decreto em Conselho de Ministros] é que já não há nada a fazer".

História de um desacordo luso-americano


David Neeleman era, desde o início, o grande entrave a um acordo entre a Atlantic Gateway, que detém juntamente com o português Humberto Pedrosa, e o Estado, representado nas negociações pela Parpública.

A primeira proposta do Estado para ajuda à TAP SGPS, que contemplava um empréstimo de até 1.200 milhões de euros, foi chumbada pelo Conselho de Administração da companhia aérea, confirmou o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, na terça-feira.

O negócio teria falhado porque, segundo o "Eco", o Governo queria que 217 milhões de prestações acessórias dos privados passassem a capital social, condição que o empresário norte-americano teria recusado.

No entanto, Pedro Nuno Santos manifestara intenção de não deixar cair a TAP, algo que seria, acredita, "um desastre económico e social": "Vamos submeter a proposta ao sócio privado e esperamos que aceite."

Na cerimónia de reabertura de fronteiras com Espanha, em Elvas, o primeiro-ministro, António Costa assumiu que esperava ver a situação da TAP resolvida ainda esta quarta-feira, de preferência por via de um acordo com os privados e não com nacionalização. Contudo, avisou que, se fosse caso disso, avançaria para "um ato de imposição do Estado".

"Se tivesse de apostar, diria que hoje é o dia da solução para a TAP e espero que negociada e por acordo com os nossos sócios privados e não com um ato de imposição do Estado. Se for necessário, cá estaremos para isso. Esperemos que não seja", declarou aos jornalistas.

Questionado se contava com Pedrosa e Neeleman para o acordo pela TAP ou só com um dos dois empresários, António Costa manifestou a crença de que "a questão será ultrapassada muito rapidamente".

Nacionalização controlada ou forçada?


Resta saber, caso a informação avançada pelo "Expresso" se confirme, se o Estado procederá à nacionalização controlada ou forçada - isto é, se excluirá apenas David Neeleman ou também Humberto Pedrosa.

De qualquer modo, uma cláusula no acordo de reversão da privatização da TAP, assinado em 2016 pelo primeiro governo de António Costa, complicará as contas públicas. A cláusula 24 dita que, caso force a nacionalização da TAP, o Estado terá de pagar o valor estipulado por uma avaliação independente das ações adquiridas à Atlantic Gateway, empresa que detém 45% do capital da companhia aérea, mais 20%.

Caso opte por avançar para a nacionalização controlada, o Estado comprará a posição de David Neeleman na TAP SGPS e manterá Humberto Pedrosa como acionista privado. Aí, o Estado teria de pagar ao empresário norte-americano o preço das suas ações, estipulado por uma avaliação independente, mais 20% sobre esse valor.

Caso não haja acordo com Humberto Pedrosa, o Estado poderá recorrer à nacionalização forçada. Aí, adquiriria as ações de ambos os empresários, que sairiam do Conselho de Administração da TAP SGPS.

No entanto, neste segundo cenário, o problema da cláusula 24 da reversão da privatização não só se mantém, como se agrava: o Estado teria de pagar o preço dos 45% de capital detido pela Atlantic Gateway, novamente estipulado por uma avaliação independente, mais 20%.