O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse num encontro com a chanceler alemã, Angela Merkel, esta sexta-feira, que vai travar quaisquer tentativas do Presidente dos EUA, Donald Trump, para bloquear um projeto de gasoduto partilhado pelos dois países.
Berlim e Moscovo têm estado de candeias às avessas desde a anexação da Crimeia pela Rússia há quatro anos, mas partilham interesses na forma do projeto de gasoduto Nordstream 2, que vai permitir à Rússia exportar mais gás natural para o norte da Europa.
Esta semana, uma fonte oficial do governo norte-americano disse que Washington está preocupado com o projeto e que as empresas envolvidas em projetos de gasodutos e oleodutos russos enfrentam um elevado risco de serem sancionadas pelos EUA.
"Donald [Trump] não é apenas o Presidente dos EUA, também é um empresário bom e duro", declarou Putin citado pela Reuters após um encontro com Merkel na cidade de Sochi.
"Ele está a promover os seus interesses empresariais, para garantir a venda de gás natural líquido no mercado europeu. Compreendo o Presidente dos EUA, está a defender os seus interesses e negócios, quer forçar o seu produto no mercado europeu. Mas isso vai depender de nós e de como construímos as nossas relações com os nossos parceiros na Europa. Acreditamos que [o gasoduto com Berlim] é benéfico para nós e vamos lutar por ele."
Moscovo e Berlim unidos quanto ao Irão
Merkel, que horas antes recebeu um ramo de rosas brancas e cor-de-rosa de Putin à chegada à residência do Presidente russo em Sochi, também fez referência às tensões entre Berlim e a administração Trump. Para além do Nordstream 2, as capitais europeias estão em desacordo com os EUA face à decisão de Trump de abandonar o acordo nuclear com o Irão, outra posição europeia que é apoiada por Moscovo.
“A Alemanha, o Reino Unido, França e todos os nossos parceiros da União Europeia continuam a apoiar este acordo e continuam empenhados neste acordo", disse Merkel na conferência de imprensa. "Temos noção de que se criou uma situação específica e que nós, europeus, temos de discutir isto com o Irão. O acordo está longe de ser perfeito mas é melhor do que não haver acordo nenhum."
Questionada sobre os desentendimentos com os EUA, Merkel acrescentou: "Temos uma amizade transatlântica forte que, ao longo da sua história, sobreviveu a muitas opiniões diferentes. Penso que este pode ser um desses casos. De qualquer forma isso não põe em causa a intensidade da relação transatlântica."
Alguns comentadores têm apontado que esta oposição partilhada contra a decisão de Trump sobre o Irão e outros assuntos pode levar a uma reaproximação entre a Europa e a Rússia, ajudando a reparar uma relação que ficou gravemente danificada com o conflito estalado na Ucrânia em 2014.
Apesar de ser um crítico assíduo das políticas norte-americanas, o líder russo tem-se manifestado sempre favorável à maioria das declarações de Trump, com quem terá desenvolvido uma relação pessoal, segundo fontes do Kremlin. O que disse esta sexta-feira ao lado de Merkel sobre um potencial braço-de-ferro com o Presidente norte-americano marca uma viragem nessa postura, pelo tom "invulgarmente franco" que usou, assim definido pela Reuters.
Nordstream 2 e a Ucrânia
A Alemanha e os outros Estados europeus envolvidos na construção do gasoduto dizem que é um projeto estritamente comercial, mas a administração Trump continua a argumentar que está a ajudar o Kremlin a concretizar a sua agenda política quatro anos depois da queda de Viktor Ianukovitch na Ucrânia e da anexação da Crimeia pelos russos.
O gasoduto, explica a Reuters, pode vir a resultar em menos gás a ser transportado através da Ucrânia, o que irá retirar ao governo apoiado pelo Ocidente parte da receita vital que tem obtido em taxas de trânsito deste combustível.
Numa aparente concordância com os EUA, pelo menos em parte, Merkel disse que o gás russo deverá continuar a atravessar o território ucraniano até chegar ao Norte da Europa. "Vemos o Nordstream 2 como um projeto económico mas que também tem outras implicações, é por isso que estamos a trabalhar para ver que garantias podemos dar à Ucrânia", sublinhou a chanceler.
Ao seu lado, Putin disse que está disposto a negociar com Kiev o contínuo transporte de gás russo através do país.