Um tribunal parisiense absolveu esta segunda-feira o fabricante europeu Airbus e a companhia aérea Air France da acusação de homicídio involuntário após a queda em 2009 do voo de ligação Rio de Janeiro/Paris, que matou 228 pessoas.
Quase 14 anos após o desastre, o tribunal criminal de Paris absolveu as duas empresas, decidindo que, embora tivessem existido “falhas”, tal “não permitiu demonstrar qualquer relação causal” com o acidente com o voo AF447, um Airbus A330-200.
O acidente levou a mudanças duradouras nas medidas de segurança das aeronaves, uma vez que a investigação oficial descobriu que para o acidente contribuíram múltiplos fatores, incluindo erro do piloto e a sobreposição de gelo nos sensores externos.
A leitura da decisão foi presenciada por familiares de vítimas, com alguns a chorar, uma vez que aguardavam uma condenação de ambas as empresas, deixando-os estupefactos, segundo relatou a agência noticiosa France-Presse (AFP).
O julgamento, que durou cerca de dois meses (entre 10 de outubro a 8 de dezembro de 2022), deixou as famílias enlutadas em raiva e desilusão.
Invulgarmente, até o Ministério Público defendeu a absolvição, admitindo que o processo não produziu provas suficientes de atos ilícitos criminais por parte das duas empresas.
A acusação atribuiu a responsabilidade sobretudo aos pilotos, que também morreram no acidente. Os advogados da Airbus também culparam o erro do piloto e os da Air France defenderam que as verdadeiras causas do acidente nunca serão conhecidas.
Ninguém corre o risco de ser preso, pois apenas as empresas estão a ser julgadas naquele que foi o mais mortífero acidente da história das companhias aéreas francesas.
A Air France já indemnizou as famílias das pessoas mortas, oriundas de 33 países, em grande parte franceses (72) e brasileiros (58).
O que aconteceu?
O avião A330-200 desapareceu do radar numa tempestade sobre o Oceano Atlântico a 1 de junho de 2009, com 216 passageiros e 12 membros da tripulação a bordo.
Para encontrar o avião foram necessários dois anos, o que permitiu recuperar as gravações contidas nas caixas negras, que se encontravam no fundo do oceano, a mais de 4.000 metros de profundidade.
Os primeiros destroços foram encontrados nos dias que se seguiram ao acidente, mas o grosso do aparelho só viria a ser localizado dois anos mais tarde, após uma longa busca.
As caixas negras confirmaram o ponto de partida do acidente: o gelo nos sensores de velocidade “pitot” enquanto o avião voava a grande altitude numa difícil zona de “turbulência” perto do equador.
Um dos copilotos, perturbado pelas consequências desta falha, adotou uma trajetória ascendente e, num estado de incompreensão, os três pilotos não conseguiram recuperar o controlo do avião, que estagnou e se despenhou no oceano 4,23 minutos mais tarde.
As investigações revelaram que incidentes com sensores semelhantes tinham ocorrido repetidamente nos meses que antecederam o acidente.
Quatro imprudências ou negligência
Para o tribunal, a Airbus cometeu “quatro imprudências ou negligência”, em particular não ter substituído o modelo dos sensores ‘pitot’, conhecido como “AA”, que parecia congelar mais frequentemente na frota A330-A340, e o facto de ter mostrado “retenção de informação” das empresas.
A Air France cometeu duas “imprudências”, ligadas à forma como distribuía uma nota de informação aos seus pilotos sobre a falha dos sensores.
No entanto, segundo o tribunal, do ponto de vista penal, “um provável nexo de causalidade não é suficiente para caracterizar uma infração”.
Neste caso, no que diz respeito às falhas, não pôde ser demonstrado um nexo de causalidade com o acidente.
Durante o julgamento, que decorreu entre 10 de outubro a 8 de dezembro de 2022, o Ministério Público pediu a absolvição, considerando que a culpa das empresas era “impossível de provar”.