A coordenadora de emergência da organização Médicos Sem Fronteiras criticou a tolerância que Bruxelas tem demonstrado para com a crise nas suas fronteiras com a Bielorrússia, sublinhando que têm sido violados direitos humanos em países da União Europeia.
“A UE tem estado muito silenciosa em toda esta crise, que é uma crise humanitária, não uma crise migratória ”, afirmou Frauke Ossig em declarações por telefone à agência Lusa.
A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) anunciou, na semana passada, que se iria retirar das fronteiras da Polónia e da Lituânia com a Bielorrússia depois de três meses a tentar, sem sucesso, obter autorizações para entrar nas chamadas zonas restritas, onde dezenas de migrantes acampam ao frio à espera de uma oportunidade para entrar no espaço da UE.
Estas zonas restritas situam-se junto à fronteira, mas chegam a ter uma profundidade de três a cinco quilómetros e foram criadas pela declaração de estado de emergência tanto na Polónia como na Lituânia.
Os dois países proibiram a entrada de organizações humanitárias e de jornalistas nestas zonas restritas, deixando sem assistência internacional os migrantes e refugiados que se juntaram naquela área desde o verão do ano passado.
“A legislação nacional que alguns países da UE têm adotado e os estados de emergência que têm sido declarados têm, na nossa opinião, violado direitos humanos fundamentais e o direito de as pessoas pedirem asilo”, afirmou Frauke Ossig.
“A tolerância relativamente às expulsões (tanto os países europeus como a Bielorrússia têm ‘empurrado’ os migrantes para o outro lado das suas fronteiras) não devia acontecer em território da UE”, sublinhou a responsável da MSF.
“O direito de as pessoas pedirem proteção internacional tem sido violado em dois países da UE: a Polónia e a Lituânia”, acusou.
“As pessoas não estão a ver cumpridos os seus direitos humanos básicos - estamos a falar de mulheres, crianças e homens que são forçados a esconderem-se nas florestas sob temperaturas negativas ou a enfrentarem violência, (situações que) são do conhecimento das autoridades e que acontecem em solo europeu”.
A coordenadora de emergência da organização adiantou, no entanto, que, para já, não está planeado recorrer a um tribunal de direitos humanos, seja o europeu ou o internacional.
Para a responsável da MSF, o acesso às zonas restritas é fundamental para as organizações humanitárias poderem ajudar “onde é mais preciso ”, porque, apesar de não ser possível contabilizar o número de pessoas que se escondem nas florestas, “estima-se que haja cerca de uma centena” a viver sob temperaturas negativas, a beber apenas a água que encontram no caminho e, muitas vezes, sem agasalhos ou comida.
A MSF não é a primeira organização internacional a criticar os países em causa por negarem acesso à zona fronteiriça.
Desde o final do verão que a Polónia e a Lituânia enfrentam uma vaga migratória de cidadãos oriundos de países do Médio Oriente e da Ásia Central, que desejam entrar na Europa.
No total, foram contabilizadas mais de 30 mil tentativas de entradas irregulares no espaço da União Europeia (UE).
Varsóvia e a UE acusam o regime bielorrusso, liderado pelo Presidente Alexander Lukashenko, de “instrumentalização de migrantes”, ao incentivar a chegada de milhares de pessoas em especial à fronteira polaca, com a atribuição de vistos alegadamente para efeitos de turismo e promessas de uma entrada fácil na Europa.
Centenas destes migrantes permaneceram durante meses acampados naquela região e pelo menos 14 morreram de hipotermia devido às condições precárias em que viviam.