O constitucionalista e antigo presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (CFSIRP) Jorge Bacelar Gouveia considera que Marcelo Rebelo de Sousa deveria convidar António Costa a formar um novo Governo, sem dissolver o Parlamento, num instrumento que está ao dispor do Presidente da República e que nunca foi usado em Portugal.
Bacelar Gouveia considera, por outro lado, em entrevista à Renascença que, em caso algum o SIS poderia ter sido chamado a recuperar um computador. Não podia ser chamado por João Galamba, ministro das Infraestruturas, e nem o próprio António Costa o poderia fazer.
O antigo presidente do Conselho de Fiscalização do Serviço de Informações da República classifica ainda como "perturbador" o silêncio, até agora, de Constança Urbano de Sousa, a presidente do CFSIRP, e antiga deputada e ex-ministra do PS, dado que se trata de uma situação "que está a causar alarme".
O ministro Galamba podia ter pedido a intervenção do SIS para recuperar um computador do ministério, com suposta informação reservada?
Não porque estando em causa a suspeita em relação à própria de um crime, o SIS não tem competências em matéria de investigação criminal.
E se fosse António Costa a pedir ao SIS, podia?
Não, porque embora tenha poder de direção sobre o organismo (SIS), o organismo nunca teria competência material para fazer o que fez.
Ou seja, o SIS não poderia ter ido buscar o computador?
Acho que não. É a leitura que eu faço da lei-quadro que, nesse aspeto, no artigo 4º, é muito clara.
Quais devem ser as consequências a partir de agora...quanto ao diretor do SIS e quanto ao próprio Governo?
Acho que, em primeiro lugar, é preciso saber o que é que se passou. Até agora estamos a lidar com factos que são relatados pela comunicação social...
Mas, a confirmarem-se, são suficientes para que o Presidente da República possa, por exemplo, dissolver o Parlamento?
Eu acho que, neste momento, não há razão para dissolver o Parlamento. Acho que não há uma crise política grave, generalizada...
Mas pode, deve, obrigar a uma remodelação?
Há um instrumento, que está ao dispor do Presidente da República, e que eu acho que nunca foi usado em Portugal, que é a possibilidade de demitir o governo. Ou seja, acabar com este governo, ao abrigo do artigo 195 nº2, e pedir à mesma maioria para formar um novo governo. Seria fazer um “restart” no governo, portanto passarmos para o 24º governo constitucional...mas, mantendo o Parlamento e a legislatura.
Era isso que devia fazer o Presidente da República, na sua opinião?
Acho que as condições se encaminham para que essa seja a decisão mais prudente: Exonerar este governo e pedir ao Dr. António Costa para formar um novo governo, mantendo a legislatura e não dissolvendo o Parlamento.
O senhor já liderou o Conselho de Fiscalização do SIS. O que é que, nesta altura, já teria feito que Constância Urbano de Sousa ainda não fez? Até agora tem sido o silêncio completo...
Sim, é um silêncio estranho e perturbador, porque esta é uma situação que está a causar alarme. As pessoas ficam com medo de que, afinal, se isto aconteceu com este adjunto, possa acontecer com outras pessoas...funcionários do SIS interferirem e atropelando, até, competências de investigação criminal de outras polícias. Neste caso, a competência é exclusiva da Polícia Judiciária, se é de segredo de Estado que nós estamos a falar.
E, portanto, (no lugar de Constança Urbano de Sousa) teria já feito uma comunicação. Teria tido uma intervenção imediata na comunicação social. Aliás, como eu fiz, quando fui Presidente, em várias situações críticas que ocorreram...e depois iniciava imediatamente um conjunto de procedimentos de averiguação no que respeita a apurar responsabilidades.