A Orquestra de Filadélfia, nos Estados Unidos, anunciou hoje ter rescindido o convite feito ao tenor espanhol Plácido Domingo para o concerto de abertura da temporada, na sequência das denúncias de assédio sexual feitas sobre o cantor.
"A Associação da Orquestra de Filadélfia retirou o seu convite a Plácido Domingo para que aparecesse no concerto de noite de abertura, no dia 18 de setembro. Estamos empenhados em criar um ambiente seguro, solidário, respeitoso e apropriado para a Orquestra e pessoal, para artistas convidados e compositores, e para as nossas audiências e comunidades", adiantou aquela estrutura num comunicado publicado na sua página oficial.
Por seu lado, o festival de Salzburgo, na Áustria, manteve as atuações previstas do tenor nos dias 25 e 31 de agosto, na ópera "Luisa Miller", de Verdi.
O cantor espanhol Plácido Domingo terá assediado sexualmente várias mulheres e usado a sua posição para as punir quando o recusavam, tendo a agência de notícias Associated Press divulgado esta terça-feira relatos de profissionais do meio a confirmar esses comportamentos.
Numa extensa investigação por parte da agência norte-americana de notícias, oito cantoras e uma bailarina disseram ter sido assediadas sexualmente por Plácido Domingo, numa série de acontecimentos que ocorreram ao longo de três décadas, em espaços que incluíam companhias de ópera onde o cantor ocupava cargos de direção. Muitas dizem ter sido avisadas por colegas para nunca ficar a sós com Domingo.
Seis outras mulheres relataram à AP avanços que lhes causaram desconforto, em particular uma cantora que Plácido Domingo repetidamente convidou para sair, depois de a ter contratado para uma série de concertos na década de 1990.
Adicionalmente, quase 30 outras pessoas ligadas à indústria musical, desde cantoras a músicos de orquestra, passando por professores de canto e administradores, confirmaram ter testemunhado comportamentos impróprios de índole sexual por parte do cantor espanhol, que atualmente conta 78 anos.
Das nove pessoas que acusam o cantor, apenas a meio soprano Patricia Wulf aceitou divulgar o seu nome, tendo as restantes pedido anonimato por temer represálias profissionais e pessoais.
Sete das nove mulheres disseram acreditar que as carreiras sofreram por terem rejeitado os avanços sexuais de Plácido Domingo.
Contactado pela AP, Placido Domingo não respondeu às questões específicas sobre as acusações, declarando que "as alegações destas pessoas, cujo nome não é divulgado e que remontam até há 30 anos, são profundamente perturbadoras e – da forma como são apresentadas – imprecisas".
"Ainda assim, é doloroso ouvir que posso ter incomodado alguém ou causado desconforto, não importa há quanto tempo e apesar das minhas melhores intenções. Acreditei que todas as minhas interações e relações foram sempre bem-vindas e consensuais. Quem me conhece ou trabalhou comigo sabe que não sou alguém que intencionalmente magoasse, ofendesse ou embaraçasse outra pessoa", acrescentou o cantor, que diz que "as regras e padrões" de hoje são "muito diferentes do que foram no passado".
A influência do cantor no meio – membro do conjunto de Três Tenores, com José Carreras e Luciano Pavarotti, diretor-geral da Ópera de Los Angeles, presidente da Europa Nostra, presidente da administração da Federação Internacional da Indústria Fonográfica e responsável pelo concurso Operalia, que se realizou em Lisboa no ano passado – é tamanha, que só Wulf, que se encontra afastada dos palcos, aceitou dar a cara em declarações à AP.
Muitas das pessoas admitiram sentir-se fortalecidas pelo movimento #MeToo e decidiram que a maneira mais eficaz de atacar a má conduta sexual na indústria era denunciar o comportamento da figura mais proeminente da ópera.