O antigo secretário de Estado do Ambiente Carlos Pimenta abandona a SEDES por discordar frontalmente da estratégia global do modelo de desenvolvimento para Portugal apresentada pela Associação para o Desenvolvimento Económico e Social.
Carlos Pimenta foi um dos governantes mais ativos na área ambiental nas décadas de 80 e 90 do século passado, tendo ocupado as pastas do Ambiente e das Pescas, além de vários mandatos como deputado na Assembleia da República e no Parlamento Europeu. Empresário e gestor de empresas de energias renováveis desde há mais de 20 anos, o histórico militante do PSD critica o relatório da SEDES, Associação para o Desenvolvimento Económico e Social, recentemente apresentado, com propostas para duplicar o crescimento económico nos próximos 20 anos.
Em entrevista à Renascença, registada na sua mais recente passagem por Lisboa para participar na Conferência sobre 50 anos de Políticas Ambientais, organizada pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Carlos Pimenta explica as razões da sua demissão que anunciou, minutos antes e sem detalhes, na evocação da Conferência de Estocolmo que em 1972 representou um impulso decisivo para as políticas ambientais em todo o mundo.
Quais as razões da sua saída da SEDES?
Achei que o caminho era errado na estratégia global do modelo de desenvolvimento para Portugal. Este não pode ignorar a sustentabilidade ambiental e as emissões de CO2, sendo contranatura face ao património natural do país, ao caminho para onde vão, o mundo, as tecnologias e as pessoas. Somos um pequeno país que tem apostar na qualidade e no valor acrescentado, o que hoje é indissociável dos critérios de sustentabilidade nos materiais, energia e nas emissões.
Qual foi a gota de água para si na posição expressa pela SEDES e que considera inaceitável?
É ignorar que Portugal tem que caminhar para a redução das suas emissões, para o aumento dramático da eficiência da energia e nas matérias-primas que utiliza na sua vida quotidiana, incluindo na produção de bens de exportação como o têxtil e o calçado. O caminho não pode ser outro. Não me revejo neste [da SEDES] em que não se aborda o problema sistémico. É como um doente com um cancro em que o médico trata epifenómenos como uma dor de cabeça ou de garganta.
A SEDES mostra-se preocupada com a necessidade do crescimento económico, falando da necessidade de duplicar o PIB (Produto Interno Bruto) português em 20 anos.
O crescimento económico é hoje indissociável da sustentabilidade, da economia circular, da eficiência energética e da descarbonização. Se não basearmos a nossa estratégia nisso, vamos chegar a resultados errados. Quando a direção é errada, a velocidade pode até ser um problema.
Colocou a questão internamente na SEDES?
Não, porque trabalho e vivo já há uns anos fora de Portugal. Sou sócio da SEDES há décadas, foi uma associação muito importante na qualidade da reflexão que fez. A SEDES, mesmo na filosofia de liberdade dos grupos de trabalho, não é um albergue espanhol, em que o carimbo de uma organização valida os maiores disparates científicos. A ciência não tem qualquer dúvida que, se não invertermos o caminho no sentido da sustentabilidade, esta Terra – e há só uma – não chega. Este relatório da SEDES está completamente divorciado da questão da sustentabilidade.