Marta Ferreira decidiu sair do Alentejo há seis anos. A decisão de emigrar não foi fácil, mas a situação dos enfermeiros em Portugal não era famosa.
A oportunidade de auferir um salário condizente com a sua profissão falou mais alto e decidiu deixar a localidade de Cortiço, no concelho de Estremoz, para rumar a Londres.
Agora com 30 anos, Marta regressou à sua região natal, propositadamente, para se juntar ao grupo de peregrinos que saiu, esta quinta-feira, do Santuário de Nossa Senhora da Conceição, em Vila Viçosa.
“É a minha primeira peregrinação, e o que me leva a fazê-la é a fé”, conta à reportagem da Renascença.
Incentivada pela mãe, a enfermeira católica, que não conhece ninguém no grupo, pretende viver “uma boa experiência”, sobretudo num plano de “aprofundamento da fé”, depois do período complicado que se viveu em todo o mundo com a pandemia.
“A pandemia ainda não acabou, é preciso ter isso presente, mas tivemos realmente um período muito difícil e, por isso, é também altura de agradecer. Não podemos ser egoístas e temos que pensar em todos”, diz a profissional de saúde, que agora se faz peregrina.
Não é propriamente uma estreante, é a segunda vez que vai a pé a Fátima. Conceição Coelho não sabe explicar muito bem o que a motiva.
“Não sei explicar o que a gente sente para irmos, para lé chegarmos e o momento em que chegamos. É coisa muito pessoal e cada um sente à sua maneira”, confidencia, garantindo que só já deixa de ir se “as minhas pernas não deixarem”.
Aos 53 anos, diz que peregrina não para cumprir qualquer promessa, mas com a finalidade de “agradecer, apenas isso”, ainda mais depois de um período complicado de pandemia e, mais recentemente, com a guerra na Ucrânia.
“Faz muito sentido, depois desta pandemia e agora temos também a guerra, por isso há que pedir pela paz no mundo”, acrescenta, Conceição Coelho.
São intenções comuns a Maria Romero que vai a Fátima, com este grupo de Vila Viçosa, desde 2012. É espanhola, vive em Badajoz e já não concebe a sua vida sem esta prova de fé.
“É a convivência, uma amizade, o companheirismo, a entrega de uns aos outros, ajudando-nos mutuamente, sempre com alegria e com amor no coração. Tudo isto me faz vir ano após ano”, afirma Maria, de 59 anos, que começou a participar a convite do seu irmão.
E a fé?, perguntamos. “A fé nunca falta quando se trata de chegar aos pés de Nossa Senhora de Fátima de quem sou muito devota, apesar de ser espanhola”, responde.
Mais de duzentos quilómetros separam os dois santuários marianos. Este ano, o grupo conta com cerca de meia centena de peregrinos, mas já foram mais. A pandemia não afetou a fé, mas desajustou a vida de muita gente, conta-nos Teresa Carvalho, que dinamiza o grupo há mais de 20 anos.
“Já chegamos a ir daqui 80, mas acho que vai ser muito difícil voltarmos ao normal que conhecíamos. Não porque as pessoas não queiram vir, mas porque a situação económica complicou-se para muitas famílias e isto sempre comporta muitas despesas, nomeadamente medicamentos, alimentação e alojamento”, acentua a organizadora.
Teresa Carvalho sabe de muitas pessoas que gostariam de peregrinar, mas a sua situação financeira não o permite. “Como vê, não é uma questão de diminuição da fé, mas a pandemia trouxe muitas dificuldades”, lamenta.
Teresa vive há quatro décadas em Vila Viçosa, terra que adotou quando casou. Há mais de 20 que se orgulha de pertencer a este grupo de peregrinos, hoje em dia, também uma comunidade “de amigos”. Este ano, há novos elementos, “cerca de 14”, o que “é muito bom”, para “rejuvenescer o grupo”, que integra elementos de diferentes localidades.
O fim da pandemia e da guerra na Ucrânia está também nas intenções de Maria Teresa. Lembra, porém, a existência de “outras guerras” e de situações “difíceis mais perto de nós, nas famílias, nos amigos” e que vão ser igualmente depositadas aos pés de Nossa Senhora.
Em jeito de mensagem e como dinamizadora, espera “todos regressem bem e com mais força para encarar estes tempos de dificuldades”.
Na bagagem, a acompanhar os peregrinos, segue um novo Pendão de Nossa Senhora. Substitui o que acompanhou o grupo durante duas décadas e que, esta quinta-feira, num ato simbólico foi entregue ao Santuário da Padroeira de Portugal, onde vai figurar, emoldurado, como uma espécie de “ex-voto”.
“Este pendão ficará aqui, para lembrar os esforços dos peregrinos, os que estão a caminho e os que irão caminhar e que, daqui, do coração da Mãe de Portugal, possam chegar ao Coração da Mãe de Deus”, declarou o cónego Francisco Couto, reitor do Santuário de Vila Viçosa, na hora da partida.
O sacerdote que acompanhou o grupo na hora da partida, lembrou a importância de peregrinar e o seu significado.
“Peregrinar põe a nu a nossa vida, isso é importante para aceitarmos quem somos e podermos mudar aquilo que não está bem em nós”, destacou.
O reitor sublinhou ainda o valor da união, para que “o outro nos respeite, nos assista, nos acompanhe, nos enriqueça, nos fortaleça, e que sintamos que não estamos sozinhos neste caminhar”, pois “não é do homem estar só”.
Com partida do Santuário da Mãe de Portugal, rumo ao Santuário da Mãe de Deus, o grupo proveniente de Vila Viçosa, acompanhado por um sacerdote e um diácono, chegará ao destino no dia 11 de maio, a tempo da peregrinação aniversaria, que volta a juntar milhares de peregrinos portugueses e estrangeiros.