O deputado sorri ao recordar que esteve prestes a comentar uma "fake news" no Facebook, mas só não o fez por prudência, a mesma que os partidos usam agora para dizer como responder ao fenómeno das notícias falsas.
Sem querer ser identificado, o parlamentar recordou, à Lusa, num corredor da Assembleia da República, que viu a notícia, em que o alvo era o primeiro-ministro, António Costa, e não se precipitou no comentário porque achou estranha, pouco credível e desconfiou.
Sem precipitações, PS, PSD, PCP, BE e CDS não excluem eventuais mudanças legais, mas admitem que atuar a nível europeu pode ter vantagens, tratando-se de um fenómeno que não é apenas português, tem escala europeia, global até, e concordam, com algumas nuances, que pode ser uma ameaça à democracia.
O PS, disse à Lusa o deputado Porfírio Silva, não põe a questão num "ponto de vista de defesa do partido", mas sim na "defesa da democracia" e já está "a afetar as condições das sociedades democráticas, não só em termos políticos, mas também em termos societais".
"É uma enorme ameaça aos regimes democráticos se não se conseguir travar ou condicionar o fenómeno das ‘fake news’", segundo Manuel Teixeira, da direção do PSD e ex-diretor de "O Comércio do Porto".
À direita, o deputado do CDS-PP Telmo Correia afirmou que o fenómeno é "obviamente preocupante" e "claramente uma ameaça à democracia", porque é "uma ameaça à verdade e à transparência".
Bloco de Esquerda (BE) e PCP têm a mesma preocupação com as regras democráticas.
Jorge Costa, do BE, defende um "diálogo entre as instituições democráticas, em articulação com a comunicação social" de maneira a conseguir que os media promovam uma forma de consórcio que faça verifique a veracidade das notícias, para "combater a circulação de informações falsas".
O objetivo é que essa plataforma, a exemplo das de investigação jornalística, façam a "investigação e verificação" das informações, argumentando Jorge Costa que é também "um interesse estratégico" da comunicação social de referência "combater a disseminação" de “fake news”.
O PCP, afirmou à Lusa Carlos Gonçalves, da comissão política, não exclui mudanças legais e admitiu "acompanhar o que for positivo" da parte do Parlamento Europeu, que em outubro aprovou uma recomendação em que apela aos Estados que adaptem a legislação, nomeadamente eleitoral, ao mundo digital.
Esquerda e direita sugerem quase pelo mesmo tipo de resposta, a médio e longo prazo, embora usando discursos diferentes: a pedagogia, a começar nas escolas, para os alunos saberem como identificar “fake news” nas redes sociais ou a educação na cidadania, de modo a criar "um espírito crítico" para o cidadão aprender a "distinguir a verdade e a mentira", na expressão de Jorge Costa.
Nem tudo se resolve com leis
Há tentações a evitar, como a ideia de "tudo se resolve com leis", nas palavras de Porfírio Silva, e cuidados a ter, como ter atenção ao respeito pelas liberdades dos cidadãos e que o que for feito se não confunda com censura. E este é mais um ponto em comum, do CDS ao PCP.
Com mais ou menos nuances, os representantes dos partidos admitem que, para minimizar os efeitos negativos das notícias manipuladas, é preciso explorar "recursos tecnológicos, programas informáticos" que funcionem como "filtros para ajudar" a "detetar a falsidade das notícias", afirmou Manuel Teixeira.
Jorge Costa (BE), Porfírio Silva (PS) e Manuel Teixeira (PSD) defenderam que deve ser responsabilizado quem faz e quem divulga as chamadas "notícias falsas", com a consciência do que está a fazer.
O BE defende que deve valorizar-se o "trabalho dos grupos de cidadãos auto-organizados", a começar pelas redes sociais.
Portugal tem de olhar para o que a União Europeia está a fazer, com o Código de Boas Práticas da Comissão, com o trabalho de peritos que já produziram trabalho e relatórios, exemplifica.
"Pode ser preciso mexer nas leis, reforçar capacidades técnicas de órgãos do Estado", afirmou à Lusa, tendo a certeza absoluta quanto à necessidade de reforçar "a componente de pedagogia democrática", a começar nos bancos das escolas.
A educação, dando aos cidadãos "competências e conhecimentos para se autodefenderem" também é, para o PSD, uma via de resposta, como também pode ser a via legislativa, para "responsabilizar quem é fazedor ou divulgador de "notícias falsas".
Porque, dizem todos, a legislação existente para punir crimes de difamação, calúnia ou ofensas à personalidade "têm um quadro estável e forte do ponto de vista jurídico", lembra o socialista Porfírio Silva, e não se podem misturar com os da desinformação ou das chamadas "notícias falsas".
Concluindo, "ninguém tem uma receita única, fácil e imediata" (Porfírio Silva) nem "não há um elixir" (Carlos Gonçalves) para o problema.
As “fake news”, comummente conhecidas por notícias falsas, desinformação ou informação propositadamente falsificada com fins políticos ou outros, ganharam importância nas presidenciais dos EUA que ditaram a eleição de Donald Trump, no referendo sobre o “Brexit” no Reino Unido e, mais recentemente, nas presidenciais no Brasil, em que as sondagens deram vantagem ao candidato de direita, Jair Bolsonaro, que ganhou as eleições.