Marcelo Rebelo de Sousa questionou, esta terça-feira, a Assembleia Geral das Nações Unidas sobre as promessas anualmente renovadas mas que continuam por cumprir. O Presidente da República avisou que, se a situação for igual na Assembleia Geral de 2024, será fácil perceber "porque é que os povos acreditam cada vez menos naqueles que os governam" e defendeu que "não é possível separar a luta do povo ucraniano da luta pelo respeito da Carta das Nações Unidas".
O chefe de Estado português começou o discurso em Nova Iorque a resumir os diagnósticos do secretário-geral da ONU, António Guterres, e ainda os presidentes Lula da Silva e Joe Biden, em três urgências: o respeito pela Carta das Nações Unidas, a aceleração da luta contra as alterações climáticas e a reforma das instituições "concebidas no século passado".
"Estas três urgências estão ligadas", disse Marcelo. "Não há nem desenvolvimento sustentável nem reforma das instituições sem respeito da Carta das Nações Unidas. Não há desenvolvimento sustentável, nem respeito da Carta das Nações Unidas, sem reforma das instituições internacionais", explicou o Presidente da República, e "não há reforma das instituições internacionais sem respeito da Carta, sem a Agenda 2030 realizada, sem um combate eficaz às alterações climáticas".
O problema, no entanto, "é outro", realçou Marcelo Rebelo de Sousa, antes de virar as agulhas para as promessas não-cumpridas.
"Qual é a urgência da urgência? Qual é a credibilidade de vir aqui todos os anos dizer que é urgente aquilo que de facto não é tratado como urgente?", questionou o chefe de Estado português. "É fácil vir aqui todos os anos prometer o mesmo e não realizar aquilo que é prometido", acrescentou.
Já no final do discurso, o Presidente da República pediu que a situação mude até à Assembleia Geral de 2024. Se isso não acontecer, o risco é continuar "a ouvir sempre os mesmos, e tantos deles muito influentes, a prometerem e não cumprirem", e perceber "porque é que os povos acreditam cada vez menos naqueles que os governam".
Deste ponto de vista, "não é possível separar a luta do povo ucraniano da luta pelo respeito da Carta das Nações Unidas", nem sequer "é possível construir a paz sem acelerarmos os objetivos de desenvolvimento para 2030" que, "atrasados", continuam a prolongar "desigualdades entre Estados e entre povos".
Conselho de Segurança de "um mundo que já não existe"
Marcelo Rebelo de Sousa considera também que "não é possível realizar esses objetivos sem reformarmos as instituições internacionais", clarificando o seu alvo: as próprias Nações Unidas e o seu Conselho de Segurança.
"O Conselho de Segurança corresponde a um mundo que já não existe", afirmou o Presidente da República, lembrando que Portugal "há muito defende que países como o Brasil ou a Índia deviam ser membros permanentes", e que os pequenos países "não podem ser ignorados".
Mas também as instituições financeiras que existem "não são capazes de financiar o desenvolvimento sustentável", e "favorecem os mais ricos" enquanto "desfavorecem os mais pobres".
Insistindo nas promessas não-cumpridas, Marcelo Rebelo de Sousa procurou mostrar à Assembleia Geral das Nações Unidas que é possível fazer diferente, apontando ao acordo de Portugal com Cabo Verde para que a dívida do país seja convertida "num fundo ambiental e climático".
"Isto devia acontecer sistematicamente com as dívidas existentes e com o financiamento do desenvolvimento sustentável", sustentou Marcelo, que declarou o alargamento deste tipo de acordo a outros países da comunidade de língua portuguesa um "objetivo".
Marcelo voltou a insistir na necessidade de "cumprir" as várias prioridades - o respeito do direito internacional, a construção da paz, a cooperação internacional, a correção das desigualdades, as alterações climáticas, a reforma das Nações Unidas e das instituições financeiras - para argumentar que, sem isso, "não há multilateralismo possível".
"Não há cooperação duradoura e não há paz no mundo", advertiu, e "cada dia perdido é mais um dia de desigualdade, de egoísmo, de conflito, de guerra".