O Governo de Moscovo tem vindo a acusar a Ucrânia de estar a preparar uma “bomba suja”. Em comunicado conjunto, os ministros das Relações Exteriores de França, Reino Unido e Estados Unidos já vieram dizer que rejeitam as acusações e reafirmaram o seu apoio à Ucrânia contra a Rússia.
As bombas não são todas sujas?
Há umas mais ainda mais sujas do que as outras. Nesta guerra da Ucrânia já se assistiu ao uso de quase todo o tipo de armas convencionais, incluindo bombas termobáricas ou de vácuo, por parte da Rússia, tal como uma nova geração de misseis hipersónicos. Mais recentemente entraram em cena drones iranianos, mas esta “bomba suja” de que a Rússia tem falado é uma bomba que para além de explosivos convencionais conteria material radioativo.
Seria então uma forma de bomba nuclear?
Não exatamente, porque no caso das armas nucleares acontece uma reação dos núcleos atómicos que provoca a explosão, podendo libertar grandes quantidades de energia e de radiação. No caso desta bomba suja, seria usado material radioativo proveniente, por exemplo, de centrais nucleares ou equipamentos hospitalares, material que é mais barato e fácil de obter e seria depois usado um explosivo convencional para espalhar essa radiação no local onde o engenho caísse. Os especialistas consideram-na, sobretudo, uma arma de terrorismo, porque não visa atingir alvos militares concretos.
Já foi usada alguma vez uma bomba desse tipo?
Já foi tentada a utilização dessas armas na Rússia por rebeldes da Chechénia, nos anos 90, pelo menos, em duas ocasiões, mas os serviços de segurança russos conseguiram desativar essas bombas a tempo. A Al-Qaeda também foi acusada de tentar usar uma bomba suja, mas até hoje não se conhece nenhum caso em que tenha havido um uso efetivo de uma arma desse tipo.
E porque é que a Rússia começou agora a falar destas bombas sujas e a acusar a Ucrânia de querer usá-las?
O que o ministro russo da Defesa e outras figuras do regime de Putin vieram dizer é que a Ucrânia se estaria a preparar para usar uma destas bombas no seu próprio território para depois acusar a Rússia. Mas, a Ucrânia e vários países da NATO negam essa acusação de Moscovo e o que alguns especialistas ocidentais dizem é que o que Putin planeia precisamente o contrário, ou seja, pode estar a preparar fazer explodir um engenho deste género e responsabilizar a Ucrânia, arranjando um pretexto para uma escalada no conflito.
Há também aqui uma componente de guerra psicológica...
Tem havido. Desde a invasão da Ucrânia que se fala do perigo nuclear com a Ucrânia a acusar a Rússia de pôr em perigo centrais nucleares e com Moscovo várias vezes a deixar no ar a ameaça de recorrer a armas nucleares, que, na verdade, não serviria a ninguém, porque não só também a Rússia, tropas e população poderiam ficar sujeitas a radiação, como a escalada militar aí sim seria de consequências imprevisíveis.
Qual será, então, o interesse da Rússia em lançar esta discussão sobre a “bomba suja”?
Muitos observadores consideram que é mais uma forma de desviar atenções do que tem corrido mal na operação militar na Ucrânia. Não só as forças russas foram incapazes de desalojar o Governo de Kiev, como nos últimos tempos têm até sido forçadas a recuar em várias zonas no Leste e no Sul do país. A própria mobilização militar de 300 mil reservistas ordenada por Putin, há pouco mais de um mês, foi o reconhecimento de que as coisas não têm corrido como Moscovo esperaria. E esta retórica sobre a bomba suja pode ser mais uma manobra de diversão.