Veja também:
O Governo está a fazer contra-informação para prejudicar os professores, defende o vice-presidente do PSD, em entrevista à Renascença e ao Público. A reposição do tempo de carreira custa “só” 400 milhões, não 600.
O Governo está num bloqueio negocial com os sindicatos - e com os partidos que o apoiam - relativamente a como contabilizar os anos de congelamento da carreira docente. Qual é a posição do PSD? Defende um novo modelo de progressão na carreira e avaliação? Entende que se deve contar todo o tempo de carreira que ficou congelado?
Há um ponto prévio: um dos princípios que nós defendemos é que não se deve prometer o que não se pode dar - ou, pelo menos, que não se tenha a certeza de que se possa dar. E aquilo que o actual Governo fez foi criar expectativas ao longo de vários meses, junto dos sindicatos e da classe dos professores, de que era possível dar. Portanto, nunca foi peremptório nem explícito nesta intransigência agora assumida… O problema agora é saber como essas progressões devem contar. E, nesse sentido, estar a limitar o tempo de carreira é algo que não tem sentido, é mutilar algo que... é real. Quer dizer, as pessoas estiveram dez anos sem progredir e querem que esse tempo possa ser contabilizado em futuras progressões. Os sindicatos aí tomaram uma posição relativamente equilibrada, dizendo: "O que nós podemos discutir é quanto tempo é que vamos demorar a repor". Isso é que é a parte negociável. Agora, estar a negociar o tempo de carreira não tem muito sentido.
Se o PSD estivesse no Governo qual seria a alternativa? Havia dinheiro, os tais 600 milhões?
O PSD teria começado por propor alterações no Estatuto da Carreira Docente.
Que tipo de alterações?
Em primeiro lugar o problema da profissionalização. Em segundo lugar o problema da avaliação de desempenho. E em terceiro lugar os próprios escalões de progressão, tentando adaptá-los - sem levar tudo pela mesma bitola - a outras carreiras. Mas eu entendo que a profissão de docente tem características que fazem dela um corpo que merece atenção especial devido ao desgaste que tem no que diz respeito a muitos anos a lidar com miúdos, com não sei quantas turmas, etc...
Está consciente de que, tal como quando foi ministro da Educação, se quisesse ir rever agora o Estatuto da Carreira Docente teria os professores na rua...
Não sei, tudo depende de saber como é que se quer mudar. Se se quer mudar relativamente aos que já têm direitos adquiridos ou se se quer mudar para os que vão entrar agora na carreira. Tem é alguma coisa que ser feito.
O PSD admite essa possibilidade?
Olhe, lembro-me que em 2003, numa conversa que tive com os representantes da Fenprof, eu lhe ter dito estar disponível para abrir um processo de discussão sobre a carreira docente. E havia alguns aspectos que, já em 2003, mereciam uma alteração. Da parte da Fenprof não houve abertura, mas eu estava determinado a mexer. Só não tive tempo... A questão é a concepção da carreira: quem é que acede a professor, como é que progride, como é avaliado - para que não se invoque sempre que os professores não são avaliados, o que não é verdade; ou que as progressões são automáticas - que não são. Quer dizer, há aqui uma espécie de contra-informação relativamente ao que é a carreira de professor que não me parece ser um bom indício para o que se quer que seja um processo de negociação de boa-fé.
Imaginemos que o PSD chega ao Governo. Vai contar todo o tempo de carreira dos professores?
Esse direito é básico. Ou seja, o Estado tem que ser uma entidade de boa-fé, não pode estar a prometer uma coisa e depois fazer outra.
Onde é que encontrará estes 600 milhões por ano?
Para já tenho dúvidas que sejam 600 milhões de euros. As minhas contas é que é um pouco menos.
Quanto?
Estamos a falar de educadores, professores de primeiro ciclo, de ensino secundário, temos que analisar [as contas] na diversidade. Aquilo que eu fiz foi ao que se chama "contas nas costas do envelope", mas dá um valor nos 400 milhões de euros, talvez um pouco mais. Agora, o problema não está nisso, está no como repor gradualmente essa progressão. Esse é que é o problema. Se for a partir de Janeiro é uma coisa, mas se for um processo gradual... eu lembro que a FNE propunha até 2023. Essa é a parte negociável, não é o tempo. O tempo é um adquirido, portanto deve ser respeitado.
Se o Governo não chegar a acordo com os sindicatos, o PSD admite juntar-se ao CDS e à esquerda, como no caso dos concursos, e obrigar o Governo a aceitar uma solução?
Tudo depende de saber qual é o contexto e de saber quais são as propostas. Agora, entendo que é mau que seja o Parlamento a intervir num domínio que é da estrita responsabilidade do Governo. É função do Governo gerir este tipo de problemas, não é do Parlamento.
O PSD abstém-se, neste caso?
Não sei, depende do contexto em que for feito e das decisões na Comissão Política Nacional (CPN) e no grupo parlamentar. Não vou antecipar, porque não temos aquela concepção soviética, digamos, de que o grupo parlamentar deve ser uma correia de transmissão da comissão política... tem que haver concertação, mas...
Os pais estão agora a viver este período de exames com alguma instabilidade. Se o Governo mudasse para o PSD, voltavam os exames e acabavam as provas de aferição anteriores?
Está a querer que eu antecipe o programa eleitoral, mas esse é um tema em que ainda não trabalhámos. Quando fizermos uma proposta temos que a fundamentar muito bem. Temos que saber as vantagens e inconvenientes e, acima de tudo, quantificar os impactos que isso tem. Não basta fazer uma iniciativa qualquer para marcar agenda.
As propostas sobre a natalidade não foram para marcar agenda?
Não, não foi. Por uma razão simples: quando tivemos a primeira reunião em Coimbra, em princípios de Maio, o meu grupo (de Educação) já estava a trabalhar. E demos prioridade ao tema da natalidade da educação na infância. Nem sabíamos quanto tempo íamos demorar com aquilo, mas sabíamos que era o tema mais importante para arrancar. Foi isso que fizemos. O trabalho estava redigido duas semanas antes...
Então por que é que a restante direcção do PSD não sabia?
Porque o Conselho Estratégico nacional tem autonomia de propor. Porque aquilo não é uma decisão do PSD, seria um documento de trabalho interno para discussão interna. Mas como nós já sabemos que a discussão interna raramente o é, partimos para uma discussão alargada. Qualquer elemento da comissão política pode dar contributos e discutir. Quando chegarmos ao programa eleitoral, aí sim, existe uma responsabilização política dos órgãos do PSD. Nós estamos a trabalhar com documentos de trabalho, são documentos abertos. Há ali coisas que, se calhar, vamos ter que ajustar. Tal como há outras que não estão lá e deviam lá estar.
O PSD mostra-se favorável à contagem de tempo de carreira dos docentes, que nas suas contas custará 400 milhões. E avançou com políticas para a natalidade que valem, nas contas do PSD, 500 milhões ao ano (cerca de 1000 milhões nas contas do Expresso). O país já pode gastar?
O Expresso tem um pressuposto: fez uma análise sobre qual é a projecção a 18 anos do custo. Bom, mas isto pressupõe que não há mobilidade nos escalões: que vamos ter a mesma taxa de pobreza infantil, o mesmo tipo de famílias. E nós também temos a expectativa de que os próprios proveitos da Segurança Social possam ser diferentes, se houver mais crescimento... O que fizemos foi uma projecção a seis anos... Agora: quanto é que custa uma auto-estrada?
Mas quanto é que custa a proposta do PSD?
Entre 400 e 500 milhões de euros. Mas é um investimento. Que depois se vai reflectir em receitas da Segurança Social...
Mas isso era o cálculo do PS antes de chegar ao Governo: os ganhos do crescimento que o PSD sempre contestava...
Sim, por isso o problema é político: é saber onde é que se deve gastar prioritariamente. E para nós, mais importante do que gastar em coisas em que este Governo está a gastar, é gastar em questões estruturantes para o país. E o caso da infância é um deles.
Em que é que o Governo está a gastar e não devia?
Olhe, vamos começar por algumas obras a que se deu seguimento. Mas não vamos falar dessas, eventualmente existiam compromissos. Vamos falar em contratos relativamente às rendas excessivas, em alguma ineficiência na Segurança Social, no IEFP, no próprio Ministério da Educação. E posso garantir-lhe que vamos buscar mais dinheiro aí do que...
Ainda menos dinheiro para a Educação?
Mas qual é o problema de ter menos dinheiro? O problema é saber se estou a gastar bem o dinheiro que tenho. E o problema que existe é que não se está a gastar bem o dinheiro que se tem. Por exemplo, fala-se muito da redução do número de alunos por turma - que tem efeitos duvidosos. Aliás toda a investigação científica tem demonstrado que uma redução pequena do número de alunos não tem ganhos ao nível de resultados. Aí vou buscar dinheiro...
Dispensa professores?
Não necessariamente. Posso é não contratar tantos, o que é diferente. A maior parte dos professores estão no quadro e vão manter-se no quadro, mesmo que a escola seja fechada.
Mas continuaria a fechar escolas?
Ouça, já viu que há escolas com dois, três ou quatro alunos? Que há cursos profissionais a abrir com número reduzidíssimo de alunos? A lei define qual é o mínimo, mas não está a ser cumprida. Já percebeu o que é ter turmas que têm quatro anos de escolaridade dentro da mesma sala de aula? Porque não querem fechar uma turma ou duas para ter mais lugares...
Mas o que é que o PSD faria?
A primeira coisa é uma gestão racional da rede de ofertas. Vamos dar o caso do ensino profissional: há cursos em escolas públicas que estão a formar jovens directamente para o desemprego, com empregabilidade zero. Eu quero saber se vale a pena continuar a investir nisso. Nós estamos neste momento a fazer uma avaliação do ensino profissional - e tudo aponta para que tenhamos um nível de ineficiência entre 20% a 25%.
No documento sobre natalidade, o PSD propõe que se ponha fim ao abono de família. Acha que não funciona?
Basta ver os resultados: quase 45% das famílias beneficiadas com abono de família não têm mais do que um filho. Quando as famílias com mais de um filho representam apenas 5% dos beneficiários. O que demonstra que esta política está errada. Como temos uma taxa de fecundidade de 1,3 filhos por mulher em idade fértil, isso quer dizer que o salto fundamental é entre o primeiro e segundo filho. O inquérito à fecundidade demonstra que as pessoas querem ter mais do que um filho, só que não têm dinheiro para os ter. Estamos a criar uma sociedade de filhos únicos - e o abono de família está a alimentar isto.
Dois jornais fizeram as contas e concluíram que a fórmula do partido parece prejudicar as famílias mais pobres que só tenham o primeiro filho. Faz sentido?
Nós publicámos o estudo numa segunda-feira e o abono de família tinha aumentado na sexta-feira anterior. Tínhamos feito os cálculos com o abono de 2017 e entretanto saíram os de 2018. O que os jornais foram fazer foi os cálculos com os valores de 2018... Isso quer dizer que...
Que o PSD vai ter que mudar os cálculos e a proposta?
Claro, como é natural! É tão simples como isso.