A pandemia de Covid-19 teve forte impacto na indústria do futebol e o mercado de transferências de inverno, que hoje encerra nas principais ligas europeias, constitui um bom indicador da crise que se abateu sobre alguns dos grandes clubes. A leitura é do diretor executivo da Sport Integrity Global Aliance (SIGA), o português Emanuel Medeiros, em entrevista a Bola Branca.
“A janela de inverno sempre teve menor expressão que a de verão, mas vivemos tempos de enorme dificuldade financeira, de enorme adversidade. O embate desta crise no plano financeiro tem sido brutal”, declara Emanuel Medeiros que dá como exemplos “a situação de desespero financeiro que vive um colosso europeu como o Barcelona e o sufoco em que vivem clubes como o Real Madrid que era um comprador nato”, para concluir que “esta pandemia, ao exacerbar a adversidade financeira, também deixou os clubes muito vulneráveis”.
Confrontado pela Renascença com eventualidade de o futebol jamais regressar aos valores de mercado atingidos antes da pandemia de Covid-19, Emanuel Medeiros lembra que “o futebol tem uma capacidade de crescimento notável, sem precedente” e que “quando era CEO de todas as ligas europeias e das ligas mundiais, mesmo na grande crise 2009 e 2011, em contraciclo, num cenário de profunda crise financeira global, o futebol foi capaz de crescer a um ritmo de 7% ao ano”.
Neste contexto, o dirigente não deixa de reconhecer que “houve alguma corrida para a frente, com alguns problemas empurrados, geridos com a barriga e agora estamos a sentir este impacto”.
Mais transparência e rigor. Menos suspeitas e comissões aos agentes
A boa governança e a integridade financeira são alguns dos princípios que a SIGA tenta implementar nas organizações desportivas de todo o mundo. Emanuel Medeiros, nesta entrevista, defende “não apenas integridade nas transferências de jogadores e até de treinadores, mas a necessidade de os clubes interiorizarem que têm de viver de acordo com as suas possibilidades, sob pena de estarmos perante riscos sistémicos que abalam todo o universo do desporto”, acentuando que “não é possível continuar a assistir impávido e sereno a esta inflação despesista com custos de transferências de jogadores e de comissões que são uma coisa inacreditável.
Quem paga tudo isto são os clubes e, por isso, estão com o garrote financeiro cada vez mais apertado” assinala. Emanuel Medeiros advoga ainda que o setor do futebol deve ser “claro, transparente, merecedor de confiança e não permanentemente assaltado por notícias bombásticas que minam a sua confiança, credibilidade e cotação”.
O dirigente aponta a necessidade de “transparência nas transferências de jogadores, nos fluxos financeiros e inclusivamente na compra de sociedades desportivas” áreas que não têm tido o ímpeto necessário e que, nestes próximos quatro anos, irão merecer a máxima atenção do organismo que lidera.
UEFA tem liderança forte. A liga europeia dos tubarões é assunto que "estrebucha" em Bruxelas
Emanuel Medeiros considera que a liga europeia, que alguns tubarões europeus tentaram criar à revelia da UEFA, “tanto quanto é possível antever, é assunto arrumado, sem embargo de o problema continuar a estrebuchar nos corredores de Bruxelas e nas confabulações jurídicas que por aí se aventam”.
O futebol, diz, "precisa de liderança, paz e estabilidade” e, neste contexto, o diretor executivo da SIGA, profundo conhecedor dos meandros do dirigismo europeu e mundial, considera que a UEFA presidida por Aleksander Ceferin, neste domínio, “tem estado atenta, atuante, tem liderança, visão de futuro e ímpeto reformista”.
Emanuel Medeiros, licenciado em direito, tem uma longa ligada à gestão desportiva. O português, nascido na Ilha de São Miguel (Açores), foi membro fundador da Associação Europeia de Ligas de Futebol Profissional e, entre 2002 e 2014 integrou vários comités e grupos de trabalho na FIFA e na UEFA.
Esta segunda-feira, dia 31 de janeiro, Emanuel Medeiros é reconduzido na liderança do braço europeu da Sport Integrity Global Aliance (SIGA). O organismo conta com mais de uma centena de parceiros em todo o mundo e tem por missão sensibilizar e conduzir as organizações desportivas para boas práticas em áreas como a governança, integridade financeira, apostas desportivas e proteção de menores.