O ministro da Administração, Eduardo Cabrita, anunciou nesta sexta-feira a demissão do cargo.
Eduardo Cabrita sai na sequência do caso do acidente de viação na A6, em junho, que vitimou fatalmente um trabalhador.
No despacho conhecido nesta sexta-feira, horas antes do anúncio de Eduardo Cabrita, o Ministério Público acusa o motorista do ministro de homicídio por negligência, dado que conduzia a 166 km/h, na via da esquerda, “em violação das regras de velocidade e circulação previstas no Código da Estrada e com inobservância das precauções exigidas pela prudência e cuidados impostos por aquelas regras de condução”.
Confrontado com esta decisão, o governante afirmou aos jornalistas, numa primeira reação, que “têm de ser esclarecidas” as “condições do atravessamento da via”, de que fala o despacho, mas que a acusação é o resultado do “Estado de Direito a funcionar”.
Quanto a eventuais responsabilidades próprias, disse apenas que era “um passageiro” na altura do acidente.
Considerando “repugnante” o “aproveitamento político daquilo que é uma tragédia pessoal”, Eduardo Cabrita decidiu apresentar, nesta tarde, a demissão.
“Entendi solicitar hoje a exoneração das minhas funções de ministro da Administração Interna ao senhor primeiro-ministro”, anunciou em conferência de imprensa.
“Agradeço profundamente ao primeiro-ministro, António Costa, a oportunidade de partilhar estes seis anos de dedicação intensa à causa pública e, sobretudo, estes quatro anos que me tornaram o ministro da Administração Interna com mais longo mandato em democracia. É um ministério particularmente difícil, exigente e sujeito diariamente ao imprevisto”, declarou ainda, depois de elencar os principais momentos da sua governação.
Dos incêndios de 2017 à demissão
Na despedida, Eduardo Cabrita lembrou os trágicos incêndios que “provocaram a morte a mais de uma centena de portugueses”.
“Desde então, tenho trabalho intensamente com muitos para assegurar que Portugal é um país seguro nas suas várias dimensões, antes de mais restaurando a confiança no sistema de Proteção Civil”, garantindo o cumprimento do “principal objetivo estratégico” de “que nenhuma vida humana seria perdida num contexto de incêndio rural. Só profissionais perderam a sua vida, nenhum civil”.
O ministro da Administração Interna referiu depois que Portugal teve, nos últimos quatro anos, “os melhores resultados do século quer ao nível de número de ocorrências quer de área ardida”.
O ministro demissionário passou depois para o campo da segurança interna, destacando que “Portugal se afirmou como um dos países mais seguros do mundo”, reduzindo os “indicadores, quer de criminalidade geral quer da criminalidade grave”.
Depois, no que respeita às migrações, destacou que, durante a presidência portuguesa da União Europeia, mesmo em circunstâncias difíceis, Portugal – uma “dos poucos que participou em todas as operações de acolhimento de migrantes” – conseguiu aprovar a criação da Agência Europeia de Asilo.
No que toca à resposta à pandemia de Covid-19, Eduardo Cabrita destacou a coordenação das medidas durante o estado de emergência e, em concreto, a atuação das forças de segurança e a sua intervenção pedagógica, “em respeito pelos direitos fundamentais, num trabalho intenso para a defesa da saúde das populações”.
O momento do acidente
“No dia 18 de junho, a viatura que me transportava foi vítima de um acidente, no qual se viu envolvida e que tragicamente determinou a perda de uma vida. Mais do que ninguém, lamento essa trágica perda irreparável, a única irreparável, e a minha solidariedade com a família da vítima”, afirmou aos jornalistas.
“Deste então, foi com grande sacrifício pessoal que verifiquei com estupefação o aproveitamento político de uma tragédia pessoal”, reforçou, explicando que se manteve em silêncio sobre o sucedido, pois não seria legítimo e tudo quanto dissesse seria aproveitado contra si.
Nesta sexta-feira, conhecidos os termos do despacho de acusação, o ministro considera que se poderá prosseguir “o apuramento dos factos e apuramento da verdade”, só reforçando a sua “confiança no Estado de Direito”.
Nestes seis meses, confessa em seguida, “só a lealdade” ao primeiro-ministro “me determinaram a prosseguir no exercício destas funções, durante este verão tão difícil”.
Mas “hoje não posso permitir que este aproveitamento político intolerável seja utilizado no atual quadro para penalizar a ação do Governo, contra o senhor primeiro-ministro ou mesmo contra o Partido Socialista”, pelo que foi apresentada a demissão.