Com a avaliação do crescente investimento em campanhas de comunicação pública em saúde tem-se vindo a perceber que as mulheres assumem cada vez melhor os cuidados de prevenção relativamente aos filhos e a si mesmas. No entanto, parece que entre os homens, apesar de mais disponíveis para o desporto, há maior dificuldade na mobilização de boas práticas em áreas cruciais como o cancro e a preservação da saúde mental.
O cancro da próstata, que afeta 500.000 homens no espaço europeu, é o mais frequente nos homens, representando atualmente a sua primeira causa de morte por carcinoma: a Liga Portuguesa Contra o Cancro indica que em 2020 surgiram entre nós 6.759 novos casos e a estimativa, para os próximos vinte anos, é de uma subida de 20%. Trata-se de uma doença de evolução silenciosa e lenta, mas que pode ser detetada precocemente através de exames médicos, favorecendo uma taxa de cura que, nesse caso, atinge os 95%. Os cancros do testículo e do pénis têm uma incidência menor, mas com a agravante de o primeiro se manifestar sobretudo em jovens entre os 15 e os 35 anos.
Para colmatar a necessidade de promover a prevenção destes cancros foi fundado o movimento Movember, do muito rock-and-roll Novembro Azul. Os fundadores, cientes de que a fragilidade dos homens não se manifesta, apenas, em menor adesão a campanhas que mobilizem para a saúde e a segurança, na indisciplina na toma de medicamentos e numa maior irregularidade de presenças em consultas médicas, destacam também a especificidade masculina na área da saúde mental. Razões essencialmente culturais – e tão pouco inteligentes – forçam os rapazes a esconder as emoções, favorecem sistematicamente o receio – do ridículo, da crítica e da “feminização” – de falar das suas preocupações e de pedir ajuda, e não os educam para interpretar os sinais de alerta ou as mais básicas sensações humanas. Assim, os homens estão em clara desvantagem perante a depressão e as suas múltiplas consequências, que podem aproximar a pessoa do suicídio. Depois, não é preciso ser um génio para perceber quanto adoecer de um cancro é uma experiência portadora de perdas, debilitando a pessoa do ponto de vista identitário, psicológico, e o Movember não esqueceu essa condição, esteja somatizada ou não.
Felizmente, a ciência faz a sua parte e a comunicação social noticiou recentemente sobre os resultados de um estudo publicado na revista “Nature” que mostra como a estabilidade e as flutuações emocionais de homens e de mulheres são consistente e inequivocamente semelhantes. Os autores, da Universidade de Michigan e da Purdue University, esperam que estudos análogos possam melhorar a vida de todos nós: ajudando a evitar que as experiências das mulheres sejam descartadas e favorecendo meios com os quais a educação emocional dos homens possa levá-los a progredir para níveis de maior expressividade e partilha.
Numa era em que os “soft skills” são tão convocados para as condições de sucesso das pessoas na sociedade que se avizinha, aceitar as vicissitudes da vida emocional, promover melhores níveis de compreensão de si e ensinar a lidar com o reconhecimento e a comunicação dos seus sentimentos, parece um caminho prometedor na via da saúde mental e da produtividade.
Não esqueçamos a tradição portuguesa das “culpas”, feita de dificuldade em sensibilizar as lideranças, negando o recurso ao médico ou ao psicólogo, apelando ao consumo de álcool, de drogas e à automedicação, exigindo, pois, um incisivo alerta. Assim, uma mobilização para as finalidades de informação, educação e recolha de fundos destinada à investigação que a Movember tem, tanto sobre o cancro como em saúde mental, é a todos requerida: uma ideia clara, e muitas práticas, de uma saudável masculinidade, são tarefas para todos os homens e para todas as mulheres numa sociedade desenvolvida.