A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) elaborou um parecer técnico em que dá razão à EMEL no diferendo com a PSP sobre a aplicação da lei de uso do capacete em bicicletas e em velocípedes com motor auxiliar (trotinetes). E o Ministério de Administração Interna garante agora que não é obrigatório o uso de proteção para a cabeça na utilização destes meios de transporte.
Em comunicado, a EMEL anunciou que a ANSR confirmou “a não-obrigatoriedade do uso de capacete na utilização de velocípedes simples e velocípedes com motor auxiliar, que abrange toda a rede Gira [rede de bicicletas e trotinetes da empresa de parqueamento da capital]”.
À Renascença, fonte a ANSR confirma o envio, já na semana passada, deste parecer, que valida a tese de que não é necessário o uso do capacete. A decisão é justificada com o “cruzamento da análise de legislação nacional e internacional” para fundamentar esta posição.
Nova interpertação
Em resposta às questões da Renascença, o MAI explica que a nova interpretação da ANSR se baseia na artigo 112.º do Código da Estrada, em que o legislador, acompanhando o critério usado em todo o espaço da União Europeia, equiparou a velocípedes os meios com motor auxiliar até 0,25 kW, cuja alimentação é interrompida se atingir a velocidade de 25 km/h, ou antes, se o condutor deixar de pedalar.
“Estão igualmente abrangidas as trotinetes com motor elétrico, bem como os dispositivos de circulação com motor elétrico, autoequilibrados e automotores, ou outros meios de circulação análogos com motor”, lê-se na missiva que resulta de uma reunião a 11 de dezembro, entre o Secretário de Estado da Proteção Civil, José Artur Neves, e o Vereador da Mobilidade e Segurança da Câmara Municipal de Lisboa, Miguel Gaspar.
Foi solicitado à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) que, no âmbito das suas competências, fosse emanada instrução técnica sobre a mais adequada utilização de novas formas de mobilidade, mais concretamente no que respeita ao uso de capacete pelos utilizadores de velocípedes com motor auxiliar elétrico.
No entanto, na mesma missiva faz uma ressalva. “Esta orientação técnica em nada prejudica a recomendação de uso de acessórios de segurança que, mesmo não sendo obrigatórios, possam contribuir para uma melhor proteção individual dos utilizadores de velocípedes”, escreve o MAI.
Do 82 ao112
Na mesma instrução técnica é salientada a perigosidade da invasão do espaço destinado aos peões, devendo a “fiscalização ser intensificada no que concerne à adequada utilização do espaço público por parte dos condutores dos veículos acima mencionados.”
Com capacete ou sem capacete? A polémica estalou com a PSP começou a multar os utilizadores da rede GIRA, que é gerida pela EMEL, pela não utilização de capacete.
A PSP atuou com base nas anteriores instruções técnicas divulgadas pela ANSR, de que resultava, nos termos do disposto no artigo 82º, nº 4 do Código da Estrada (CE), a obrigação do uso de capacete por parte dos condutores e passageiros de velocípedes com motor e condutores de trotinetas com motor. Esse artigo diz que “os condutores e passageiros de velocípedes com motor e os condutores de trotinetes com motor, devem proteger a cabeça usando capacete”.
A coima antes prevista ia dos 60 aos 300 euros.
Agora a ANSR preferiu dar primazia ao artigo 112 para justificar uma medida que vai ao encontro do que era defendido pela EMEL e pela CML.
Lei era clara
Há quase duas semanas, Câmara de Lisboa emitiu um comunicado nas redes sociais dirigido aos utilizadores da rede de bicicletas Gira. Na publicação era afirmativa: “A lei não obriga à utilização de capacete, tal como diz no regulamento de utilização da EMEL”, lia-se.
Na mesma altura a Prevenção Rodoviária Portuguesa (PRP), através de José Miguel Trigoso, admitia que a autarquia pode ser responsabilizada em caso de acidente.
A Câmara diz que o uso de capacete não é obrigatório, ao contrário do que diz a lei e, após uma semana de fiscalização, chegou a pedir à PSP para não multar.
Em declarações à Renascença, José Miguel Trigoso diz que os avisos à autarquia a foram feitos há mais de um ano.
“Avisámos explicitamente a Câmara e a EMEL em várias reuniões que corriam o risco de estar a induzir os utentes ao engano. A lei é clara ao dizer que é obrigatório o uso de capacete”, garante.
O presidente da PRP exemplificava: “Imagine que há um acidente de um utente das bicicletas elétricas, que cai e faz um traumatismo craniano forte. Aí tenho dúvidas que não possa responsabilizar a autarquia por lhe estar a indicar um caminho errado, que não está de acordo com a legislação”.
José Miguel Trigoso diz que nem percebe a polémica e muito menos a posição da Câmara de Lisboa, pois a lei é "claríssima" e "não atribui nenhuma exceção".