"Eu sobrevivi”. Primeiras 72 horas são essenciais na resposta à violência doméstica
25-11-2020 - 10:50
 • Marta Grosso , Joana Bourgard , Miguel Coelho (texto, vídeo e entrevista)

Neste Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, a Renascença falou com a ministra Mariana Vieira da Silva sobre a campanha hoje lançada, que diz às mulheres: vale a pena pedir ajuda.

“Temos um problema dramático nas sociedades”, diz a ministra da Presidência e da Modernização Administrativa sobre os números conhecidos da violência doméstica. Até setembro, registaram-se quase 25 mil denúncias – quase mais duas mil do que no mesmo período do ano passado.

Portugal não é o único a ter números preocupantes. “Este tema é falado por vários países” europeus, refere Mariana Vieira da Silva no programa As Três da Manhã, nesta quarta-feira.

“As primeiras 72 horas” a seguir à denúncia são essenciais, afirma. “O período em que uma mulher decide apresentar queixa é sempre um período de maior risco, é sempre o período em que o agressor tenta aproximar-se e muitas vezes de forma mais agressiva do que até então”, acrescenta.

Por isso, a resposta “tanto do lado da oferta às pessoas de uma casa de acolhimento como do lado de recolha de todas as provas, de fazer todo o caminho para depois, quando chegar a tribunal, possa ser um caso com um resultado são momentos essenciais”, reforça a ministra, que ao longo da entrevista passou a mensagem de que vale a pena pedir ajuda.

“Há uma rede de suporte para responder”, garante.

Além disso, Mariana Vieira da Silva pede que todos estejamos atentos. “O mais provável é que, com este nível de casos que temos, todos tenhamos nas nossas relações familiares, de amizade, de trabalho um caso. Podemos ainda não saber que ele existe, mas temos de estar atentos aos sinais, porque cada mulher precisa de sentir, não só na resposta do Estado, mas na resposta em seu redor, uma rede de confiança”.

#Eusobrevivi

Para assinalar este Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, o Governo lançou uma campanha intitulada “Eu sobrevivi”.

“Serve para passar uma mensagem às mulheres de que vale a pena pedir ajuda e pode pedir ajuda pelo telefone, ligando para o 800 202 148, ou por sms, para o 3060. Pode ainda pedir ajuda a um conjunto de organizações e terá uma resposta”, assegura.


Nestes tempos de pandemia e confinamentos, a violência dentro de casa tem tendência a aumentar e torna-se importante falar do tema. Só neste ano, foram assassinadas 30 mulheres em Portugal. Tantas como em todo o ano passado. Aliás, em cada ano, o cenário tem vindo a piorar.

Mas também cada vez mais vítimas a apresentar queixa-crime – pelo menos, segundo os dados do CITIUS, o sistema informático dos tribunais.

A ministra da Presidência e da Modernização Administrativa reconhece que, no âmbito das medidas tomadas para conter a pandemia, “muitas mulheres estão confinadas à sua casa com o seu agressor”.

“Se o confinamento é difícil para qualquer pessoa, ele é tremendo para quem tenha de o fazer com o seu agressor”, admite, acrescentando que é para estas e todas as mulheres que sejam vítimas de violência que “temos vindo a trabalhar”.

Mais instrumentos de vigilância

O Governo tem “hoje uma articulação entre todas as dimensões da resposta”, afirma a ministra da Presidência na Renascença.

“Por exemplo, as organizações defensoras das mulheres também estão presentes no tribunal, estão presentes em todo o processo para que as pessoas não se sintam sozinhas. Esse é o trabalho que temos vindo a fazer”, refere.

Além disso, há mais “equipamentos ativos de videovigilância” e tem aumentado o número de “agressores com penas acessórias de vigilância eletrónica”.

“Portanto, temos hoje novos instrumentos que são cada vez mais usados. Para terem uma ideia, há um aumento de 44% na utilização de equipamentos ativos de teleassistência – um ‘botão de pânico’, digamos assim – para que as pessoas possam pedir ajuda já depois da queixa se o agressor se aproximar”, exemplifica.

Mariana Vieira da Silva considera ainda que “vivemos num momento de transição de um tempo em que não se falava deste tema e o momento em que passamos a conversar sobre ele. E há sempre aqui um efeito de aumento do número de queixas, que tem um lado positivo”.

Portugal tem 180 estruturas de atendimento e, ao nível do acolhimento, 26 estruturas de emergência e 35 casas de abrigo.

Na atual segunda vaga da pandemia de Covid-19, a Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica acolheu 625 pessoas e fez mais de 12 mil atendimentos, tendo havido ainda 150 pessoas que conseguiram terminar o processo de autonomização.