APAV diz que Igreja tem de esclarecer medidas anunciadas e agir rapidamente
03-03-2023 - 22:16
 • Ângela Roque

Associação Portuguesa de Apoio à Vítima considera importante que os bispos tenham reafirmado a “tolerância zero” quanto aos abusos, mas considera que ficou muito por responder. “O que há para agir tem que ser célere”.

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A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima considera importante a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) ter reiterado a política de “tolerância zero” quanto aos abusos sexuais praticados no seio da Igreja. Em declarações à Renascença,Carla Ferreira considera, no entanto, que ficou muito por esclarecer, e que a Igreja o deve fazer o quanto antes.

“Há aqui a intenção de fazer alguma coisa, fala-se da questão da tolerância zero e de se garantir o apoio às vítimas… eu percebo quando o D. José Dornelas diz que não se podem tomar todas as decisões hoje, mas o mais importante é que sejam tomadas a muito breve trecho, sob pena de estarmos a passar uma mensagem de descredibilização em relação a todas as iniciativas que já tomou até aqui. Ou seja, era importante que se conhecessem medidas concretas muito rapidamente, não apenas para benefício da Igreja, mas também para o bem estar e para a resposta às vítimas”, sublinha.

A responsável pela rede CARE - que na APAV trata dos casos de violência sexual contra crianças e jovens - ficou com dúvidas, por exemplo, sobre a forma como vai funcionar a nova comissão anunciada pela CEP, mas que ficará ligada à que coordena a nível nacional as comissões diocesanas de proteção de menores. Diz que é importante esclarecer como é que vai ser dado o apoio psicológico e psiquiátrico às vítimas, e de que forma, já que tem de ser um apoio especializado.

“Não há nada em concreto sobre a forma como esses apoios vão funcionar, se vão ter uma dimensão equitativa nacionalmente, e que credibilidade, isenção e especialização vão ter as pessoas que vão prestar este apoio”, porque isso é fundamental para as vítimas, e também "não se pode correr o risco de diferentes apoios nas dioceses".

“O apoio prestado às vítimas de violência sexual tem de ser um apoio especializado. Nós, enquanto organização que apoia vítimas de crime há mais de 30 anos, temos uma equipa que é especializada nesta matéria. Ou seja, há esta necessidade de não estarmos a agir apenas no todo, mas haver aqui uma incisão muito específica sobre aquilo que é a intervenção com vítimas de violência sexual”, refere.

A APAV está disponível para ajudar, mas tem de se agir já. “Saúdo, obviamente, a intenção da CEP encetar contactos com instituições que estão no terreno, e reitero a disponibilidade da APAV, que já iniciou diálogos com a Igreja Católica, até na dimensão da JMJ (Jornada Mundial da Juventude). Mas, estes contactos e esta ação têm de ser urgentes. O que há para agir tem que ser célere, senão estamos a passar as mensagens erradas, a aumentar o grau de sofrimento das vítimas. Isso é que é importante ter em consideração”.

A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica validou 512 dos 564 testemunhos que recebeu, estimando que o número de vítimas possa ascender a 4.815. Os dados constam do relatório divulgado a 13 de fevereiro, e que esteve a ser analisado pela Conferência Episcopal Portuguesa. Esta sexta-feira a CI entregou à CEP a lista com os nomes de alegados abusadores. A Lista foi igualmente entregue à Procuradoria Geral da República.

A Comissão Independente, que cessou funções, enviou 25 casos ao Ministério Público, que deram origem à abertura de 15 inquéritos, dos quais nove foram já arquivados, permanecendo seis em investigação, de acordo com os dados confirmados pela PGR.


Se foi vítima de abuso ou conhece quem possa ter sido, não está sozinho e há vários organismos de apoio às vítimas a que pode recorrer:

- Serviço de Escuta dos Jesuítas , um “espaço seguro destinado a acolher, escutar e apoiar pessoas que possam ter sido vítimas de abusos sexuais nas instituições da Companhia de Jesus.

Telefone: 217 543 085 (2ª a 6ª, das 9h30 às 18h) | E-mail: escutar@jesuitas.pt | Morada: Estrada da Torre, 26, 1750-296 Lisboa

- Rede Care , projeto da APAV, Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, que “apoia crianças e jovens vítimas de violência sexual de forma especializada, bem como as suas famílias e amigos/as”.

Com presença em Lisboa, Porto, Coimbra, Braga, Setúbal, Santarém, Algarve, Alentejo, Madeira e Açores.

Telefone: 22 550 29 57 | Linha gratuita de Apoio à Vítima: 116 006 | E-mail: care@apav.pt

- Comissões Diocesanas para a Protecção de Menores . São 21 e foram criadas pela Conferência Episcopal Portuguesa.

São constituídas por especialistas de várias áreas, recolhem denúncias e dão “orientações no campo da prevenção de abusos”.

Podem ser contactadas por telefone, correio ou email.

Para apoiar organizações católicas que trabalham com crianças:

- Projeto Cuidar , do CEPCEP, Centro de Estudos da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica

Se pretende partilhar o seu caso com a Renascença, pode contactar-nos de forma sigilosa, através do email: partilha@rr.pt