Nóvoa promete garantir soberania com referendo. Mas foi além das suas possibilidades
15-01-2016 - 18:21
 • João Carlos Malta

O candidato prometeu garantir a soberania nacional sempre que esta estivesse em risco através de discussão pública e referendos. A Constituição é que não o deixa fazer isso sozinho.

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“Não aceitarei diminuições significativas futuras de soberania sem que sejam submetidas a debate na sociedade portuguesa e a um referendo". Sampaio da Nóvoa, em Coruche, na passada quinta-feira fez esta promessa quando o debate resvalou para a posição de Portugal na União Europeia e o papel do país na Europa. Mas poderia Sampaio da Nóvoa prometê-lo?

Não. Ou melhor, isso não depende exclusivamente dele. Olhemos para a Constituição, que, no artigo 167, diz: “A iniciativa da lei e do referendo compete aos deputados, aos grupos parlamentares e ao Governo, e ainda, nos termos e condições estabelecidos na lei, a grupos de cidadãos eleitores, competindo a iniciativa da lei, no respeitante às regiões autónomas, às respectivas Assembleias Legislativas”.

Então qual é o papel do presidente na matéria? Validar ou não as propostas de referendo que lhe cheguem. É isso que diz o artigo 134: "Submeter a referendo questões de relevante interesse nacional".

É o mesmo que afirma o constitucionalista Domingos Farinha. "Quem tem a iniciativa de acordo com a Constituição de desencadear um referendo é a Assembleia da República, quanto muito o que se podia dizer é que o Presidente da República tem o poder de impedir um referendo que entender que por qualquer razão não deve convocar. Isso também está previsto na Constituição”.

Para o especialista, a declaração de Nóvoa “vai no sentido contrário”. “Só pode ser interpretado como ele ir tentar influenciar a Assembleia da República a que convocasse esse referendo”, explica.

Mas com que poderes poderia fazê-lo? Haveria duas formas, segundo Domingos Farinha. “Ou através do veto numa matéria conexa, para obrigar o Parlamento a pedir o referendo na matéria que ele queria que fosse referendo”, indica o constitucionalista. Mas essa é uma hipótese “académica”, porque não seria “nem juridicamente, nem politicamente muito viável”.

A segunda opção é, na opinião do constitucionalista, mais “curial”: pressionar com a possibilidade de dissolução. “Não me parece nada estranho que um Presidente com um certo perfil, como o de Sampaio da Nóvoa, em matérias com a saída do euro, a entrada da Turquia na União Europeia, ou ainda mais importante um Tratado Orçamental com outra configuração, exigisse aos deputados que propusessem isso num referendo ou dissolveria o Parlamento”.

Em conclusão, Domingos Farinha garante que: “Não é possível dizer que ele próprio convocaria o referendo. A Constituição é muito clara, não há dúvidas”.