O Observatório Português de Cuidados Paliativos (OPCP) divulgou, esta quarta-feira, a segunda parte do Relatório de Outono de 2019, sendo um dos principais alertas do documento a falta de recursos humanos para que exista um cuidado integral dos pacientes.
Em média, as equipas e os médicos de cuidados paliativos dispõe, de nove minutos, ou menos, por cada doente, o que revela um défice de profissionais especializados.
Em 2018, cerca de 102 mil doentes adultos necessitaram de cuidados paliativos, mas apenas 25.570 em idade adulta tiveram acesso, o que significa uma taxa de acessibilidade de cerca de 25%.
Em idade pediátrica, eram mais de oito mil, mas apenas 90 foram efetivamente seguidos por uma equipa especializada.
Em declarações à agência Lusa, o coordenador do OPCP - Instituto de Ciências da Saúde, da Universidade Católica, Manuel Luís Capelas, explicou que a taxa de acessibilidade “está em linha com o que tem sido estudado e apresentado”, que ronda entre os 25 e os 50%.
“O que nos preocupa de sobremaneira”, prosseguiu Manuel Luís Capelas, é o baixo tempo de alocação profissional às equipas, com baixo número de recursos, já apontado na primeira parte do relatório, apresentado em dezembro.
“Este relatório vem dizer que, apesar de tudo, até se consegue receber muitos doentes, mas o que acontece é que isso tem algum impacto aparentemente negativo”, nomeadamente no escasso tempo de dedicação profissional por doente.
Isso traduz-se no facto de, em “metade das equipas, os médicos terem cerca de nove minutos ou menos por doente por dia, o que não abona nada em termos de uma prática integral e de uma visão multidisciplinar que tem que haver” nestes cuidados.
O tempo alocado dos psicólogos e dos assistentes sociais ao doente também é “muito reduzido para uma prática verdadeiramente de cuidados paliativos”, que não deve ficar muito centrada no controlo de sintomas.
“Nós não poderemos prestar bons cuidados se não tivermos as pessoas com alocação necessária”, disse, defendendo ser “preferível” ter menos recursos e ir dotando a rede para crescer de “uma forma sustentada, prática, com os recursos adequados”.
O objetivo é permitir uma prática adequada, sendo “muito seletivos” na identificação, triagem e na admissão dos doentes e, “acima de tudo, em tempo útil para que estas equipas possam verdadeiramente prestar os cuidados”.
O estudo também demonstra que há realidades “muito diferentes” no país, com locais onde há médicos a poder dedicar seis minutos por semana a um doente e outros quase duas horas.
Para Manuel Capelas, “há que repensar de forma urgente [este problema], porque o sofrimento é urgente e o número de pessoas” que necessita destes cuidados vai aumentar.
“Isto não é uma questão de esperar que o tempo resolva. O tempo vai agravar esta situação se continuarmos a dar respostas que apostam sobretudo na estrutura”, em números e numa taxa de acessibilidade por recurso em vez de uma taxa de acessibilidade por doente que coincida com o tempo que o médico tem disponível para o paciente.
O relatório ressalva que, apesar de os resultados não poderem ser definidos como completamente representativos da realidade nacional, as taxas de resposta acima dos 50% justificam a importância e validade externa deste estudo.
Ordem dos Psicólogos pede medidas no OE 2020
A Ordem dos Psicólogos reage com preocupação aos dados revelados pelo Observatório Português dos Cuidados Paliativos.
Na leitura do bastonário Francisco Miranda Rodrigues, a explicação está na insuficiência de apoio psicológico na área.
“Se nós não atingirmos um número mínimo que permita dar um apoio real à necessidade que estas pessoas têm, não há muitas estratégias de otimização que possamos fazer para que este serviço esteja efetivamente acautelado e disponível para estas pessoas”, afirma Francisco Miranda Rodrigues, em declarações à Renascença.
O bastonário da Ordem dos Psicólogos espera que o Orçamento do Estado (OE) para 2020 responda às necessidades na área.
[notícia atualizada - com a reação da Ordem dos Psicólogos]