Os enfermeiros entraram esta sexta-feira no sexto e último dia de greve. A paralisação abrange todos os serviços de saúde públicos, como hospitais e centros de saúde. Os enfermeiros exigem um novo estatuto profissional, uma maior dignificação da carreira, maior contratação e o acesso à reforma aos 35 anos de serviço e 57 de idade.
Pedem ainda a definição das condições de acesso às categorias, a grelha salarial, os princípios do sistema de avaliação do desempenho, do regime e organização do tempo de trabalho e as condições e critérios aplicáveis aos concursos.
Além da greve, está marcada para o início desta tarde uma manifestação em Lisboa, que começa no Campo Pequeno e segue até ao Ministério da Saúde.
Em entrevista à Renascença, José Carlos Martins, presidente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), salienta a "resiliência" dos enfermeiros, que decidiram perder estes seis dias (não consecutivos) de trabalho para exigir melhores condições.
"Num quadro em que é muito difícil, os enfermeiros perderem três a quatro dias de vencimento do baixo salário que têm por mês" é de destacar, defende. "Nós cuidamos das pessoas e temos que assegurar serviços mínimos", por isso, "a expressiva adesão a estes dias de greve traduz bem o enorme descontentamento dos enfermeiros", reforça José Carlos Martins.
Nos cinco dias de greve até agora realizados, a expressão da adesão foi sempre acima dos 60%, uma estatística que, para o presidente do SEP, "traduz o enorme, amplo e profundo descontentamento dos enfermeiros".
"Nós somos poucos nos serviços para cuidar com qualidade"
A par da revisão da carreira de enfermagem, os enfermeiros exigem mais pessoal nos hospitais e centros de saúde para ajudar o serviço. José Carlos Martins lamenta a atual situação. "Somos poucos nos serviços para cuidar com qualidade e com segurança, de acordo com o que aprendemos e sabemos fazer das pessoas". O sindicalista aponta este ponto para pedir uma maior compreensão das pessoas que usufruem do Serviço Nacional de Saúde.
Outro ponto que José Carlos Martins aponta como fundamental nesta greve é o acesso à reforma mais cedo, por se tratar de uma profissão "altamente penosa". Pede a reforma aos 35 anos de serviço e 57 de idade e afirma que toda a gente já reconheceu os problemas por onde passa.
"É uma evidência para as pessoas que entram nos hospitais que é perfeitamente impossível que enfermeiros com 66, 67 e 68 anos de idade permaneçam nos serviços a todos os níveis, para garantir bons cuidados de saúde às pessoas", diz.
Sobre as condições que fazem os enfermeiros merecer este acesso precoce à reforma, atira ainda que "70% dos enfermeiros trabalham por turnos, o que provoca uma enormíssima dificuldade de conciliação dessa vida profissional com vida pessoal". Além disso, "o contacto permanente, ao fim de 40 anos, com morte e com sofrimento é profundamente desgastante", sustenta.
Nova ministra não muda
A greve iniciou-se com Adalberto Fernandes ainda como ministro da Saúde, no dia 10 de outubro. Entretanto, o ministro saiu do Governo e deu entrada Marta Temido, que tomou posse no dia 15 de outubro.
O presidente do SEP espera o mesmo da nova ministra: que reconheça as "justas reivindicações dos enfermeiros".
"O que é esperado é que haja uma primeira reunião com esta equipa, mas isso não invalida a continuação das negociações que estavam em andamento. O que se exige é que, para essa reunião da próxima semana, seja apresentada uma contraproposta negocial", diz.
Com o Orçamento do Estado para 2019 (OE 2019) entregue no início da semana, José Carlos Martins vê sinais de esperança, pois a proposta não introduz qualquer "elemento perturbador ou dificultador nas negociações nem no chegar a resultados que satisfaçam boas soluções", afirma.
Aliás, o OE 2019 nem é grande preocupação para o sindicato. "Há um conjunto de matérias na carreira que não têm nada a ver com dinheiro. Nós estamos a pedir, por exemplo, um diploma único de carreira que se aplique a todos os enfermeiros, independentemente do tipo de contrato. Isto não tem a ver com dinheiro", diz José Carlos Martins, enquanto garante que nada aponta para um Orçamento que não permita "dignificar e valorizar a carreira de enfermagem".
O que falta fazer?
Depois de seis dias de greve e a manifestação desta sexta-feira, os enfermeiros voltam ao trabalho regular nos serviços de saúde públicos. Se o Governo não responder positivamente às exigências dos profissionais, só "resta continuarmos a lutar", diz José Carlos Martins. E os enfermeiros estão prontos para isso.
"A adesão, como referi, expressa bem a enorme capacidade de resistência, de resiliência e de motivação dos enfermeiros em contribuir para a solução dos seus problemas. Se o ministério não der resposta, é certo e garantido que nós iremos continuar com formas de luta que teremos de discutir com todos os enfermeiros", garante.
Para os utentes que possam ficar descontentes com a falta de serviço nos hospitais e nos centros de saúde, o presidente do SEP esclarece que a greve é "a melhor arma", mas uma arma que não gostam de apontar.
"Fazer greve é sempre um meio de pressão para encontrar soluções, mas nós não queremos fazer greves! É sempre o último recurso. Só fazemos greve se o Governo não corresponder às nossas soluções. Se o Governo for respondendo e for evoluindo de posição, evidente que não se justifica fazer greve", sublinha o sindicalista.
A paralisação começou no dia 10 e, nessa semana, os dias de greve tiveram uma adesão entre os 70% e os 80%, obrigando ao adiamento de várias cirurgias. Na quarta-feira, o quarto dia de greve realizou-se nos turnos da noite, manhã e tarde exclusivamente em todos os serviços das instituições hospitalares, com exceção dos blocos operatórios e da cirurgia do ambulatório, pelo que as cirurgias decorreram normalmente.