O Governo pediu a uma firma de advogados – a Linklaters - um relatório estratégico para “resolver” a relação com o SIRESP (Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal). Em causa, segundo o que o Ministério da Administração Interna adiantou à Renascença, está sobretudo a questão da responsabilidade do consórcio por falhas na rede como as que aconteceram no incêndio de Pedrógão Grande, em que morreram 64 pessoas.
“Perante diferentes entendimentos desta mesma cláusula, entendeu a ministra da Administração Interna solicitar uma análise jurídica independente sobre a mesma”, respondeu o gabinete de Constança Urbano de Sousa às perguntas da Renascença, confirmando que foi feito um pedido à Linklaters.
O objectivo será, portanto, “obter uma clarificação, através de uma empresa independente, sobre a cláusula 17, denominada de 'Força Maior'”, esclareceu também o gabinete da ministra.
Essa cláusula, que existe no contrato desde o início, iliba a empresa SIRESP SA de falhas na rede de comunicação de emergência em “casos de força maior imprevisíveis e irresistíveis”, como “actos de guerra ou subversão, hostilidades ou inversão, rebelião, terrorismo ou epidemias, raios, explosões, graves inundações, ciclones, tremores de terra”. Ou seja, aplicando a cláusula ao incêndio de Pedrógão, caso se prove que foi causado por um raio, o SIRESP poderá não ser responsabilizado por falhas no sistema.
Embora o pedido de parecer tenha como objectivo declarado o esclarecimento desta cláusula, ao que a Renascença apurou junto de fontes governamentais, poderá estar em causa uma revisão do contrato e da responsabilização do consórcio, uma vez que a denúncia - ou seja, o fim do actual acordo - colocaria vários problemas e teria custos elevados.
Contudo, essa possibilidade também deve ser estudada, já que terá sido pedido um relatório estratégico, ou seja, um documento que coloque em cima da mesa todas as possibilidades que o Estado terá de alterar a sua relação com o consórcio dono do SIRESP.
A expressão usada por uma fonte governamental foi mesmo “resolver o SIRESP”, mas outras fontes contactadas pela Renascença adiantam que está em vista sobretudo “melhorar” o contrato entre o Estado e o consórcio que integra a Galilei (antiga SLN), a Esegur (do Grupo Espírito Santo), a Motorola, a Datacomp, a CGD e a PT.
O contrato foi negociado pelo Governo de Santana Lopes e acertado já com esse executivo em gestão. Acabaria por ser assinado, em 2006, por António Costa, como ministro da Administração Interna do Governo Sócrates. Ao longo dos anos, já foram feitas várias renegociações, mas, como noticiou este domingo o diário "Público", durante oito anos o SIRESP funcionou com contratos informais.
Outra fonte conhecedora do processo disse à Renascença que, embora o pedido de parecer não exclua nenhum cenário, a denúncia do contrato que regula esta PPP é uma hipótese muito difícil, já que teria um custo na ordem dos 200 milhões de euros. Além disso, teria um custo operacional ainda mais difícil de ultrapassar que é não haver um sistema alternativo.
A firma Linklaters, à qual foi pedido o parecer, é uma multinacional da advocacia: tem sede em Londres e escritórios em várias capitais mundiais, incluindo Lisboa. Uma das áreas preferenciais são os conflitos arbitrais e um dos sócios do escritório em Portugal, Pedro Siza Vieira, já foi nomeado pelo actual Governo para vários grupos de trabalho, como o que estudou a solução para o crédito malparado.