O parlamento vota em plenário de sexta-feira o texto final da apreciação parlamentar do diploma do tempo de serviço dos professores, de acordo com o guia de votações para esse dia disponível no site da Assembleia da República.
O guia de votações do plenário de dia 10, marcado para as 10h00, inclui o texto final acordado pela Comissão de Educação e Ciência que consagra a contagem integral dos nove anos, quatro meses e dois dias de tempo de serviço congelado aos professores, votado favoravelmente pelo BE, PCP, PSD e CDS-PP na passada quinta-feira e em relação ao qual, na última reunião da comissão, na terça-feira, não foram levantadas objeções de fundo, sendo apenas apontadas questões de pormenor, entretanto sanadas.
A expectativa é a de que, apesar do acordo inicial, o texto final seja chumbado na votação final global.
Isto, porque, no dia seguinte à sua aprovação na especialidade, num raro acordo entre direita e esquerda parlamentar, o primeiro-ministro, António Costa, numa declaração ao país a partir da sua residência oficial, depois de uma manhã de reunião de coordenação política do executivo e de uma reunião com o Presidente da República, anunciou que o Governo se demitiria se o texto viesse a ser aprovado pelo parlamento.
O primeiro-ministro justificou a crise política que abriu nesse momento com o impacto orçamental que a contagem do tempo de serviço provocaria, não só em relação aos professores, mas também relativamente às restantes carreiras especiais.
Em menos de 24 horas a crise política, que todos os partidos começaram por criticar e classificar como “artificial”, “um golpe de teatro”, “farsa” e “calculismo eleitoral”, a direita acabaria por recuar, fazendo uma inversão no discurso e cedendo a António Costa, ao afirmar que o texto final só seria aprovado se fossem também aprovadas alíneas de salvaguarda financeira e de sustentabilidade das contas públicas, as mesmas que tinham sido chumbadas pela esquerda na especialidade, incluindo o PS.
A esquerda, por seu lado, anunciou que manteria o sentido de voto, ou seja, chumbaria as salvaguardas exigidas pela direita, o que inviabiliza a aprovação do texto final da apreciação parlamentar, mesmo depois do apelo dos sindicatos de professores em sentido contrário.
As contas do Governo, que apontam para uma despesa total de 800 milhões de euros com a recuperação na íntegra do tempo de serviço congelado dos professores e das restantes carreiras especiais, foram hoje contrariadas pela Unidade de Apoio Técnico Orçamental (UTAO) da Assembleia da República, que, por seu lado, estimaram em menos de metade o custo líquido com essa recuperação.
Na “guerra” de números o Ministério das Finanças, tutelado por Mário Centeno, já veio dizer que considera o cálculo da UTAO “totalmente arbitrário”, mas as contas foram suficientes para deixarem hoje o PS e o Governo debaixo de fogo no parlamento, com críticas à esquerda e à direita aos números de Centeno.
Fenprof recusa traição de esquerda
A Fenprof recusou hoje que os professores tenham sido traídos pelos partidos da esquerda, que anunciaram que não vão responder ao apelo sindical para viabilizar as propostas de direita sobre o tempo de serviço, mas admite “frustração”.
“Traição aos professores faz o PS que é o único até agora que diz que não vai recuperar rigorosamente coisa nenhuma. Eu não quereria falar em traição, porque os únicos que têm compromissos com os professores são os sindicatos. Agora que frustram expectativas, os de direita e os de esquerda, menos o PS que já não frustra expectativas de ninguém, frustram”, disse hoje o secretário-geral da Federação Nacional dos Professores (Fenprof), Mário Nogueira.
O líder da Fenprof esteve hoje nas instalações da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (DGEstE), onde decorreu uma iniciativa sindical de entrega de requerimentos para pedir a negociação das condições de pré-reforma dos docentes mais velhos e à margem da qual comentou a questão da contagem do tempo de serviço dos professores e as mudanças de posição que na votação final global em plenário na próxima sexta-feira na Assembleia da República (AR) podem reverter o acordo parlamentar alcançado na especialidade na passada quinta-feira para contagem integral dos mais de nove anos de tempo de serviço congelado.
“Se ambos os lados afirmam que é justo e que deve ter lugar a recuperação de tempo de serviço, era natural que reafirmando as suas posições, que são distintas, no momento final pudesse prevalecer o que é mais importante, que era deixar que os nove anos, quatro meses e dois anos de tempo de serviço ficassem em lei”, disse Mário Nogueira.
O secretário-geral da Fenprof mantém a esperança que seja possível chegar a um entendimento que não comprometa esse objetivo da luta sindical, ainda que reconheça que “não é a hipótese que está em cima da mesa”, mesmo depois da carta aberta enviada aos partidos a apelar a um esforço de garantir “o essencial para os professores”, que seria a certeza de ver todo o tempo contabilizado para efeitos de progressão.
A propósito da tomada de posição do PCP, que recusa viabilizar as exigências da direita, e que por isso vai inviabilizar a aprovação do texto da apreciação parlamentar, Mário Nogueira desmentiu ainda a notícia avançada hoje pelo jornal ‘Público’, que adiantava que o líder da Fenprof estaria a ponderar a sua saída do PCP, partido do qual é militante.
“Isso é uma não notícia. Não é verdade”, disse.
À frustração das mudanças de posição anunciadas Mário Nogueira juntou ainda a deceção que, para já, tem sobretudo uma cor política.
“Quem mais me dececionou foi o PS. Perante o resto, eu que assisti em direto e in loco ao que se passou na quinta-feira na comissão de educação, eu diria que me dececionarão todos se não forem capazes de na próxima sexta-feira repetir uma convergência que possa resolver este problema”, disse.
As contas hoje divulgadas pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) da AR, que cortam para metade o impacto líquido dos custos da recuperação do tempo de serviço congelado em todas as carreiras especiais da administração pública – de 800 milhões de euros brutos para 398 milhões de euros líquidos, se não servirem de argumento para os partidos reverem as já anunciadas intenções de voto no texto final da apreciação parlamentar do diploma do tempo de serviço dos docentes, servem pelo menos para dar razão aos sindicatos, na opinião de Mário Nogueira.
“O que nós temos dito, que se anda a mentir aos portugueses, para fazer passar uma mensagem falsa para ‘arrumar’ os professores numa reivindicação que é justíssima, de facto, hoje não somos nós a dizer”, disse o líder da Fenprof.
Por agora os sindicatos esperam pelo desfecho da votação final no parlamento para decidir os próximos passos, que passam pela continuação da luta dos professores e provavelmente por greves, nomeadamente às avaliações do 3.º período, mas o calendário de protesto será decidido numa reunião entre as 10 estruturas que têm reivindicado em plataforma a contagem integral do tempo de serviço.
Se o parlamento chumbar o texto final, Mário Nogueira deixa já outra garantia.
“O próximo Governo tomará posse num dia e no dia seguinte os dirigentes sindicais estarão à porta do Ministério para dizer ao senhor ministro que queremos começar o processo para recuperar os restantes 6,5 anos”, disse.
Professores iniciaram hoje entrega de pedidos de pré-reforma
Dezenas de professores concentraram-se hoje em Lisboa frente à Direção-Geral de Estabelecimentos Escolares (DGEstE), onde preencheram os requerimentos que depois entregaram para pedir a negociação da pré-reforma, que cerca de 50 mil professores estão em condições de requerer.
Pelas 15:00 da tarde em frente às instalações da DGEstE estavam pouco mais de uma dezena de professores, que numa mesa ali instalada para o efeito, iam preenchendo os requerimentos-tipo preparados pela Federação Nacional dos Professores (Fenprof) para dar início nesta direção do Ministério da Educação ao processo de negociação das condições de pré-reforma.
“Este é o ato simbólico de arranque. A partir de amanhã em todas as escolas o apelo é que todos os professores que têm 55 ou mais anos de idade façam esse apelo aos diretores. As pessoas estão cansadas, estão envelhecidas e sobretudo estão fartas de serem governadas por quem tão mal as trata e, portanto, querem ir embora”, resumiu o secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira, que acompanhou a iniciativa de Lisboa, mas que foi replicada nas delegações regionais da DGEstE do Porto, Coimbra, Évora, Faro e Funchal.
Mário Nogueira disse que serão cerca de 50 mil os professores com 55 anos ou mais em condições de pedir a pré-reforma, mas, até agora, todos os que tentaram fazer esse pedido junto das direções das suas escolas obtiveram como resposta que não há resposta para lhes dar.
“O Ministério da Educação já disse que não há professores interessados na pré-reforma, porque não tem ninguém a pedir isso. Isto é mentira”, disse Mário Nogueira.
Depois de em fevereiro ter entrado em vigor o diploma que permite a pré-reforma no setor público a partir dos 55 anos, em relação ao qual o Governo veio depois dizer que só seria aplicado em condições muito excecionais, os professores querem agora que os serviços do Ministério da Educação prestem esclarecimentos sobre a forma de requerer a aplicação do regime de pré-reforma, a negociação e aspetos relativos à vigência do diploma em questão.
Depois de uma declaração aos professores ali presentes, que focou o envelhecimento da classe docente, com a maioria dos professores com idades acima dos 40 anos, sendo menos de 1% os que têm menos de 30 anos, o líder da Fenprof acompanhou os professores aos serviços da DGEstE, onde tiraram uma senha e ficaram a aguardar vez para entregar o requerimento.