A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) alerta que praticamente já se assiste, na Faixa de Gaza, ao colapso dos hospitais, na assistência aos doentes e feridos, na sequência da guerra entre Israel e o Hamas que estalou a 7 de outubro.
Em declarações à Renascença, esta quinta-feira, o diretor-geral da MSF Portugal indica que as poucas unidades de saúde que ainda dispõem de energia deverão ficar às escuras dentro de aproximadamente 24 horas, dada a falta de combustível no enclave palestiniano.
João Antunes descreve uma situação particularmente delicada, com base no testemunho de alguns médicos palestinianos da organização que, apesar da ordem de evacuação, decidiram continuar a socorrer os pacientes que chegam aos hospitais de Gaza.
Quais são as informações mais recentes, de que a Médicos Sem Fronteiras dispõe, sobre a situação que se está a viver nos hospitais de Gaza?
Já estamos praticamente a assistir ao colapso de assistência aos doentes. Estamos a falar de pessoal médico que não consegue tratar corretamente os pacientes, ou admitir novos doentes. Há falta de pessoal, de medicamentos e de equipamento médico e continua a haver um fluxo constante de doentes com ferimentos graves. São queimaduras, são fraturas, são membros esmagados.
A informação que temos é a de que o Al-Shifa Hospital, considerado o maior hospital de Gaza, é dos poucos que ainda tem electricidade, embora saibamos que irá durar por mais 24 horas, talvez, no máximo.
Sem eletricidade, o nosso grande temor é o de que muitos dos doentes que estão a ser tratados neste hospital acabarão por ter um grande risco de morrer. Estamos a falar de pessoas que se estão nos cuidados intensivos, nas máquinas de suporte respiratório, na neonatologia...
Como é que obtiveram essas informações? Os Médicos Sem Fronteiras ouviram as instruções de Israel, já conhecidas de todos, para a evacuação dos hospitais de Gaza. As vossas equipas também deixaram esses hospitais? De onde vos chegam essas informações?
A Médicos Sem Fronteiras tem bastante experiência em trabalhar nestes cenários, mas não abdica de uma condição verdadeiramente fundamental, que é a garantia da segurança. Apesar disso, deste cenário de risco de vida, alguns dos nossos colegas palestinianos tomaram a decisão de permanecer nas estruturas de saúde que ainda estão operacionais.
E são eles que vos estão a informar...
Tem a noção se, entre as os feridos que estão a ser tratados nos hospitais de Gaza, alguns dos reféns tomados pelo Hamas também estão a receber algum tipo de assistência médica?
É uma excelente pergunta que nos pode, também, introduzir aqui um princípio fundamental da ajuda humanitária: A partir do momento em que são feridos, passam a ser pacientes como qualquer outro...
Sim, mas obviamente que sendo reféns, provavelmente estarão sob vigilância de elementos do Hamas...seriam facilmente detetáveis, creio.
Não temos essa informação.
Surgiu, hoje, a notícia de que alguns serviços de informação europeus estão a sugerir que o número de vítimas, no hospital atingido, não será afinal da ordem das centenas, mas dezenas. Há alguma informação que aponte num sentido ou noutro?
É impossível, com base, obviamente, nos poucos colegas que teríamos a trabalhar no hospital, obter uma informação que aponte num sentido, ou outro.
Tivemos, na altura, o testemunho do Dr. Hassan Abu, cirurgião da equipa da Médicos Sem Fronteiras. Ele estava, por iniciativa própria, a fazer uma cirurgia complicada nesse mesmo hospital, que foi bombardeado, e viu o teto da sua sala de operações desabar. Mas também gostaríamos de referir que este ataque ao Hospital Al-Ahli Arab, e que vai marcar de certeza este de escalar do conflito, mas não foi caso único.
Segundo a OMS, já tivemos cerca de 26 hospitais que foram danificados. E aqui, relembramos o grau de respeito, que tem que ser tomado por ambas as partes, daquilo que são estruturas de saúde e daquilo que são cuidados médicos.