A Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) congratula-se com a forma como estão a ser recebidos em Portugal milhares de cidadãos ucranianos, que fogem dos “horrores da guerra” e chegam em situação de vulnerabilidade. “Nestes tempos de sombras temos sido surpreendidos pelo movimento de acolhimento das nossas irmãs e dos nossos irmãos ucranianos, que contagiou uma boa parte das instituições portuguesas”, começa por sublinhar o comunicado enviado à Renascença.
No texto, a CNJP destaca a “notável generosidade” com que muitas famílias têm cedido alojamento, partilhando muitas vezes “a sua própria habitação”, mas também alerta para os “sérios desafios” que o processo implica, e que exigem, desde logo, uma “mais efetiva coordenação” entre as várias entidades envolvidas, garantindo transparência e rigor.
“A pessoa humana tem que ser colocada no centro da atuação dos agentes sociais, económicos, políticos e culturais”, defende o organismo católico, lembrando que este será um processo longo. “Importa manter aceso, no decurso dos próximos meses, o entusiasmo com que nos dispusemos a receber milhares de migrantes”, cuja chegada pode ser uma “oportunidade” para Portugal se reinventar “como país e sociedade, lançando as bases de uma política humanista, alicerçada no diálogo e na cooperação institucional, e na promoção de sólidas parcerias entre o setor público e privado”.
A CNJP lamenta, no entanto, que não se esteja a agir da mesma forma com todos os que chegam. “O tratamento dispensado aos ucranianos coloca-os numa posição de privilégio, comparativamente com os demais refugiados e migrantes, antecipando-se o surgimento de tensões entre migrantes de diversa proveniência e o agravar do descontentamento dos deslocados que enfrentaram dificuldades no processo de acolhimento”, refere o comunicado, defendendo que se aperfeiçoem “as políticas e os procedimentos de integração dos migrantes”.
Numa clara referência à polémica que envolveu o acolhimento na autarquia de Setúbal, a Comissão Nacional Justiça e Paz sublinha que “deve haver a garantia de que dados sensíveis fornecidos pelos migrantes ucranianos sejam usados sempre de acordo com o superior interesse dos refugiados e das suas famílias”. E acrescenta: "Todos os que acolhem os refugiados devem fazê-lo com a sensibilidade e a formação necessárias, respeitando a dignidade da pessoa humana”.
A Comissão lembra, ainda, que “não há acolhimento sem escuta” e que é preciso dar atenção aos “traumas”, o que “pressupõe, desde logo, uma mente despida do preconceito”, em que “os verbos ouvir, refletir, discernir, compreender ganham particular expressão neste processo”.