Mais de 80 enfermeiros do Hospital de Penafiel pediram escusa de responsabilidade alegando incapacidade de prestar cuidados de saúde com a devida qualidade e segurança, uma situação que a Ordem dos Enfermeiros do Norte teme que se multiplique.
As escusas de responsabilidade, datadas de 22 e 24 de junho, a que a lusa teve acesso, foram apresentadas por 63 enfermeiros do Serviço de Urgência e 20 do Serviço de Medicina do Hospital de Penafiel, no distrito do Porto, que pertence ao Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa (CHTS).
Alertando que "a nível nacional" esta situação repete-se "infelizmente aos milhares", o presidente do Conselho Regional do Norte da Ordem dos Enfermeiros, João Paulo Carvalho alertou que este hospital "não tem capacidade de resposta para a população que serve".
"Esta situação tornou-se visível com a pandemia, mas era algo que já vinha de trás. É um hospital que tem doentes internados em corredores. Não há dignidade e possibilidade de descanso para alguém que está numa maca num local de passagem e tem luzes permanentemente ligadas", disse o responsável.
À Lusa, João Paulo Carvalho descreveu "serviços sempre cheios" e "uma urgência sempre muito pressionada".
"É perfeitamente normal ter 30/40 doentes internados no Serviço de Urgência. Têm de suspender cirurgias programadas para poder internar doentes. Têm 100 a 200 doentes em camas alugadas ao setor privado ou social. Gastam milhares de euros com isto", descreveu.
Sobre as escusas de responsabilidade, João Paulo Carvalho não se mostrou surpreendido porque, disse, "as equipas de enfermagem [do Hospital de Penafiel] têm défices no rácio por turno".
"Por isso estes colegas pedem escusa de responsabilidade. Provavelmente seguir-se-ão outros. O que eles vêm dizer com escusa de responsabilidade é que são incapazes de garantir os cuidados de forma atempada e segura a todos os doentes. Eles têm de fazer opções. Têm de dizer agora só consigo tratar este e deixar os outros para trás", referiu.
Ordem pede a autarcas que ajudem a encontrar soluções
O responsável pela Ordem dos Enfermeiros do Norte, João Paulo Carvalho aproveitou para lembrar que "muitos hospitais a Norte têm conselhos de administração em gestão corrente" e deixou um repto aos autarcas dos concelhos que referenciam para o CHTS.
"As autarquias têm de assumir o problema que está a acontecer no Hospital de Penafiel. Têm de criar um grupo de trabalho ou um grupo de pressão. O poder local tem de ter uma palavra a dizer junto da tutela. Têm de existir soluções para acabarem os doentes amontoados e os profissionais de saúde exaustos", concluiu.
A agência Lusa contactou a administração do CHTS que, via "email", referiu que este é um dos maiores hospitais do país, em termos da população que serve e da área geográfica de referência".
São cerca de 500 mil pessoas, ou seja 5% da população portuguesa, distribuída por 12 concelhos em quatro distritos.
A administração admitiu que este hospital "sofre de uma permanente pressão e em que a alocação de recursos escassos é um problema recorrente" e garantiu que "tem vindo a ser feito um enorme esforço de atratividade do CHTS nos últimos anos, ao ponto de, ainda recentemente, ter sido um dos hospitais que maior número de jovens médicos conseguiu fixar no recente concurso (cerca de 40)".
A administração do CHTS acrescentou que "recentemente" foi "forçada a cessar contratos a termo de seis meses com enfermeiros e assistentes operacionais que tinham sido realizados no outono, com a perspetiva de que a afluência reduziria no verão, o que não veio a acontecer".
Centro hospitalar admite pressão e problemas recorrentes
A administração do Centro Hospitalar Tâmega e Sousa admite que há pressão nos serviços e reconhece que o problema de recursos humanos é recorrente, com muitas dificuldades na contratação e incapacidade de prestar cuidados de saúde com a devida qualidade e segurança.
Em resposta enviada à Renascença, o conselho de administração assinala a recente fixação de cerca de 40 jovens médicos, mas lembra, contudo, que foi forçado a cessar contratos a termo de seis meses com enfermeiros e assistentes operacionais.
Esses contratos tinham sido realizados no Outono, apenas por seis meses com a perspetiva de que a afluência reduziria no Verão, o que não veio a acontecer.
[atualizado às 15h50]