A Associação Nacional de Cuidados Continuados (ANCC) diz que há, pelo menos, 200 unidades de Cuidados Continuados em Portugal que estão a atravessar sérias dificuldades financeiras.
O quadro é traçado à Renascença pelo presidente da ANCC, por José Bourdain, nesta terça-feira em que foi concretizado o encerramento de uma unidade de Setúbal, devido a um processo de insolvência.
A Unidade de Cuidados Continuados da Rollar, Alojamento para Idosos SA, uma empresa privada e familiar de Setúbal, deu inicio à retirada de um total de 18 pessoas para outras unidades semelhantes devido, precisamente, a um processo de insolvência.
O encerramento começou a desenhar-se no final de novembro do ano passado, quando a Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e Vale do Tejo decidiu não repor as camas das pessoas que tinham alta, alegando que os “contratos com a instituição não iriam ser renovados”, refere a agência LUSA.
José Bourdain acredita que o caso de Setúbal pode, muito em breve, repetir-se noutras zonas do país.
“Estamos a falar de duas centenas de unidades de Cuidados Continuados, o que representa cerca de 1.500 camas. Só nos últimos meses perderam-se 147 camas, o que não é tão pouco como isso”, adianta, o responsável.
“Umas acabam por encerrar por iniciativa própria, para não pôr em causa o todo da organização e, outras, fecham por falência, tentam resistir ao máximo até ao fim, mas depois não conseguem”, prossegue, confirmando que “foi este o caso da de Setúbal, que não conseguiu honrar os compromissos, falhou o pagamento e a banca executou a hipoteca”.
A ANCC já enviou cartas ao Governo e à Assembleia da República a solicitar audiências com carácter de urgência. O objetivo passa por alertar para as dificuldades financeiras que se fazem sentir nestas instituições.
Por outro lado, apela ao Governo para que disponibilize verbas para garantir o funcionamento destas unidades, que têm visto os custos a aumentar, sem o respetivo acompanhamento por parte dos pagamentos do Estado.
“As verbas que o Estado nos paga são exatamente as mesmas que eram em 2011. Houve uma subida de custos brutal, nos últimos quase 12 anos. A inflação subiu 11,6%, o salário mínimo subiu 32%, a Taxa Social Única para as instituições sem fins lucrativos subiu 2,7% neste período, também, para a totalidade dos salários”, recorda.
“Em fevereiro de 2017”, prossegue, “o Estado obrigou as unidades a contratualizar mais recursos humanos. E o que deu em troca nestes últimos anos? 2,2% de aumento em 2019, apenas e, em julho do ano passado, das quatro tipologias de Cuidados Continuados deu um aumento de 5% à tipologia mais mal paga”, afirma, José Bourdain.
“O Estado praticamente não mexeu nos preços. Portanto, isto é uma equação impossível”, acrescenta.
Sem ter recebido qualquer reforço orçamental, a ANCC assume ter já proposto a nacionalização do setor.
“Há um ano, numa reunião com a senhora ministra, desafiei-a a nacionalizar as unidades de Cuidados Continuados, pois pelo menos não vivemos este sufoco financeiro”, refere, pedindo que estas organizações sejam indemnizadas “pelos investimentos que fizemos nos edifícios” e que as pessoas “que lá trabalham sejam transferidas para a esfera do “Estado”.
“Assim, é que não pode ser. Ou nos dá dinheiro suficiente, para funcionar minimamente sem constrangimentos ou, então, nacionalize as organizações”, observa o presidente da associação.
“Todo o setor da saúde foi reforçado para fazer face ao aumento de custos, resultante da pandemia. Os Cuidados Continuados não foram aumentados um único cêntimo. Acho isto uma enorme discriminação, quando toda a gente sabe que a pandemia trouxe um aumento de custos brutal em todas as áreas”, remata, José Bourdain.