Migração. António Vitorino acusa Cameron de criar "problema muito complicado de discriminação”
16-11-2015 - 12:51
 • José Pedro Frazão

Os comentadores do Fora da Caixa analisam os quatro objectivos de Cameron para a renegociação da presença britânica na União Europeia. Da protecção dos serviços financeiros britânicos ao reforço do poder dos parlamentos nacionais, da redução da burocracia comunitária ao corte nos benefícios para cidadãos europeus que vivem no Reino Unido.

O antigo comissário europeu António Vitorino contesta a proposta britânica de limitar benefícios a cidadãos da União Europeia que trabalhem no Reino Unido.

Esta é uma das quatro propostas de David Cameron inscritas na carta dirigida ao presidente do Conselho Europeu, que elenca os objectivos definidos por Londres para a negociação da presença britânica na União Europeia.

"O que Cameron propõe é limitar os benefícios laborais destes cidadãos europeus, criando um problema muito complicado de discriminação. Estes cidadãos não poderiam ter acesso a benefícios sociais no Reino Unido nas mesmas condições que os cidadãos britânicos. O inverso não é verdadeiro: um inglês que esteja a trabalhar aqui em Portugal tem exactamente direito aos mesmos benefícios sociais que um cidadão português”, denuncia António Vitorino no programa “Fora da Caixa” emitido na última sexta-feira na Renascença.

O comentador considera que este é um tema muito complicado do ponto de vista jurídico, que pode acabar através de um "julgamento severo" do Tribunal de Justiça da União Europeia. Vitorino contesta ainda a forma como Cameron mistura os conceitos de migração e de liberdade de circulação.

“Eles chamam ‘migração', mas estamos a falar da liberdade de circulação de trabalhadores dentro do espaço europeu. Migração é uma coisa, são cidadãos de países terceiros. Esses são imigrantes. Os cidadãos da União Europeia, isto é, os 150 mil portugueses que estão no Reino Unido a trabalhar, não são imigrantes no sentido geral do termo. São cidadãos europeus que exerceram a liberdade de circulação para o Reino Unido. Os 800 mil polacos que estão no Reino Unidos são cidadãos europeus que exerceram o direito de liberdade de circulação”, insiste Vitorino no debate de temas europeus da Renascença.

Uma improvável mudança dos tratados

A proposta britânica só pode concretizar-se por via de uma alteração dos tratados, diz Vitorino. Mas “todos os outros estados até à data não se têm mostrado nada disponíveis para alterar o tratado”.

Já Pedro Santana Lopes não prevê flexibilidade por parte do Reino Unido nesta matéria. “É pouco verosímil pensar que o Reino Unido vai manter a posição de respeito integral por Schengen sem nenhuma compensação ou derrogação”, afirma o antigo primeiro-ministro.

Até 2017, não está prevista qualquer reabertura dos tratados, apenas admitida de momento para aprofundar a União Económica e Monetária. “O único pretexto que os britânicos podiam ter para apanharem uma espécie de boleia não está lá”, diz António Vitorino, que insiste que não há sinais de que os estados-membros aceitem “reabrir a frio” os tratados apenas por causa do caso britânico.

“O sol quando nasce é para todos. A partir do momento em que abram o processo de revisão dos tratados não é possível dizer que é só para tratar das questões britânicas. Haverá muitos outros estados-membros que têm os seu pedidos próprios de alteração dos tratados”, afirma o antigo comissário europeu.

Para Vitorino, a questão mais difícil e complexa de resolver será a protecção da praça financeira londrina no quadro do mercado interno dos serviços financeiros.