O ex-chefe da Casa Militar da Presidência da República João Cordeiro é uma das figuras centrais deste caso, porque é a ligação mais direta que pode ser encontrada ao Presidente da República.
Não está acusado, não faz parte da lista dos 23 arguidos, mas o Ministério Público diz não ter dúvidas de que o tenente-general João Cordeiro foi sendo informado daquilo que a Polícia Judiciária Militar foi fazendo neste caso: logo após o furto e já depois da recuperação das armas.
A convicção do Ministério Público assenta em dois pressupostos: os emails, SMS e telefonemas que o ex-chefe da Casa Militar da Presidência trocou com o então director da PJM, mas também duas escutas telefónicas que o envolvem.
Dia 1 de abril deste ano, o ex-porta-voz da PJ Militar e também arguido Vasco Brazão disse, em conversa telefónica com o pai, que tinha provas concretas – nomeadamente um email – de que a Casa Militar da Presidência foi informada de tudo.
Quatro dias depois, a 5 de bril, num telefonema para a irmã, Vasco Brazão disse a já célebre frase de que o “Papagaio-Mor do reino” não deverá falar sobre o assunto.
Nesse telefonema, Vasco Brazão disse também que o seu advogado já tinha avisado a Presidência de que existem provas e que no julgamento tudo se irá saber.
Apesar dos indícios, o ex-chefe da Casa Militar da Presidência da República João Cordeiro não está acusado porque o crime em que poderia incorrer - de abuso de poder - tem uma moldura penal até aos três anos, e para esse tipo de crimes as escutas telefónicas não têm validade como prova. Ou seja, não podendo sustentar a acusação, o DCIAP preferiu não acusar.
Mas, ainda assim, os procuradores decidiram extrair uma certidão deste processo e abrir uma investigação autónoma ao facto de o ex-chefe da Casa Militar da Presidência da República ter negado a existência dos referidos emails trocados com a PJ Militar.
Nesse caso, o crime em causa é o de falsidade de testemunho.
No final da investigação ao caso de Tancos, nove dos 23 arguidos foram acusados de planear e executar o furto do material militar dos paióis nacionais e os restantes 14, entre eles o ex-ministro Azeredo Lopes, da encenação que esteve na base da recuperação do equipamento.
Estes arguidos foram acusados, designadamente, por crimes de terrorismo (com referência ao crime de furto), de tráfico e mediação de armas, de associação criminosa, bem como de tráfico de estupefacientes.
Os restantes 14 arguidos, incluindo militares da Polícia Judiciária Militar (PJM) e da Guarda Nacional Republicana (GNR), de diversas patentes, um técnico do Laboratório da PJM e o ex-ministro da Defesa Nacional Azeredo Lopes, são suspeitos da encenação que esteve na base da recuperação de grande parte do material militar.
Estão todos acusados pelos crimes de favorecimento pessoal, denegação de justiça e prevaricação, sendo que os militares e o técnico do Laboratório estão também acusados, designadamente, por crimes de falsificação de documento, tráfico e mediação de armas e associação criminosa.
Dos 23 arguidos, oito estão em prisão preventiva e 11 (militares e técnico de laboratório) suspensos de funções. Os restantes ficaram sujeitos à medida de coação de proibição de contactos.
Segundo a PGR, o Ministério Público (MP) pediu ainda a aplicação da pena acessória de proibição do exercício de funções a todos os arguidos da PJM, da GNR e ao ex-ministro da Defesa.
O inquérito pretendeu investigar o furto, em 28 de junho de 2017, e as circunstâncias em que aconteceu a recuperação de grande parte do material militar, em 18 de outubro do mesmo ano.
Entende o MP que, além da "extrema gravidade dos crimes", a personalidade dos arguidos, incluindo Azeredo Lopes, manifestada nos factos, e o seu elevado grau de culpa, colidem com os fins institucionais de cargos públicos que ocupavam.
Para o MP, o ex-ministro da Defesa, que se demitiu em 12 de outubro de 2018, teve conhecimento das diligências paralelas feitas pela Polícia Judiciária Militar ao caso do furto de Tancos junto de uma pessoa com quem negociava a entrega do material.