O ex-embaixador de Portugal em Madrid acredita que o novo governo de Pedro Sánchez "pode não durar os quatro anos". Em declarações à Renascença, António Martins da Cruz diz que a recondução do primeiro-ministro abriu grandes fissuras na unidade nacional em Espanha, que está "totalmente polarizada".
O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros não vê com bons olhos o futuro do governo de Espanha, com a reeleição de Pedro Sánchez. O líder do PSOE teve o apoio do Somar e dos partidos independentistas da Catalunha, quase seis meses depois da dissolução do parlamento espanhol, a 29 de maio.
As negociações para obter o apoio necessário obrigaram Sánchez a fazer várias cedências, entre elas uma amnistia aos condenados pelo referendo na Catalunha.
Essa questão, considera Martins da Cruz, abre sérios precedentes, a começar pela independência das regiões autónomas. "A perspetiva de que esta movimentação possa levar a futuras independências, ou da Catalunha ou do País Basco - que eu não desejo para os espanhóis - mas que seriam extremamente negativas para Portugal", diz o antigo embaixador.
O diplomata explica que esta perspetiva pode criar a perceção, em "decisores políticos e económicos de outras partes do mundo", de um aumento de "interlocutores internacionais na Península Ibérica e, com isso, debilitar e diminuir a posição e a visibilidade de Portugal".
A instabilidade que a formação de novo governo vai trazer também não é boa para o nosso país, diz António Martins da Cruz.
"É mau por razões geopolíticas, porque se trata do nosso único vizinho. É mau por razões económicas, porque se trata do nosso primeiro mercado. Nós exportamos para Espanha entre 27 e 30% do total das nossas exportações e importamos de Espanha ao ano passado, 32% do total das nossas importações", afirma.
A composição do novo governo vai ser outro problema. As cedências que foram feitas nas negociações deixam Pedro Sánchez numa posição de vulnerabilidade, declara.
"Não se esqueçam que a senhora Diaz (Yolanda Diaz, líder do partido SOMAR), que vai fazer parte da coligação do Governo e que vai ser seguramente a segunda vice presidente do Governo, vem do Partido Comunista Espanhol. Portanto, é uma 'geringonça' com o Partido Comunista no Governo e não no apoio parlamentar, como aconteceu em Portugal. E isto pode trazer consequências à posição da Espanha na Europa, à política externa espanhola. Espero que não traga a relação com Portugal, mas vai obrigar, com certeza o Governo a fazer cedências e a fragilizar a sua posição interna e externamente", remata António Martins da Cruz.