"É natural". Foi sem supresa que Manuel Alegre, antigo dirigente do PS, ex-deputado, ex-conselheiro de Estado e por duas vezes candidato presidencial, ouviu o secretário-geral socialista António Costa a pedir de forma mais ou menos clara a maioria absoluta nas eleições de 30 de janeiro.
Perante as declarações do líder do PS à CNN em que pede uma maioria de deputados - "metade mais um" - Manuel Alegre diz à Renascença que fica claro o que Costa pede:"com maioria mais um é maioria absoluta, não é? Ou não será?", questiona o antigo deputado.
Para Alegre, "é natural que um partido como o PS" peça "uma maioria estável". E afinal, "o que é uma maioria estável?", pergunta e responde o antigo deputado: "uma maioria nas condições presentes é uma maioria absoluta", pedindo que não haja "medo das palavras, isso não é pecado nenhum, isso não é crime nenhum, é um acto legítimo em democracia".
Evitando dizer se acha que há condições ou não para uma maioria absoluta do PS ou do PSD, Alegre diz apenas que "se tal acontecer, acontecerá por vontade dos eleitores, através do sufrágio universal, livre e democrático", reconhecendo que existe "quase um complexo dos partidos em falar de maioria absoluta por causa de outras maiorias absolutas".
Alegre salienta que se trata, sobretudo, de uma questão de legitimidade, que "é legítimo um partido de poder, de governo, pedir a maioria absoluta" e que "qualquer partido tem essa legitimidade".
Nesta ordem de ideias, para Manuel Alegre "também era igualmente legítimo que o PSD pedisse a maioria absoluta, já a teve e teve mais vezes até do que o PS", recordando que "o PS só teve uma vez, o PSD teve várias vezes", referindo-se às duas maiorias absolutas de Cavaco Silva e à única conquistada por José Sócrates.
Questionado se o facto de um líder político, como o secretário-geral do PS António Costa, pedir claramente a maioria absoluta pode ou não espantar uma larga fatia do eleitorado, Alegre responde com ironia que "espantar ou não só conheço os espanta-pardais", rematando que "as palavras são o que são e valem o que valem".
Resumindo, o histórico dirigente socialista considera que "em política deve falar-se claro" e "se um líder político acha que precisa de uma maioria absoluta deve pedi-la, se acha que não a pode ter talvez seja mais prudente não a pedir".
Ora, entende também Alegre, que "não é por se pedir maioria absoluta que se tem maioria absoluta, tem-se ou não se tem maioria absoluta se se merecer a maioria absoluta, quem decide é o eleitorado, não é o apelo do líder, é o voto do eleitorado que decide que tipo de maioria se vai ter ou não".
Aqui, o ex-deputado recua ao passado e lembra as eleições legislativas de 1985 em que o PS escolheu Almeida Santos como candidato a primeiro-ministro e em que este "pedia não sei quantos mais três que era para a maioria absoluta e depois ficou muito aquém disso", concluindo que "isso aconteceu com outros" e que "o eleitorado é que decide".
Nesta conversa, Alegre deixa ainda uma crítica aos habituais parceiros da esquerda parlamentar do PS, concluindo que "alguns não a pedem e fazem campanha contra a maioria absoluta porque sabem que não a podem ter", referindo claramente que "o PCP se pudesse ter a maioria absoluta pedia a maioria absoluta, o Bloco de Esquerda pediria a maioria absoluta".
E para reforçar esta ideia, Alegre dá mesmo um exemplo nos antípodas da esquerda, referindo-se ao partido de André Ventura e que com o Chega se passa "a mesma coisa", e que "todos pediriam a maioria absoluta" se pudessem e que "alguns que não pedem, passam a vida a falar contra a maioria absoluta porque sabem que não a vão ter".
Estas declarações do dirigente histórico socialista também pdoem ser lidas à luz do facto de que esta terça-feira a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, deixou, na mensagem de Ano Novo, um apelo ao eleitorado para que rejeite uma maioria absoluta do PS.
Sobre as condições para haver uma maioria absoluta quer do PS quer do PSD, Manuel Alegre insiste, por várias vezes, que tem opinião sobre isso mas que não quer pronunciar-se, ressalvando que não é "líder político, nem candidato a deputado, nem candidato a coisa nenhuma", prometendo, apenas, que vai "ajudar" com o voto "num ou noutro sentido".