Informalidade, baixos salários, precariedade e desvalorização da profissão, são alguns problemas estruturais da arquitetura em Portugal. Há arquitetos a trabalhar por conta de outrem que ganham menos de mil euros brutos. Mas dois terços dos 25 mil inscritos na Ordem são profissionais liberais.
Para alterar a situação, a Secção Regional Norte da Ordem dos Arquitetos, apresentou esta quinta-feira o PESA - Plano Estratégico para o Setor da Arquitetura, com um horizonte de 20 anos. Um plano em que o Governo também tem uma palavra a dizer, nomeadamente na regulação dos preços de serviços mínimos de arquitetura, pondo fim à concorrência desleal.
Em declarações à Renascença, a presidente da Secção Regional do Norte da Ordem dos Arquitetos, Cláudia Costa Santos, revelou algumas das prioridades
Uma situação preocupante
Na Ordem, estão inscritos 25 mil arquitetos, mas cerca de 30% não exercem, "muito provavelmente porque a profissão é cada vez mais desvalorizada”, diz à Renascença Cláudia Santos Costa, apontando os factos.
Os arquitetos que trabalham por conta de outrem têm ganhos médios 35% abaixo da média da União Europeia. Mesmo em Portugal, recebem cerca de 27% a 33 % menos do que outros profissionais com o mesmo grau académico.
“Estamos a falar de mil euros brutos, em média. E há quem ganhe muito menos do que isso. Para além da informalidade, da precariedade. Isto a nível empresarial. Mas 69% dos arquitetos são profissionais liberais e aqui é mais difícil calcular a sua receita."
Em Portugal, há 2,2 arquitetos por mil habitantse, número só ultrapassado por Itália (2,6), que se traduz numa forte redução do tamanho do mercado por profissional, sem contar com o decréscimo da atividade, com quebras acumuladas de 25% no volume de negócios nos últimos anos. Além disso, a nível nacional, o mercado de serviços de arquitetura tem uma dimensão reduzida, que vale 350 milhões de euros/ano.
Ainda assim, Claúdia Costa Santos considera que não há propriamente arquitetos a mais, “mas falta organização para fazer face a um quadro mais exigente a nível económico e laboral, sobretudo baseado numa abertura – necessária- aos mercados mundiais, ganhando competitividade, a nível individual e empresarial”.
Um plano a pensar nos próximos 20 anos
Por isso, uma das prioridades do PESA - Plano Estratégico para o Setor da Arquitetura é o aumento da sustentabilidade e competitividade da profissão, assim como a sua valorização. O que pode passar por um incentivo da Ordem à criação de novas organizações que tenham poder para a negociação de um contrato coletivo de trabalho. Sindicatos, mas também associações a nível empresarial, diz a dirigente do Norte.
O PESA considera que é prioritário introduzir valores mínimos para os serviços de arquitetura, que anulem a concorrência desleal com a prática de “dumping” para captar clientes.
Neste ponto, Cláudia Costa Santos considera que é necessário o apoio do Governo. “Há que aperfeiçoar as relações com a Administração Pública para incentivar que haja alguma regulação nos valores mínimos dos serviços de arquitetura. Muitos arquitetos não têm conhecimentos de gestão e a rivalidade entre os próprios profissionais também se foca na desvalorização dos serviços pela baixa de preços. Por isso, é preciso um referencial que defina as linhas vermelhas”.
O PESA, realizado pela Secção Regional do Norte em colaboração com a Universidade do Minho, mas aplicável a todo o país, defende ainda a promoção de medidas fiscais de apoio ao setor, com o alargamento do valor anual de prestação de serviços para efeitos de isenção de IVA.
Para o futuro, é preciso também repensar o ensino superior da Arquitetura. A eventual limitação da entrada de estudantes nas faculdades é, na opinião de Cláudia Santos Costa, uma questão a discutir a curto prazo entre as universidades, Direção Geral de Educação e Fundação para a Ciência e Tecnologia, com a ajuda da Ordem para a definição de uma estratégia futura.
Para a líder da Ordem na Secção do Norte, os futuros arquitetos deverão estar preparados para ir além da Arquitetura e trabalhar com profissionais de outras áreas com ela relacionadas. Para que daqui a 20 anos o setor não se veja confrontado com os mesmos problemas estruturais, mas mais graves.