A ministra da Cultura, Graça Fonseca, rejeitou, esta sexta-feira,, no parlamento, que o orçamento para apoio às artes sejam "migalhas" e reiterou que os concursos são "a única forma de assegurar transparência e equidade" na distribuição do financiamento.
A ministra falava num debate temático, no plenário da Assembleia da República, requerido pelo grupo parlamentar do PCP, sobre apoio às artes, numa altura em que mais de 300 artistas e estruturas artísticas pedem a sua demissão.
"É insultuoso falar de migalhas", comentou a ministra, respondendo às críticas do Bloco de Esquerda, e lembrou que a dotação orçamental de 25 milhões de euros para apoio às artes "repõe os valores de 2009", num reforço de 83%.
Face a críticas do PCP sobre a forma de distribuição dos apoios, a ministra reiterou que "o concurso é a única forma de assegurar transparência e equidade, sendo que num concurso haverá sempre entidades que ficam dentro e fora, em qualquer área, desde a ciência à educação".
A contestação no setor das artes reacendeu-se depois, de em outubro, terem sido conhecidos os resultados provisórios dos concursos sustentados bienais 2020-2021, tendo sido excluídas de apoios 75 entidades candidatas que eram consideradas elegíveis pelo júri.
No fim de semana, a companhia Cegada Grupo de Teatro, de Vila Franca de Xira, anunciou o encerramento do Teatro Ildefonso Valério, por ter não ter obtido qualquer financiamento nestes concursos, enquanto vários deputados da oposição falaram em dezenas de estruturas em dificuldades pelo país.
No plenário, onde se encontravam, nas galerias, dezenas de artistas, estruturas, e representantes da Plataforma em Defesa da Cultura, a deputada comunista Ana Mesquita criticou o modelo de apoio às artes, e defendeu o financiamento de todas as candidaturas elegíveis que considerou "imperioso resolver agora".
"Vai reverter os cortes, nomeadamente na região do Alentejo, acabar com este modelo injusto de apoio às artes que não responde ao direito à criação?", questionou a deputada comunista.
Graça Fonseca disse, por seu turno: "o Governo defende o princípio do concurso, defende todos [os artistas], nunca um Governo vai interferir. O PCP defende o fim dos concursos".
Para a ministra, "agora que o concurso foi encerrado, é o momento de falar com as estruturas e com as entidades representativas".
"O conceito de júri externo e independente será sempre respeitado, e, durante o seu trabalho, o Governo não pode interferir", disse a ministra, que já tinha afirmado, recentemente, à Lusa, que irá dialogar com os artistas.
Beatriz Gomes Dias, do BE, considerou que o atual problema no setor "era previsível e evitável, se a ministra tivesse ouvido os júris que alertaram para a insuficiência de verbas".
"De migalhas não se faz política cultural. É uma humilhação dos artistas que não conseguem apoio para os seus primeiros projetos ou que já têm uma carreira consolidada", disse, avaliando que "este modelo mantém o caos, falta de garantias plurianuais, [e tem] ditado o fim de alguns projetos artísticos relevantes".
Tal como o PCP, o BE exige que todas as candidaturas elegíveis sejam apoiadas.
A ministra afirmou que, embora todas as regiões do país tenham recebido aumentos nos concursos, com exceção do Alentejo, "haverá uma solução para 2020" nesta região.
"Vamos fazer o caminho da coesão territorial, o aumento do investimento na cultura e das estruturas que fazem um trabalho extraordinário, mas tem de ser em parceria com as autarquias e as [Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional]", defendeu.
Quanto aos pedidos dos deputados para a mudança do modelo, a ministra diz que "não se pode estar permanentemente a pôr em causa o que foi feito anteriormente, porque as estruturas também não podem estar sempre a adaptar-se a alterações".
Por seu turno, Ana Rita Bessa, do CDS-PP, lamentou o caso do Cegada Grupo de Teatro e sustentou a gravidade da situação com o facto de existir um abaixo-assinado de mais de 300 artistas que circula a pedir a demissão da ministra, que, no seu entender, "não revela capacidade de escuta nem capacidade de diálogo com o setor".
Por seu lado, Carla Borges, do PSD, classificou a iniciativa do PCP de "manobra de diversão dos partidos à esquerda para mostrar que já não há Governo da 'geringonça'", considerando-os "responsáveis pelos critérios ineficazes de apoios às artes".
"Este modelo é uma falácia e um fracasso", disse ainda, defendendo que "é tempo de assumir compromissos sérios com as estruturas do interior do país para garantir o tecido cultural", pedindo também a revisão do modelo e a viabilização dos projetos considerados elegíveis pelos júris.
A deputada Mariana Silva, de Os Verdes, disse que o partido defende 1% do Orçamento do Estado para a Cultura, e o reforço dos apoios às artes, criticando o atual modelo, "que é boia de salvação para uns, e sentença de morte para outros", antes de concluir que os resultados dos últimos concursos de apoio às artes "são catastróficos".