"As pessoas estão aterrorizadas em casa e recusam tratamento"
28-04-2020 - 09:50
 • Susana Madureira Martins , com redação

Quatro mil mortes a mais em Portugal desde o início da pandemia, é o que revela um estudo divulgado pela Ordem dos Médicos.

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Um estudo divulgado na revista da Ordem dos Médicos revela que Portugal pode ter registado quatro a seis vezes mais mortes do que média desde o início da pandemia. O medo de ir ao hospital está a provocar um aumento da mortalidade entre doentes crónicos, justifica o coordenador António Vaz Carneiro. “Há pessoas a morrer sem tratamento.”

O excesso de óbitos entre 1 de março e 22 de abril pode ter chegado a quatro mil a mais dos que são atribuídos ao novo coronavírus que, de acordo com os números oficiais, está em 928 óbitos.

Segundo o coordenador do estudo, este número excessivo de mortes pode ter como eventual causa, a redução da procura de cuidados de saúde em contexto de pandemia. “Há cerca de 30 a 40% dos doentes que deveriam ir à urgência, fazer biópsias, endoscopias, ser internados, deveriam ser operados e ir a consultas e estão a morrer sem tratamento.”

“A nossa explicação é que as pessoas estão aterrorizadas em casa, com medo de morrer com o vírus, e pura e simplesmente recusam tratamento”, esclarece à Renascença António Vaz Carneiro, lembrando que os hospitais estão vazios e as consultas estão fechadas.

Os dados mostram que este excesso de mortalidade se registou apenas em pessoas com mais de 65 anos, devido a eventos agudos e doentes com doenças crónicas agudizadas que não procuraram cuidados.

O investigador aconselha os decisores políticos a gerir de outra maneira a mortalidade em Portugal, não se concentrando apenas nas infeções por Covid-19. “Houve um desvio de recursos muito grande para esta infeção e, ao fazê-lo, diminuímos os recursos disponíveis para todas as outras patologias. Mas os portugueses continuam a morrer com outras causas que não a Covid-19: por causa cardiovasculares, diabetes, cancro, acidentes e outras infeções”, alerta.

Por isso, tendo conhecimento destes valores, as autoridades não podem fazer uma gestão exclusivamente orientada para a Covid-19. “Agora, as pessoas que tiverem de decidir têm de ter em linha de conta que, a cada dia que passa que estas pessoas não são vistas, estão a morrer em números muito significativos. Temos que ir buscar estas pessoas a casa e convencê-las a ir a um hospital”.

Em média morrem 300 pessoas por dia em Portugal, um número que a partir de março aumentou quatro a seis vezes, provocando um excesso de mortalidade em grande parte explicado pelo receio de tratamento em meio hospitalar.

Os dados agora divulgados são superiores aos estimados na semana passada no Barómetro Covid-19, da Escola Nacional de Saúde Pública, que apontou um excesso de mortalidade de 1.255 óbitos, mas apenas para o período entre 16 de março e 14 de abril.

Em Portugal, morreram 928 pessoas das 24.027 confirmadas como infetadas, e há 1.357 casos recuperados, de acordo com a DGS.

O país cumpre o terceiro período de 15 dias de estado de emergência, iniciado em 19 de março, e o Governo já anunciou a proibição de deslocações entre concelhos no fim de semana prolongado de 1 a 3 de maio.

Mais de três milhões de pessoas foram contagiadas pelo novo coronavírus em todo o mundo, 80% das quais na Europa e nos Estados Unidos da América, de acordo com o último balanço.

Pelo menos 3.003.344 casos de infeção pelo SARS-CoV-2, assim como 209.388 mortes, foram registadas no mundo inteiro desde o início da pandemia. Cerca de 890 pessoas recuperaram.

A Europa continua a ser o continente mais afetado e os Estados Unidos são o país mais atingido pela doença.