A comissária europeia da Concorrência, Margrethe Vestager, avisou que, se nada for feito, as tecnologias de Inteligência Artificial (IA) vão "virar-se contra nós" e o prazo está a esgotar-se para tomar medidas.
"Para que o enorme potencial da IA seja libertado, temos de poder confiar nela", afirmou Vestager, durante um painel da conferência de tecnologia Code, que decorre em Los Angeles.
A comissária europeia está nos Estados Unidos para as primeiras conversações bilaterais entre a União Europeia e os EUA no Conselho de Comércio e Tecnologia (TTI, na sigla inglesa), que vão acontecer na quarta-feira, 29 de setembro, em Pittsburgh.
"A ideia é ter um fórum de alto nível onde podemos discutir coisas relacionadas com comércio e tecnologia e possivelmente encontrarmos um alinhamento", descreveu.
"Uma das coisas que quero é que encontremos um alinhamento relativo à Inteligência Artificial", indicou Margrethe Vestager.
A comissária disse que tem havido "demasiados casos" de preconceitos que enviesam os algoritmos de IA e casos de utilização nos quais há discriminação contra mulheres e pessoas pertencentes a minorias.
"Penso que temos de avançar nas democracias para mudar isso, porque senão, a Inteligência Artificial vai virar-se contra nós", avisou Vestager.
Embora considerando que ainda não é tarde demais para tomar medidas, a comissária salientou que o tempo está a esgotar-se, principalmente porque a IA tem agora uma grande variedade de aplicações com impacto na vida das pessoas.
"Vemos diferentes usos de Inteligência Artificial, usos que pensaríamos que vão contra os fundamentos da democracia -- em que o ponto de partida é a integridade e a dignidade do indivíduo", salientou Vestager.
A comissária falou também dos resultados do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), que está em vigor na UE desde 2018.
"O grande sucesso do RGPD é que agora a privacidade é uma tendência", disse Vestager, sublinhando que "ainda estaríamos no escuro em relação aos direitos digitais dos cidadãos" se o regulamento não tivesse sido implementado.
Ainda assim, a responsável afirmou que há trabalho a fazer para facilitar a sua aplicação por pequenas empresas e tornar a privacidade a norma junto das grandes, dando assistência digital aos consumidores para que não tenham de estar sempre a responder a perguntas ou a escolher caixas em sites.
"Precisamos de legislação sobre a privacidade", declarou Vestager, numa altura em que houve uma mudança nos Estados Unidos e há agora abertura para aprovar propostas nesse sentido.
A comissária disse também que é "um dado adquirido" que os reguladores têm de tomar medidas de controlo sobre as grandes empresas da indústria tecnológica, tornando as regras mais claras e justas.
"Houve uma mudança efetiva da opinião pública", considerou Vestager, referindo que os condicionamentos da pandemia de covid-19 levaram as pessoas a perceberem que, para trabalharem e darem acesso a aulas online aos filhos, têm de se pôr nas mãos das grandes empresas.
"A democracia é tão frágil", afirmou. "O meu receio é que os cidadãos se sintam alienados, sem controlo e sem saberem como o ganhar", acrescentou.
Para Margrethe Vestager, o empoderamento dos cidadãos "é a essência de uma sociedade que funciona bem".
A comissária disse que não usa Google ou Amazon e que há outras empresas interessantes disponíveis. "A conveniência mata a curiosidade", afirmou, apesar de reconhecer os benefícios que vêm com grandes empresas.