O presidente do Turismo de Portugal, Luís Araújo, defende, em entrevista à Renascença, uma visão de longo prazo para resolver o problema da falta de mão de obra no setor.
A falta de recursos humanos é um mal de que todos os setores, e muito em especial o turismo, se queixam. A urgência para fazer face à procura e prestar um serviço de qualidade oferece como alternativa o recurso a trabalhadores estrangeiros.
Há protocolos realizados com vários países, nomeadamente da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), mas a máquina burocrática não facilita a atribuição de vistos para que esses imigrantes possam viajar para Portugal. O ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, anunciou a concessão automática de autorizações de residência para migrantes da CPLP.
No entanto, Luís Araújo, presidente do Turismo de Portugal, defende uma aposta na formação dos trabalhadores portugueses do setor e incentivos a que os mais jovens escolham o turismo para fazer a sua vida profissional. “É preciso uma visão de longo prazo”, diz em entrevista à Renascença.
O Governo anunciou agora uma agilização nas autorizações de residência para cidadãos de países da CPLP, mas é só para um ano e a necessidade é imediata, mas também para vários anos. Como é que tudo isto se resolve?
Concordo, é preciso uma visão de longo prazo, porque é uma questão que não se resolve de um dia para o outro. E que tem de ser trabalhada nas suas três componentes essenciais. A primeira é demográfica. Nós estamos a envelhecer, precisamos de trazer pessoas de fora e há mecanismos: a nova lei dos estrangeiros, os protocolos de colaboração com países terceiros como a Índia e outros, o protocolo que foi feito com os países CPLP. São positivos numa ótica de trazer pessoas de fora.
Mas essas pessoas têm que ser treinadas e prestar o serviço da mesma forma que os que estão cá prestam. É importante que isto seja claro. Existem programas, aliás, o próprio Turismo de Portugal lançou agora o Programa "Check-in", que é precisamente para pessoas que vêm de fora e que precisam de se integrar no mercado de trabalho do setor turístico.
A segunda componente tem a ver com a formação. Nós temos feito um trabalho nos últimos anos e, aliás, um dos objetivos da Estratégia 2027 é inverter a pirâmide da formação, porque cerca de 56% das pessoas que trabalham no setor têm pouca qualificação, até ao ensino básico.
É importante invertermos esta pirâmide e esta componente da formação, por incrível que pareça, pode ser também um dos caminhos para colmatar a falta de recursos humanos no setor. Porque, ao formar estamos a valorizar essas pessoas.
A nossa Academia Digital tem mais de 140.000 registos de portugueses que trabalham no setor e que estão a fazer formação. Só o ano passado treinámos mais de 30.000 pessoas nos vários programas.
E esta aposta na formação – e as escolas do Turismo de Portugal têm feito um trabalho notável nesta área, mas as outras escolas superiores e técnico-profissionais, também -é importante para, de certa maneira, mudar a imagem que existe do turismo ser um setor de baixas qualificações ou que não é a primeira escolha de um jovem.
A terceira componente de trabalho tem a ver com a atratividade do setor. E aí estamos a falar de componente salarial – e de facto tem havido uma atualização enorme por parte das empresas; uma componente de benefícios, percebermos que as pessoas precisam de ter resposta àquilo que são as suas necessidades; garantir um plano de carreiras com estabilidade ao longo do tempo; e das pessoas perceberem que o setor do turismo é daqueles que maior taxa de empreendedorismo tem no nosso país, comparado com outros setores. Portanto, temos de trabalhar nestas várias áreas.
O secretário de Estado anunciou para breve a Agenda para o Trabalho e acho que vai ser importantíssima para alinhar esta atuação.
Há candidatos estrangeiros para as escolas do Turismo de Portugal, mas precisam de visto
A ideia que tenho é que com a pandemia, caiu muito o número de alunos nas Escolas do Turismo de Portugal. E isso também tem a ver com a atratividade do setor, que caiu. Portanto, é preciso reconquistar esses jovens?
Exatamente. Eu diria que temos uma questão de conquista e de fidelização. As escolas do Turismo de Portugal têm crescido do ponto de vista de procura externa, temos mais alunos internacionais, o que é positivo.
Qual é a percentagem dos alunos internacionais?
Estamos à volta dos 80% nacionais, 20% internacionais nas 12 escolas do Turismo de Portugal. Poderíamos ter mais e há pouco tocou numa questão: quando falamos dos vistos de trabalho, também falamos dos vistos de estudo e dos vistos turísticos. E aqui sim, temos de fazer um trabalho de melhorar esta atribuição dos vistos ou esta forma como as pessoas podem vir, principalmente de mercados que não são Schengen.
Mas isso para dizer que cresceu também muito a nossa capacidade de fazer formação fora das escolas. A Academia Digital é um belíssimo exemplo. O facto de termos centenas de milhares de pessoas registadas na Academia Digital, que fazem formação com frequência e de acordo com a sua disponibilidade, foi uma surpresa muito agradável durante a pandemia porque não sabíamos que ia ter este acolhimento. Mais agradável ainda é perceber que as áreas que são mais procuradas são as da sustentabilidade e a componente digital.
Mas também há esta capacidade de sairmos da escola. O programa "Formação + Próxima", das escolas do Turismo de Portugal, em parceria com os municípios. Já temos um terço dos concelhos registados nesta plataforma, com um protocolo de colaboração que permite que lá seja feita a formação para os colaboradores do setor que estão naquele município, e de acordo com as necessidades das empresas ou daquela região.
É a aposta nestas várias áreas que de certa maneira vai ser consagrada na Agenda do Trabalho que vai ser apresentada muito em breve e acho que vai traduzir exatamente esta visão de longo prazo, não imediatista, com o foco muito claro naquilo que é a qualidade do destino e a experiência de quem nos visita.