Já abriram as urnas na Turquia. Mais de 60 milhões de cidadãos vão a votos para eleger um presidente e um parlamento, nas eleições que podem ser as mais renhidas de sempre.
Com a maioria das sondagens a anteciparem a derrota de Recep Tayyip Erdogan nas eleições presidenciais, o ato eleitoral na Turquia constitui também uma prova da capacidade de sobrevivência política do atual chefe de Estado de 69 anos.
O fundador do AKP, uma formação conservadora e islamista, enfrenta o líder do Partido Republicano do Povo (CHP, social-democrata e nacionalista), Kemal Kiliçdaroglu, 74 anos, apoiado por uma coligação heterogénea de seis partidos e por uma formação de esquerda defensora dos direitos da minoria curda, que poderá ter a sua última oportunidade de terminar nas urnas com o crescente autoritarismo de Erdogan.
A três dias do escrutínio, as sondagens davam ao candidato da Aliança da Nação, liderada pelo CHP e que agrega mais cinco partidos, de centristas a nacionalistas de direita e uma formação islamista, 49,3% dos votos, caso a opção dos indecisos (7%) fosse distribuída proporcionalmente pelos dois candidatos. O Presidente Erdogan apenas receberia 43,7% dos votos.
Para as eleições legislativas, o cenário altera-se, com a Aliança Popular de Erdogan – liderada pelo AKP e que repete a coligação com o Partido de Ação Nacionalista (MHP, extrema-direita) de Devlet Bahçeli e duas outras pequenas formações ultranacionalistas – em vantagem, com cerca de 44%, dos votos expressos contra 39,9% para a Aliança da Nação.
Neste caso, será decisiva a votação na Aliança Trabalho e Liberdade, liderada pelo Partido da Esquerda Verde, defensor dos direitos da população curda e creditado nas sondagens com 10,5% dos votos e que poderá retirar ao AKP e aliados a sua sólida maioria absoluta.
Numa sociedade fragmentada, Kiliçdaroglu prometeu devolver ao país o sistema parlamentar interrompido em 2017 e uma restauração dos direitos e liberdades, muito deterioradas devido ao crescente autoritarismo presidencial.
O combate ao elevado desemprego e à corrupção, o regresso a uma justiça independente, em que os veredictos sejam baseados na lei e não em decisões políticas, e a liberdade dos ‘media’, num país com quase 50 jornalistas na prisão, foram outras prioridades enunciadas pelo candidato da Aliança da Nação.
Kiliçdaroglu também prometeu restaurar a confiança no meio empresarial e na população, relações externas baseadas nos interesses da política nacional, melhoria das relações com a União Europeia e manter as relações cordiais com a Rússia, aliado político e importante parceiro comercial.
A estratégia de campanha de Erdogan, numa permanente associação entre nacionalismo e religião, foi centrada em propagar a ideia de uma Turquia moderna, que inaugurou a sua primeira central nuclear em cooperação com a Rússia, e poderosa, com um desenvolvimento exponencial da indústria do armamento.
O Presidente turco acusou também o bloco opositor de serem “infiéis”, de colaborarem com a guerrilha curda do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), ilegalizado e considerado “organização terrorista” por Ancara e países ocidentais, de pretenderem fragmentar o país e de colocarem a Turquia sob a alçada de “potências imperialistas”.
O ato eleitoral turco traduzir-se-á numa escolha de modelo de sociedade entre um líder poderoso e um opositor que propõe o consenso e a negociação.